Não é só Moro: mais 18 nomes ligados à Lava Jato estão no governo Bolsonaro

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O governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) tem, pelo menos, 19 integrantes com histórico profissional ligado à Lava Jato. Além do ex-juiz federal Sergio Moro, hoje ministro da Justiça, outras 18 pessoas nomeadas para cargos de confiança no governo federal já trabalharam em repartições vinculadas à operação de combate à corrupção.

Moro e outros integrantes da Lava Jato estão hoje envolvidos em uma crise deflagrada pela divulgação de conversas sobre a operação mantidas pelo então juiz quando ele ainda julgava ações propostas pela força-tarefa (veja mais abaixo).

Dentre os integrantes do governo ligados à Lava Jato, há delegados da Polícia Federal (PF) e auditores da Receita Federal que já atuaram em investigações da operação. Há também servidores da Justiça Federal do Paraná que trabalharam junto com o ministro Moro. Há até uma ex-subprocuradora-geral da República, Maria Hilda Marsiaj Pinto, que pediu exoneração de seu cargo no MPF (Ministério Público Federal) para virar secretária nacional de Justiça.

Marsiaj Pinto fez parte da força-tarefa montada pelo MPF para a Lava Jato. De 2015 a 2018, ela atuou em recursos referentes a processos da operação que tramitaram no STJ (Superior Tribunal de Justiça). Hoje, ela é subordinada a Moro no Ministério da Justiça.

Procurado pelo UOL na quarta e na quinta-feira para comentar a lista de profissionais ligados à Lava Jato que hoje estão no governo, o Ministério da Justiça não quis se pronunciar.

Os 18 nomes
Foi Sergio Moro quem trouxe os 18 profissionais ligados à Lava Jato ao governo. O ministro nomeou todos eles para exercer cargos de confiança vinculados à sua pasta.

No último dia 28, entretanto, o Congresso Nacional decidiu transferir o comando do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) do Ministério da Justiça para o Ministério da Economia. Com isso, três auditores da Receita que haviam sido nomeados por Moro para trabalhar no conselho agora estão subordinados ao ministro Paulo Guedes.

A lista dos profissionais ligados à Lava Jato hoje trabalhando no governo federal foi elaborada com base em dados disponibilizados pelo Ministério da Justiça.

Ex-integrantes da Lava Jato no governo Bolsonaro
Sergio Moro, ministro da Justiça
Foi juiz da 13ª Vara da Justiça Federal do Paraná, onde tramitam processos da operação Lava Jato. Condenou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo caso do triplex do Guarujá (SP).

Flávia Blanco, chefe de gabinete de Moro
É analista judiciária da Justiça Federal do Paraná. Foi diretora da secretaria da 13ª Vara da Justiça Federal durante a operação Lava Jato.

Elias José Pudeulko, assessor da chefe de gabinete
É técnico judiciário da Justiça Federal do Paraná. Trabalhou na 13ª Vara da Justiça Federal do Paraná com Moro.

Andrezza Cristina Cardos de Oliveira Klug, assessora da chefe de gabinete
É analista judiciária da Justiça Federal do Paraná. Foi supervisora da seção de assessoria jurídica e assessora da direção do foro durante a Lava Jato.

Marcos Koren, assessor especial do ministro
É agente da PF e trabalhou na comunicação da superintendência do órgão em Curitiba durante a operação Lava Jato, incluindo durante a prisão de Lula.

Flávia Rutyna Heidemann, assessora especial
É analista judiciária da Justiça Federal do Paraná. Foi oficial do gabinete de Moro quando ele ainda julgava casos da Lava Jato no Paraná.

Maria Hilda Marsiaj Pinto, secretária nacional de Justiça
Foi subprocuradora geral da República. Integrou a força-tarefa da Lava Jato de 2015 ao fim de 2018. Atuou em recursos que tramitaram no STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Georgia Renata Sanchez Diogo, assessora especial internacional do Ministério da Justiça
Foi assessora-chefe da Secretaria de Cooperação Internacional da PGR (Procuradoria-Geral da República). Trabalhou em acordos de cooperação internacional da Lava Jato.

Annalina Cavicchiolo Trigo, diretora do Departamento de Promoção de Políticas de Justiça
Trabalhou na AGU (Advocacia-Geral da União) e atuou em discussões sobre acordos de leniência fechados com empresas investigadas na Lava Jato.

Rosalvo Ferreira Franco, chefe da Secretaria de Operações Policiais Integrada
É delegado da PF aposentado. Era superintendente da PF no Paraná quando a Lava Jato foi deflagrada. Antes de assumir um cargo no Ministério da Justiça, Franco já havia integrado o governo de transição, em 2018.

Erika Mialik Marena, diretora de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional
É delegada da PF. Integrou a força-tarefa da Lava Jato e participou das primeiras fases da operação. Foi ela, aliás, quem deu o nome Lava Jato à operação.

Eduardo Mauat da Silva, coordenador-geral de articulação institucional do DRCI
(Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional)
É delegado da PF. Integrou o grupo de trabalho da operação Lava Jato de 2014 a 2016.

