Com risco de rompimento, barragem pode inundar cidade no Piauí
A barragem de um açude com 54,6 milhões de m³ de água corre “risco iminente” de romper, colocando em perigo a vida dos 62 mil habitantes da cidade de Piripiri (a 160 km de Teresina), no Piauí. Um relatório técnico resultou em uma Ação Civil Pública, mas o governador do estado, Wellington Dias (PT), falou do perigo como um boato, ou “fake news”, conforme noticiou a imprensa local.
A ação da Promotoria de Justiça de Piripiri se baseou em um relatório de inspeção do Dnocs (Departamento Nacional de Obras contra a Seca), que no dia 10 de dezembro do ano passado foi notificado sobre a existência de “uma grande cavidade” no açude, construído entre 1936 e 1945 para irrigar a região em períodos de seca.
Chegando ao local, os engenheiros encontraram outras crateras. “Importante registrar e informar a existência de outras erosões existentes ao longo do talude de jusante [parte da frente de uma barragem]”, diz o relatório, que conclui: “Pela gravidade da situação, com risco iminente de rompimento da barragem, imediatamente recuperamos emergencialmente a cavidade”.
De acordo com o engenheiro Francisco Ribeiro Soares, que assina o documento, a erosão começou depois do asfaltamento da rodovia estadual PI 327, que cruza todo o açude. Construída sem espaço para drenar a água da chuva, a obra provocou a “anomalia” na barragem, “ocasionada pela pressão da água nos momentos de temporais”.
O Dnocs concluiu seu relatório pedindo ao DER (Departamento de Estradas de Rodagem) que corrigisse a obra “antes que algo de mais grave aconteça, qual seja até o rompimento da barragem, evitando dessa forma tragédias com ceifamentos de vidas humanas”.
O DER não respondeu aos pedidos de explicação feitos pela Promotoria. O Departamento só se manifestou depois que a Justiça do Piauí acatou o pedido do promotor no dia 6 de fevereiro em decisão liminar. “Conseguimos essa liminar favorável à ação. O caso é sério”, disse Ribeiro à reportagem.
Com a decisão, o governo do estado tem 15 dias para iniciar as obras, que precisam ser concluídas em até 60 dias. Na ocasião, a juíza aceitou o pedido para bloquear R$ 1 milhão do Fundo de Participação do Estado para execução das obras em caso de descumprimento da ordem judicial.
Alertado na época sobre o perigo, o governador reeleito Wellington Dias “pediu que os piauienses não espalhem fake news porque as barragens não estão correndo risco”, segundo informou a edição do dia 31 de dezembro do jornal Meio Norte. Especificamente sobre o Açude Caldeirão, “Dias falou que não há riscos”.
Procurada pela reportagem, a assessoria do governo nega que Dias tenha feito “pouco caso de tal situação”, como afirma o promotor na ação. “Ele não tratou o assunto como fake news. O que aconteceu foi que aqui no Piauí circularam vários vídeos e fotos de populares dizendo que as barragens estavam se rompendo e causariam tragédias. O que ele disse foi que causar pânico dizendo que as barragens iriam romper, sem um laudo técnico, seria fake news.”
A assessoria do governo também falou em nome do DER, que está sem assessoria de imprensa. Afirma que demorou para acatar a recomendação da promotoria porque precisou aguardar o resultado de uma licitação para contratar a empresa que executará a obra.
Embora de responsabilidade do governo estadual, o prefeito da cidade, Luiz Menezes (PMDB), encaminhou ofícios ao DER, à Assembleia Legislativa e ao Ministério Público. Na ocasião, ele afirmou se tratar de “um assunto gravíssimo”. “E o problema não é somente no trecho da crista do Caldeirão, mas sim por toda a extensão da PI que liga a cidade de Lagoa de São Francisco.”
De acordo com o governo, as obras de reparo já começaram. Mesmo assim, parte dos 62 mil habitantes da cidade está em estado de alerta. “Depois de Brumadinho, todo mundo fica preocupado com a situação. Mesmo começando as obras, é difícil confiar”, afirma a vendedora Maíra Gonçalves, 33.
Maíra, que nasceu no município, afirma que, apesar do pânico, não pretende deixar a cidade. “A gente vai ficando. Depois do alerta, os dias vão passando e as pessoas acabam se acomodando. A gente acha que não vai acontecer, mas, se ela romper, vai pegar toda a população.”
Da FSP