Mudanças na Justiça e Toffoli presidindo STF reduzirão punitivismo
O Judiciário deverá sofrer grandes transformações em setembro, com o fim da gestão das ministras Cármen Lúcia, no Supremo Tribunal Federal, e Laurita Vaz, no Superior Tribunal de Justiça.
O modelo centralizador e discreto das duas presidentes será substituído por uma administração de ex-advogados.
O ministro Dias Toffoli assumirá a presidência do STF, e João Otávio de Noronha, a do STJ. Humberto Martins, também oriundo da advocacia, será o novo corregedor nacional de Justiça.
A Folha consultou reservadamente vários ministros de tribunais superiores, juízes, advogados, procuradores e promotores, para saber o que esperam do Judiciário no próximo biênio.
Advogados de réus do esquema do mensalão e da Lava Jato creem que haverá a redução do “punitivismo” e maior compromisso com as liberdades. Apostam na experiência administrativa do trio.
Promotores, por sua vez, preveem retrocesso no combate à corrupção, diminuição das prisões de detentores de foro especial, mais corporativismo e tolerância com desvios de magistrados.
Juízes que fazem restrições a quem não ingressa no Judiciário pela porta do concurso público, caso dos três ministros, receiam maior ingerência política no Judiciário e uma asfixia da carreira.
Alguns entrevistados identificam limitações na formação jurídica dos futuros dirigentes, mas realçam sua capacidade de diálogo, prevendo melhor interlocução com os demais Poderes.
Toffoli não tem pretensões acadêmicas. Conversa com o ministro Luiz Fux, que o sucederá, sobre projetos para quatro anos. É habilidoso e acessível, e prestigia as associações de magistrados.
Os advogados esperam que ele organize os julgamentos sem privilegiar aqueles considerados “politicamente corretos”, e que evite se imiscuir em questões que não são da alçada do Judiciário.
Toffoli presidirá o Conselho Nacional de Justiça com a expectativa de que o órgão retome atividade própria, desvinculada do STF. No CNJ, critica-se a gestão atual.
A dupla Dias Toffoli-Humberto Martins deverá ser mais harmônica do que a dupla Cármen Lúcia-Noronha.
No STJ, Martins tem sido um vice-presidente correto. É sempre acionado quando o tribunal necessita se relacionar com o Congresso. Está consultando colegas para traçar planos. No mesmo estilo de Noronha, diz que o corregedor deve atuar como espécie de terapeuta.
Para os mais críticos, Toffoli, sem maior preparo, vai ser presa fácil para o lobby político. A tendência é que ele adote uma pauta mais corporativista do que a de sua antecessora.
Toffoli é afinado com o ministro do Supremo Ricardo Lewandowski, que abriu maior espaço no CNJ para as associações de magistrados.
Deve apostar na composição. Tem boa equipe e boas relações no STF e na magistratura –ele não se indispõe com ninguém.
Toffoli e Noronha são amigos fraternos. O ex-secretário geral do TSE na gestão Toffoli, juiz Carlos Vieira Von Adamek, atualmente é o braço direito de Noronha na corregedoria nacional.
Toffoli, Noronha e Martins deverão permanecer na mira da imprensa. Em setembro de 2016, a Folha revelou que o escritório da mulher de Toffoli, a advogada Roberta Rangel, recebeu dinheiro de empresas investigadas na Lava Jato.
Toffoli disse à época que o caso não se enquadra nas hipóteses de impedimento para atuar em processos da operação.
Ministros do STJ se sentem desconfortáveis com a desenvoltura dos jovens advogados filhos de Noronha e de Martins atuando em processos que tramitam na corte.
Noronha assumirá uma corte dividida. Segundo colegas, ele não tem a menor relação com a futura vice-presidente, Maria Thereza de Assis Moura. Já travou discussões acaloradas em plenário com o ministro Francisco Falcão, ex-presidente do STJ.
Eleito nesta semana presidente por aclamação, como o ministro mais antigo, Noronha convidou os colegas ministros, aos quais ofereceu um jantar no Restaurante do Lago, em Brasília.
O corregedor nacional blindou a magistratura, como havia prometido. Durante dois anos, fez inspeções em tribunais estaduais e não levou os relatórios a plenário, como manda o regimento.
A constelação Toffoli-Noronha-Martins deve fortalecer Gilmar Mendes no STF e Renan Calheiros (MDB-AL) no Senado.
Humberto Martins foi advogado do senador alagoano, que apoiou sua nomeação para o STJ, onde enfrentava resistência por ter apenas três anos como desembargador.
Toffoli trabalhou na Casa Civil do governo Lula, sob as ordens do então ministro José Dirceu, quando advogou simultaneamente para clientes do Partido dos Trabalhadores.
Apesar da ligação com Dirceu, Toffoli se aliou a Gilmar. Prevê-se que deverá assumir posições mais garantistas, de maior leniência com a criminalidade, sobretudo a do colarinho branco.
Nos próximos dois anos, o Judiciário deve retomar as concessões de honrarias, promoções de eventos e viagens internacionais.
Em maio último, Toffoli e Martins receberam medalhas da Associação dos Magistrados Brasileiros, em Alagoas.
Em 2015, Martins convidou os ministros do STJ Mauro Campbell, Raul Araújo e Napoleão Nunes Maia para participarem de homenagem a si próprio, em Alagoas, com discurso do governador Renan Filho, filho do senador emedebista. A OAB criou então uma medalha. Martins recebeu uma delas.
Quando presidiu o TSE, Toffoli engordou o contracheque com diárias de viagens a 11 países como observador de eleições e palestrante. E criou uma medalha no TSE, no final de sua gestão.
Atual presidente do TSE, Luiz Fux tem mandato na corte vai até agosto. Ele será substituído por Rosa Weber, que terá a missão de chefiar a eleição de outubro. Além de Rosa, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin devem ser os outros ministros do STF no TSE no período eleitoral.