Temer começa a queimar reservas cambiais para conter dólar
A disparada do dólar para R$ 4,21 ao longo desta quinta-feira (30) forçou o Banco Central brasileiro a intervir para conter o impacto da crise na Argentina sobre o real, já fragilizado pela eleição.
O BC ofertou lote adicional de 30 mil contratos de swap cambial tradicional (equivalente à venda futura de dólares) no valor de US$ 1,5 bilhão (R$ 6,2 bilhões). A autoridade não fazia ação do tipo desde junho, em meio a reflexos da paralisação dos caminhoneiros.
Com a entrada do BC no mercado, o dólar desacelerou e fechou em alta de 0,63%, a R$ 4,145 –ainda assim, a segunda maior cotação anterior aos R$ 4,166 registrados em janeiro de 2016, recorde desde o Plano Real.
Em nota, o BC disse que a medida visa a prover liquidez e garantir o bom funcionamento do mercado cambial.
“A intensidade e a frequência das intervenções dependerão da dinâmica e das disfuncionalidades observadas”, afirmou.
O dia já começou desfavorável para países emergentes com dados fortes na economia dos Estados Unidos aumentando a expectativa de uma elevação mais acelerada nas taxas de juros.
Foi, no entanto, o derretimento da moeda argentina que azedou de vez o humor dos investidores.
O dólar disparou 23% na Argentina, fechando na máxima histórica de 39,65 pesos, apesar de o banco central do país ter anunciado nesta quinta elevação dos juros de 45% para 60% (a maior taxa do mundo), em uma tentativa de conter o câmbio.
O mercado não reagiu bem à declaração do presidente Mauricio Macri informando, na véspera, que o governo pedira um adiantamento de US$ 3 bilhões (R$ 12,4 bilhões) do empréstimo de US$ 50 bilhões (R$ 207,6 bilhões) ao FMI (Fundo Monetário Internacional) para conter a nova “tormenta”.
Segundo ele, a instabilidade vem do cenário internacional adverso para emergentes.
Alberto Ramos, economista-chefe para América Latina do Goldman Sachs, afirmou, em relatório, que “na raiz do atual estresse do mercado estão sobretudo as grandes exigências de financiamento fiscal e o desconforto do mercado com a habilidade do país de custeá-las sob condições normais de mercado”.
Para manter a linha de crédito com o FMI, o país se comprometeu com a redução da inflação (hoje em 25%) e do déficit fiscal em 1,3% em 2019.
O chefe de gabinete de Macri, Marcos Peña, afirmou que “claramente este não é o cenário que desejávamos”, mas acrescentou que “não há uma solução mágica”.
“Estamos caminhando para atingir o equilíbrio fiscal, que é o eixo central para reduzir nossas vulnerabilidades. Há problemas, mas há que se ver o filme inteiro e não apenas a foto deste momento”, disse.
A oposição criticou duramente a alta dos juros.
O deputado peronista José Ignacio de Mendiguren afirmou que “hoje apareceu com mais clareza para Macri a Argentina real, e ele não sabe o que fazer com ela”.
Cartazes e muros com os dizeres “volte Cristina” começaram a surgir por Buenos Aires, e centrais sindicais planejam uma greve geral nos dias 24 e 25 de setembro.
Apesar das turbulências, o banco JPMorgan avaliou que o impacto da crise cambial da Argentina na América Latina é baixo –a Turquia seria o emergente mais vulnerável.
“Olhando para os fundamentos econômicos, o Brasil é bem diferente de Argentina e Turquia, países em que a dívida líquida em dólar é enorme, por exemplo”, diz José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator.
O cenário político incerto no Brasil deixa o país, no entanto, mais exposto a mudanças de humor externas, destaca Roberto Padovani, economista-chefe do Banco Votorantim.
“O Brasil está vulnerável porque temos uma situação fiscal bastante ruim e a superação disso depende do próximo presidente.”
O Ibovespa, índice das ações mais negociadas por aqui, recuou 2,53%, para 76.404,09 pontos nesta quinta.