Economia sofre forte abalo com greve de caminhoneiros
A Bolsa brasileira emendou a quarta baixa nesta segunda-feira (28), afundou mais de 4% e perdeu os ganhos que acumulava no ano, com o mercado todo de olho nos desdobramentos da paralisação de caminhoneiros no país e temores de que as contas públicas já possam ser afetadas. O dólar se aproximou de R$ 3,73.
O Ibovespa, índice que reúne as ações mais negociadas da Bolsa, despencou 4,48%, para 75.355,83 pontos, menor patamar desde 22 de dezembro do ano passado. No ano, passou a acumular queda de 1,37% — até sexta (18), antes dos protestos, registrava alta de 8,74%.
O giro financeiro foi de cerca de R$ 11 bilhões, em dia marcado pelo menor fluxo de estrangeiros com as bolsas americanas fechadas devido a feriado nos Estados Unidos.
“Uma tempestade perfeita se formou, com fatores internos e externos que levaram a essa queda. O Copom [Comitê de Política Monetária] reduziu os juros em 16 de maio, o dólar ganhou força no exterior, e desde então a gente vê uma saída de estrangeiros da Bolsa. A paralisação foi a cereja do bolo”, diz Filipe Villegas, analista de ações da Genial Investimentos.
As ações da Petrobras caíram pelo oitavo pregão seguido. Os papéis preferenciais (mais negociados) recuaram 14,6%, para R$ 16,91, enquanto os ordinários (com direito a voto) tiveram baixa de 14,07%, a R$ 19,79.
Desde que a paralisação começou, a Petrobras perdeu R$ 120 bilhões em valor de mercado e deixou de ser a empresa mais valiosa da Bolsa. Valendo R$ 248,1 bilhões, caiu para a quarta posição, superada por Ambev (R$ 311 bilhões), Vale (R$ 270 bilhões) e Itaú Unibanco (R$ 265 bilhões).
Confirmando pronunciamento do governo, a Petrobras anunciou oficialmente ao mercado que nesta segunda que manterá por 60 dias uma redução no preço do diesel e que, após esse prazo, os reajustes passarão a ser mensais, e não mais até diários.
A companhia disse que será ressarcida pela União pela redução e que não haverá prejuízos ao caixa.
“O fato de que a viabilidade da política de preços da Petrobras depende da concessão de subsídios ainda deve levar a questionamentos no mercado”, escreveu a equipe de estratégia e análise da XP Investimentos em relatório a clientes. “Ainda restam dúvidas sobre como será a forma de pagamento do reembolso pelo governo (e como isso impactará resultados), e qual o nível de prêmio e margens de refino que a empresa conseguirá manter quando retomar os reajustes de diesel após 60 dias.”
Uma pessoa próxima à estratégia da Petrobras disse à agência Reuters que a companhia quer receber antecipadamente os recursos referentes ao congelamento do diesel por 60 dias anunciado pelo presidente Michel Temer, até para que não haja uma má sinalização para o mercado, que já penalizou duramente suas ações temendo comprometimento de receitas e a possibilidade de novas interferências governamentais na estatal.
Em nota a clientes, a equipe do banco suíço UBS ponderou que a mudança na política de preços poderia levar a alterações na gestão da empresa. O risco de uma renúncia do presidente da Petrobras, Pedro Parente, deixa investidores tensos. O executivo é visto com bons olhos pelo mercado porque acabou com a política de controle de preços dos combustíveis pela estatal.
“Mesmo Pedro Parente sendo elogiado, ele está sendo colocado na berlinda e a política de preços também, embora o governo faça de tudo para protegê-la. O mercado não está dando o benefício da dúvida e há um forte enxugamento de exposição nessas ações”, diz Cleber Alessie, da corretora HCommcor.
A crise dos combustíveis contaminou quase todo o mercado acionário brasileiro ao evidenciar fragilidades do governo e após economistas apontarem impactos nas contas públicas.
O custo fiscal do governo para atender aos pedidos da categoria de caminhoneiros chega a R$ 13,5 bilhões, que serão compensados por cortes de gastos e aumento de outros impostos.
Pesquisa Focus do Banco Central mostrou que o mercado reduziu a projeção de crescimento da economia brasileira neste ano, depois de uma semana de paralisação de caminhoneiros, com a mediana das estimativas do PIB (Produto Interno Bruto) caindo de 2,5% para 2,37%.