Mauricio Leite Valeixo, diretor-geral da PF
É delegado da PF. Foi superintendente da PF no Paraná durante a Lava Jato. Chefiava o órgão quando Lula foi preso.

Igor de Paula Romário, diretor de investigação e combate ao crime organizado da PF
É delegado da PF. Coordenou o trabalho de investigações da Lava Jato em Curitiba, inclusive em inquéritos relacionados ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Roberval Ré Vicalvi, diretor de administração e logística policial da PF
É delegado da PF. Foi o segundo da hierarquia da Superintendência da PF no Paraná durante a gestão de Valeixo.

Fabio Salvador, diretor técnico-científico da PF
É perito da PF. Foi chefe da equipe de perícia da Lava Jato.

Roberto Leonel de Oliveira Lima, presidente do Coaf
É auditor da Receita Federal. Foi chefe do Espei (Escritório de Pesquisa e Investigação) da Receita em Curitiba, que colaborou com a Lava Jato.

Ana Amélia Olczewski, diretora de inteligência financeira do Coaf
É auditora da Receita na Lava Jato. Foi chefe do Espei (Escritório de Pesquisa e Investigação) da Receita em Porto Alegre e enviou informações para investigações da Lava Jato.

Marcelo Renato Lingerfelt, chefe de gabinete do Coaf
É auditor da Receita. Foi chefe da divisão de pesquisa e, depois, coordenador de assuntos estratégicos da Coordenação-Geral de Pesquisa e Investigação da Receita durante a Lava Jato.

Histórico pesou nas nomeações
A ligação de integrantes do governo com a Lava Jato sempre foi vista como positiva por Moro. Quando o ministro anunciou que o então superintendente da PF no Paraná, o delegado Maurício Valeixo, seria elevado a diretor-geral da corporação, por exemplo, ele exaltou a experiência do subordinado no combate à corrupção e ao crime organizado.

Moro também afirmou que a delegada Erika Marena, que trabalhou no início da operação Lava Jato, tinha sua “plena confiança” quando a escolheu para ser chefe do DRCI (Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional).

Após deixar a Lava Jato e antes de assumir seu posto no Ministério da Justiça, Marena comandou uma operação de investigação sobre supostas irregularidades na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina). O então reitor da universidade Luiz Carlos Cancellier de Olivo foi preso preventivamente e se suicidou. Nada contra ele foi comprovado.

Moro disse que o episódio foi um “imprevisto no âmbito de uma investigação” e que Marena não tinha responsabilidade alguma sobre o fato.

No próprio Ministério da Justiça, sabe-se que Moro cedeu espaço a pessoas ligadas à Lava Jato por confiar no trabalho dos envolvidos na operação e pela proximidade que manteve com os nomeados.

Crise das conversas vazadas
O The Intercept Brasil divulgou diálogos que mostram Sergio Moro, quando ainda era juiz, orientando ações dos procuradores da Lava Jato e debatendo decisões judiciais que ainda não haviam sido divulgadas.

O The Intercept Brasil informou que obteve as conversas, trocadas pelo aplicativo Telegram, por meio de uma fonte anônima. Divulgou trechos de material que obteve no domingo passado e na última quarta.

Moro é o atual membro do governo federal mais citado no material divulgado. Um auditor da Receita Federal chamado de Leonel também é citado num diálogo. O nome pode fazer referência a Roberto Leonel de Oliveira Lima, atual presidente do Coaf.

Numa conversa em 16 de março de 2016, Moro avisa o chefe da força-tarefa da Lava Jato no Paraná, Deltan Dallagnol, que daria uma palestra no dia seguinte a auditores da Receita num congresso realizado no Hotel Bourbon, em Curitiba. “Leonel sabe detalhes”, disse o ex-juiz.

Nesta palestra, Moro defendeu a divulgação de interceptações de ligações telefônicas entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a então presidente Dilma Rousseff. Na época, a presidente queria que Lula assumisse um ministério em seu governo e chegou a nomeá-lo.

Essas ligações foram divulgadas no final da tarde do dia 16. Horas antes, de acordo com os diálogos, Moro e Dallagnol conversaram sobre a posição do MPF a respeito do assunto.

A divulgação das conversas entre Dilma e Lula foi considerada ilegal pelo STF (Supremo Tribunal Federal). Lula, porém, teve sua nomeação suspensa pelo ministro do mesmo STF Gilmar Mendes, que entendeu que a mesma seria uma forma de Lula escapar de uma possível ordem de prisão.

A Constituição de 1988 determina que não haja vínculos entre o juiz e as partes em um processo judicial. Para que haja isenção, o juiz e a parte acusadora –neste caso, o Ministério Público– não devem trocar informações nem atuar fora de audiências.

O Ministério Público Federal do Paraná informou em comunicado que as mensagens não mostram nenhuma ilegalidade na conduta de seus membros. Apesar de ter assumido um “descuido”, o ministro Moro afirmou que está “absolutamente tranquilo” em relação à troca de mensagens com Dallagnol.

* Colaborou Leandro Prazeres; com informações da Agência Brasil

Do UOL