Postura de perdedor
Pelo que dizem as lendas, ao saber das declarações do garotão reacionário carioca, Dilma Rousseff deve ter tido vontade de lhe passar uma carraspana daquelas, tal como fizera no Congresso quando um homenzinho chamado A-gri-pi-no ajeitou a bola para ela chutar em seu gol.
Contudo, bem treinada por Lula para lidar com essa gente, Dilma manteve a compostura. É uma Dilminha paz e amor, a que estamos vendo. E sabem por que ela e Lula têm tanta paciência, deixando respostas menos duras do que o adequado para políticos de seu partido com menos a perder? É que quem está indo bem numa campanha eleitoral não tem que comprar briga nem bater boca.
E ainda melhor quando se tem um belo e óbvio discurso para responder a uma acusação energúmena como a de que o partido dela tem relações com o narcotráfico internacional. “O Brasil não merece um debate desse nível”, disse Dilma. Na mosca. Quem se surpreendeu com a tática “indígena” do playboy carioca que detesta mendigos, certamente viu, na fala de Dilma, aquilo que queria dizer e não sabia como.
Alguém pode imaginar uma forma mais idiota de levantar um debate público? Coisa de moleque… Nem a imprensa tucana perdoou. De Dora Kramer (talvez a mais serrista colunista do Estadão) a Fernando de Barros e Silva (o serrista relutante da Folha), ninguém perdoou.
Querem saber? Nessas horas, não sei se prefiro os que tentam manter a dignidade e reconhecer um absurdo do seu candidato, evitando uma desmoralização completa, ou aqueles que, como um Reinaldo Azevedo, ficam a buscar explicações para o inexplicável. Ou seja: explicação para alguém achar que uma acusação velha como essa, de que o PT é um partido de traficantes, iria tirar um único voto de Dilma.
O Reinaldo é um idiota? Claro que é, mas é um idiota autêntico. Talvez melhor um desses do que um falso honesto, que só não age como o idiota porque lhe sabe o tamanho descomunal da idiotice proferida.
Mas a postura do vice se coaduna com a do candidato. Serra não acusou Dilma, pessoalmente, de ter feito um “dossiê” contra ele? Então… Além de desleal, eles a chamam de traficante. O tal A-gri-pi-no fez escola.
Isso, sim, é postura de perdedor. Todo mundo sabe, no Brasil, que candidato que fica nervoso e ataca é aquele que está perdendo. E por que quem está perdendo ataca? Porque atacar funciona . Eleições já foram vencidas assim. Lula que o diga. Esteve na frente, em 1994, e caiu ante os ataques do adversário.
Só que esses ataques precisam de verossimilhança. Era fácil associar aquele homem de cabelos e barbas negros e com cara de zangado a um risco para a sociedade. Lula tinha uma aparência destemperada. Particularmente, divido a vida política dele em antes e depois dos cabelos e da barba embranquecerem. A idade fez um bem enorme à aparência de Lula, tanto quanto à sua experiência.
Serra sabe que está perdendo a eleição e tenta a tática dos que estão em desvantagem numa disputa eleitoral, a de oferecer boas razões para o eleitorado não votar no adversário.
Mas essa tática necessita de um elemento que, se não estiver presente, não funciona. Marta Suplicy, por exemplo, parece mesmo uma dondoca dos Jardins, mesmo sendo alguém que governou o tempo todo para os mais pobres. E ela de fato onerou o contribuinte paulistano, mesmo tendo usado bem o dinheiro.
Se o benefício que medidas impopulares de um governante não existem ou ainda não chegaram, é fácil derrubar-lhe a imagem usando-as. Tem que atacar, nesse caso.
O diabo, para Serra, é que não há muito o que atacar neste governo. Não porque tenha resolvido tudo e a vida, no Brasil, tenha se tornado igual à vida na Suíça. É porque tem muita coisa que ainda não está boa, mas, pela primeira vez na vida da maioria dos brasileiros, está tudo melhor.
Renda, emprego, educação, saúde, segurança, transporte e, mais do que tudo, a imagem que o brasileiro tem de si mesmo.
Tem coisa que melhorou pouco. Segurança e saúde, por exemplo. Só que, nesse caso, dá pra dividir (bem) a responsabilidade pelo problema com os governos municipais e estaduais.
Mas dinheiro no bolso, ah, isso as pessoas notam. Emprego novo, filho na faculdade – muitas vezes, o primeiro universitário da família –, salário maior…
Até concordo que Serra tenha que atacar. Essa foi a “adversidade” que Dilma citou, ao criticar o nível do ataque do bad boy carioca.
Apesar de a mídia tentar esconder a crise crescente na campanha de Serra, essa sua sangria de intenções de votos continua lenta e inexorável, Dilma sabe e nós, aqui, sabemos que Serra está indo de mal a pior, e que escolher aquele moleque para vice foi a maior bobagem que fez, pois o eleitorado sabe muito bem que vices podem virar presidentes.
Enfim, como já disse, a postura de Serra é a de perdedor. Ataca porque tenta o tudo ou nada. Enquanto ataca, sua rejeição cresce, aproximando-se, perigosamente, do ponto de não-retorno.