“Não é mais só questão de preocupação com abastecimento e outros problemas, é um questão de PIB, estamos começando a ter impacto muito ruim e isso contamina os ativos”, diz Alessie.
As taxas dos contratos futuros de juros também fecharam a segunda em alta, apesar da atuação do Tesouro, que anunciou leilões de compra e venda de títulos públicos entre os dias 28 e 30 de maio, às 11h.
O DI para janeiro de 2025 passou de 10,9% para 11,02%, enquanto o DI para janeiro de 2027 foi de 11,27% para 11,37%.
Das 67 ações que compõem o Ibovespa, 65 caíram e apenas duas subiram —ambas do setor de celulose. “A gente costuma dizer que as ações sobem de escada, mas descem de elevador”, diz Villegas.
As siderúrgicas foram atingidas em cheio pelo momento nacional conturbado. A CSN caiu 10,4%, a Gerdau recuou 6,25% —a Metalúrgica Gerdau, sua holding controladora, perdeu 7,51%— e a Usiminas recuou 7,33%. A Vale conseguiu se segurar um pouco mais e caiu 0,8%, porque “tem receita atrelada ao dólar”, aponta Villegas.
A equipe de estratégia da XP Investimentos estimou que as siderúrgicas podem perder até 20% do faturamento de maio, ou 7% do trimestre.
Analistas do BTG Pactual afirmaram em nota a clientes, citando um exercício teórico, que a cada cinco dias úteis de paralisação o impacto nas vendas das siderúrgicas brasileiras seria de: perda de 7% do Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) para Usiminas, 4% para Gerdau e 3% para CSN.
A concessionárias também sofrem com a queda no fluxo de caminhões nas estradas e são afetadas pela medida anunciada pelo governo de estender para todas as rodovias a isenção da cobrança de pedágio pelo eixo suspenso (vazio). A Ecorodovias caiu 6,17%, e a CCR, 4,53%.
O cenário político frágil e a fuga da investidores estrangeiros pressionam as ações dos bancos. Os papéis do Itaú Unibanco recuaram 4,23%. As ações preferenciais do Bradesco caíram 4,23%, e as ordinárias se desvalorizaram 3,44%. O Banco do Brasil despencou 7,34%, e as units –conjunto de ações– do Santander Brasil perdem 3,66%.
As altas foram da Suzano (+1,53%) e da Fibria (+1,14%). Apesar de a Suzano ter anunciado que paralisaria suas operações e a Fibria ter decidido reduzir o ritmo de produção nas fábricas em Jacareí (SP) e Três Lagoas (MS), as ações dessas empresas são consideradas mais seguras em cenários turbulentos, porque mantém forte relação com o dólar, que se valorizou ante o real no dia.
Com a grande aversão a risco, investidores buscaram proteção no dólar.
O comercial subiu 1,63%, para R$ 3,729. O dólar à vista também avançou 1,63%, mas cotado a R$ 3,72.
“O mercado está focado no problema fiscal, com o impacto que as medidas vão ter nas contas públicas”, afirmou o diretor de câmbio da assessoria de câmbio FB Capital, Fernando Bergallo. “Outras paralisações podem elevar o rombo.”
A FUP (Federação Única dos Petroleiros) convocou uma paralisação de 72 horas a partir de quarta (30), para protestar contra a política de preços da estatal e o que chama de desmonte da petroleira.
O Banco Central vendeu integralmente a oferta de até 15 mil novos swaps cambiais tradicionais, equivalentes à venda futura de dólares, totalizando US$ 5,75 bilhões desde a semana retrasada, quando vendia por dia até 5.000 contratos.
“Não fosse o Banco Central atuando, com certeza o dólar estaria em R$ 3,80 ou acima. Ele está fazendo a diferença. Não podemos descartar novas intervenções ou aumento das atuais”, afirma Alessie.
A autoridade também vendeu integralmente a oferta de até 4.225 swaps tradicionais para rolagem do vencimento de junho, no total de R$ 5,650 bilhões.
O feriado do Memorial Day fechou os mercados nos Estados Unidos, o que afeta a liquidez nos mercados internacionais.
“Hoje é um mercado sem estrangeiros de modo geral. O investidor local está com muito receio de como será o dia de amanhã quando Nova York abrir, pode ser que o mercado esteja antecipando isso fortemente”, diz Alessie.
Com informações da Folha