Casuísmo do TSE contra Lula imita ditadura militar
Casuísmo foi um termo muito popular durante a ditadura militar, que modificava leis conforme seu interesse exigia, frequentemente ignorando a própria Constituição para se manter no poder por longos vinte e um anos. A má notícia é que a ditadura oriunda do golpe parlamentar de 2016 quer imitar prática da ditadura anterior criando casuísmo eleitoral contra Lula.
Mudar a lei eleitoral para impedir vitórias dos adversários do regime era pratica comum. Houve casuísmos grotescos, mas não tão maiores do que o que o Tribunal Superior Eleitoral poderá criar.
Voltemos um pouco no tempo, porém, para entender a questão.
Os militares prometiam democracia, mas na primeira derrota eleitoral em 1965, em Estados importantes como Guanabara (hoje Rio de Janeiro) e Minas, as eleições diretas para prefeito das capitais e governadores foram canceladas. A partir dali os mandatários passaram a ser nomeados pelos militares.
Em 1974, uma onda oposicionista varreu o País, com o MDB elegendo a maioria dos senadores. Antes da eleição seguinte, o governo militar instituiu um dos mais grotescos casuísmos eleitorais: a figura do “senador biônico”.
Funcionava assim: um senador era eleito pelas urnas e outro, com o mesmo peso, indicado pelo regime ditatorial. A ditadura conseguia ter maioria irreversível no Senado colocando lá quem queria e sem ouvir o povo.
Veja, abaixo, jornal de 1980 protestando contra essa aberração legiferante
A maioria governista de prefeitos eleitos em 1976 foi mantida no poder por força de um casuísmo. As eleições de 1980 foram canceladas sob a justificativa de que era preciso “coincidir” com as eleições para governador, deputados e senadores, dois anos depois.
Não é por outra razão que o termo “casuísmo” é perfeito para definir a atitude ilegal, inconstitucional e imoral do novo presidente do TSE, ministro Luiz Fux, ao criar a loucura de propor punição a cidadãos que registrem suas candidaturas eleitorais mesmo estando nas condições de inelegibilidade previstas na Lei da Ficha Limpa.
À primeira vista, parece razoável. Porém, indo um pouco mais a fundo descobre-se que a proposta de Fux é ilegal e contraria a própria Constituição brasileira.
Não foi à toa que a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, invocou a lei para protestar contra o casuísmo escandaloso do ministro Fux.
Ela cita o artigo 16A da Lei Eleitoral, que diz o seguinte:
“O candidato cujo registro esteja sub judice poderá efetuar todos os atos relativos à campanha eleitoral, inclusive utilizar o horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão e ter seu nome mantido na urna eletrônica enquanto estiver sob essa condição, ficando a validade dos votos a ele atribuídos condicionada ao deferimento de seu registro por instância superior.”
Como pode o novo presidente do TSE querer revogar uma lei aprovada pelo Congresso sem consulta a esse Congresso? Contra Lula, porém, vale tudo.
Ou não?
Para Fernando Neisser, advogado especialista em direito eleitoral e coordenador da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), Fux afronta a lei com a proposta casuísta que fez.
O especialista considerou “assustadora” a entrevista concedida por Fux pouco depois de assumir a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Para Neisser, a fala da mais alta autoridade eleitoral do Brasil choca porque não existe “irregistrabilidade”. Simples assim.
Fux sugere que, diante de uma suposta inelegibilidade, o interessado nem mesmo poderia fazer o pedido de registro. Muito menos iniciar sua campanha.
O problema é que temos alguns documentos que impedem isso. Um, a Constituição Federal. Outro, a Lei da Ficha Limpa. O terceiro, a Lei das Eleições.
A Constituição diz que ninguém pode ser privado de um direito sem o devido processo legal.
A Lei da Ficha Limpa define prazos para que os pedidos sejam impugnados, para a apresentação de defesa, produção de provas, julgamento e recurso.
Já a Lei das Eleições diz que “o candidato cujo registro esteja sub judice poderá efetuar todos os atos relativos à campanha eleitoral, inclusive utilizar o horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão e ter seu nome mantido na urna eletrônica enquanto estiver sob essa condição” (artigo 16-A).
A Lei das Eleições foi citada pela senadora Gleisi Hoffmann.
Como se vê, tudo que os golpistas de hoje estão fazendo com Lula não passa da reles repetição do que os golpistas de ontem ( há mais de meio século) fizeram para impedir adversários políticos de disputarem eleições consigo.
A história se repete, 54 anos depois.
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Assista, abaixo, a reportagem em vídeo