Azevedo sobre Guedes e os combustíveis: “Duvido que alguém o tenha consultado antes”
Nos EUA, Guedes dá uma resposta enigmática. Ora, se tivesse sabido previamente da decisão e concordado, que mal fazia dizê-lo?
Paulo Guedes, coitado, faz um esforço danado para ver se a estátua à qual ele tentou dar envergadura de estadista faz ao menos uma coisa certa. Mas o ministro foi malsucedido na sua carreira de Pigmaleão. Está em Nova York a dizer a endinheirados: “invistam no Brasil, fazemos tudo certo, gostamos da economia de mercado, queremos Estado menor”. Se eu fosse um esquerdista, poderia escrever: “Lá está o ministro a dizer que somos macaquitos bem-comportados. Não exigimos reciprocidade nem para visto”.
De fato, um novo valor se alevantou nestes tempos: arreganhar os dentes e as unhas para os humildes dentro do país e, lá fora, deixar claro que passou a vigorar a máxima: “Primeiro eu apanho e depois você me bate”. Saímos de um certo terceiro-mundismo retórico meio bocó e migramos para a subserviência orgulhosa: agora o Brasil disputa o primeiro lugar na fila dos sabujos para tocar flauta para Donald Trump. A Guatemala chegou primeiro. Nada que não possamos vencer, certo? De toda sorte, lá está Guedes: vamos vender estatais; seremos exemplares em seguir as regras de mercado; não queremos na OMC nem as facilidades que a China — que deve, então, ser trouxa — quer de “país em desenvolvimento”; ambicionamos ser tratados como país rico. Insisto: a China não se incomoda de ser vista como ainda meio pobre… Vai ver os chineses, cujo país é principal motor do crescimento no mundo, estão errados, e Banânia está certa…
Tá bom! Esse discurso poderia ser ao menos coerente. Mas nem isso. Em Nova York, Guedes foi aparentemente surpreendido pela decisão de Bolsonaro de meter a mão grande na Petrobras. Seus passos ligeiros, mas necessariamente miúdos, para não ter de dar explicações a jornalistas tem um quê de patético. E quase desperta a nossa solidariedade — não tivesse ele se juntado a Bolsonaro por escolha, não por imposição da natureza. Às câmeras e aos microfones, uma frase de efeito: “O meu silêncio ensurdecedor para os senhores”. Longe de ambos, um enigma inútil. Afirmou que a possibilidade de que não tenha sido avisado da lambança na Petrobras é “Uma inferência razoável aparentemente”. Quis dizer o quê?
Na verdade, nada. A “inferência” é uma proposição que se dá como verdadeira, resultado de outros elementos da realidade que permitem, então, chegar a uma conclusão. Mas Guedes também não quer queimar os navios. Tal conclusão seria “razoável” no sentido de “plausível”, mas não necessariamente verdadeira. Por isso ele acrescenta o “aparentemente”. No fim das contas, o conjunto pode estar a dizer: “Isso que vocês dizem parece óbvio, já que sou o liberal de carteirinha do governo, mas se trata de algo apenas aparente”. Com a resposta que deu, ele poder ter sido avisado ou não. Duvido que alguém o tenha consultado antes.
Pois é… Como o assunto envolve combustível, é um clichê esperado evocar o “Posto Ipiranga” com a bomba vazia, né?
A decisão de Bolsonaro não diminuiu o valor de mercado apenas da Petrobras. O valor de mercado de Guedes caiu bem mais.
Do UOL