A primeira semana de Dilma
No sábado, completou-se uma semana desde que a presidente Dilma Vana Rousseff tomou posse e começou a governar. Desde a posse até o presente momento, os movimentos iniciais do novo governo – repletos de simbolismo – induzem à crença em uma drástica mudança de estilo na Presidência da República, ao menos do ponto de vista político.
A começar pela diferença entre a posse de Lula, em 2002, e a de Dilma agora. Há oito anos, Lula chegou ao poder passando por uma campanha eleitoral light, em que a virulência da direita foi constrangida pelo estado de miséria em que estava o país; Dilma se elegeu na campanha mais suja e violenta desde a redemocratização, que deixou a de 1989 na poeira.
Já nos discursos de posse de cada um, afloraram os indícios do que seria o governo Lula e do que será o governo Dilma. Lula fez um discurso politizado, com referências à “esperança” ter “vencido o medo” – referência que enlouqueceu de raiva a direita e a mídia – e ao preconceito por ele não ter diploma universitário; Dilma fez um discurso burocrático e despolitizado.
Aliás, enquanto que o discurso de Lula, em 2002, foi de afronta aos inimigos políticos que amealhou nas três campanhas eleitorais anteriores (1989, 1994 e 1998), o de Dilma foi todo no sentido de amainar os ânimos ainda exacerbados ao espantoso durante a campanha eleitoral.
Houve dois momentos isolados de maior emoção no discurso de posse de Dilma e nas duas vezes ela foi às lágrimas. No primeiro momento, ao se emocionar com a afirmação de que era presidente de “todos os brasileiros”, como que propondo a “paz”; no segundo, ao lembrar dos colegas que tombaram diante da ditadura, da qual a presidente garantiu não guardar rancor.
Durante a primeira semana de Lula, declarações sobre “Herança Maldita” e de que “A esperança venceu o medo” exacerbaram o clima político de uma forma que dura até hoje – mesmo depois de ele ter deixado o cargo, continua sendo atacado pela mídia como se ela quisesse lhe dizer que agora pode insultá-lo sem que tenha como reagir, pois não tem mais o palanque presidencial.
A primeira semana do governo Dilma foi fria, do ponto de vista político, e restrita a fotos de reuniões da presidente com sua equipe de governo, sem que se metesse nas polêmicas da estadia de Lula e família em instalações militares e dos passaportes diplomáticos dos seus filhos.
Acostumados que estamos a ver o ex-presidente fazer discursos diários durante anos, com respostas aos ataques da imprensa, com críticas às elites, a potências estrangeiras, de exaltação dos feitos que o seu governo inegavelmente ia logrando, enfim, com a emoção transbordando por cada poro, todos estão sentindo que Dilma pretende despolitizar o seu início de governo.
Haverá que combinar com os russos. Dilma tem imensos abacaxis para descascar, como a questão dos aviões militares que o Brasil tem que escolher ou o caso Cesare Battisti e o projeto do marco regulatório da mídia, nos quais o novo governo terá que se posicionar, em algum momento.
Há vários fatores que explicam a postura de Dilma. Em primeiro, sai de cena a emotividade de Lula para dar lugar à atitude sempre cerebral que marca o perfil técnico da presidente, em contraposição com a formação eminentemente política do antecessor. E também o fato de que ela ainda parece pretender desfazer a especulação de que seria mais de esquerda do que ele.
A menos que Dilma comece a ceder sem parar às exigências da direita midiática, confrontos surgirão. Se o seu governo não se tornar tucano, terá que enfrentar o debate político. A única manifestação que a mídia não poderá ignorar ou distorcer muito será a dela. Se não se manifestar, seu governo será censurado.
É cedo para dizer que Dilma cometerá o erro de governar o Brasil como uma gerente. Mas se fizer isso, será, sim, um erro. O cargo de presidente é político. Os brasileiros votaram nela seguindo um líder político – o maior da história brasileira, ao lado de Getúlio Vargas. Ninguém segue gerentes. E sem liderar politicamente, ela não se reelegerá.