Publicidade infantil: Damares quis afrouxar leis

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O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos pediu a revisão da resolução 163 do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente), que proíbe a  publicidade infantil e veta o uso de personagens infantis em anúncios.

O pedido consta de nota técnica assinada pelo diretor de Formação, Desenvolvimento e Fortalecimento da Família, Paulo Tominaga, em 26 de março. O documento chegou ao Conanda em 12 de abril, após ser encaminhado pelo gabinete da ministra Damares Alves.

A nota argumenta que a responsabilidade de proteção da criança deve ser da família, e não do Estado.

“Entendemos que as vedações práticas decorrentes do artigo 2º da resolução 163, de 2014, podem, em certas circunstâncias, efetivamente estabelecer condições pouco favoráveis ao processo de formação que deve ser protagonizado pelos pais em relação à aquisição de bens e serviços por seus filhos”, diz o texto.

O artigo a que a nota se refere considera abusivo o direcionamento de publicidade a crianças com intenção de persuadi-la ao consumo de produtos ou serviços e usando, dentre outros, linguagem ou música infantil, desenho animado ou bonecos.

Expor crianças à publicidade, defende o ofício do ministério, seria uma maneira de ensiná-las a ter critérios.

“É fundamental que a criança aprenda a descobrir e interpretar as mensagens e as pretensões não apenas dos veículos de comunicação, publicidade e propaganda, como também dos próprios colegas e adultos”, afirma o texto.

O documento também discute o veto ao uso de personagens infantis em campanhas publicitárias. Hoje, é proibido anunciar com personagens ou apresentadores infantis, ou fazer publicidade dentro da escola ou em material escolar.

Mascotes ou apresentadores infantis só podem participar de campanhas educativas ou com intuitos sociais, como o personagem Zé Gotinha, para a vacinação.

Os membros do Conanda reagiram com surpresa ao pedido. Três deles afirmaram que é a primeira vez que o ministério envia uma nota técnica pedindo uma revisão de uma resolução.

O Conanda, órgão vinculado ao Ministério da Mulher e da Família, fiscaliza o cumprimento das normas do Estatuto da Criança e do Adolescente. Suas resoluções têm poder vinculante e devem ser seguidas por todos os agentes sociais e estatais.

Após uma sessão plenária nesta semana, o Conanda se posicionou contra a revisão da norma e encaminhou resposta contrária à mudança da resolução.

O texto oficial deve ser publicado nesta sexta-feira (26), e traça um histórico da discussão da publicidade infantil nos últimos 30 anos.

“É uma surpresa o ministério –que é justamente o ministério responsável pelos direitos humanos– questionar um sistema legal que é protetor da criança contra abusos que são cometidos ainda hoje”, diz Isabella Henriques, advogada do Instituto Alana, ONG que milita pelos direitos das crianças.

O instituto tem assento no conselho.

“Fazer proibição é exatamente garantir o direito de liberdade da família, das mães e dos pais. Quando a publicidade fala diretamente com a criança, está estabelecendo uma relação direta com a criança”, diz Henriques.

Dois advogados especialistas em direito infantil que não quiseram se identificar se disseram surpresos com o pedido de revisão.

Pesquisa feita pelo Datafolha em agosto de 2016, que ouviu 2.573 pessoas em 160 municípios, apontou que 60% dos brasileiros são contrários a qualquer tipo de publicidade para o público infantil (até 12 anos).

O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos afirmou que não vai comentar a nota técnica.

De FSP