“Vamos lutar pela terra!” diz Erileide Guarani Kaiowá

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Fevereiro de 2013. Denilson Barbosa Guarani Kaiowá parte da aldeia de Tey’Ikuê para pescar em uma fazenda sobreposta à Terra Indígena. Horas depois, o corpo do jovem de 15 anos é encontrado baleado e distante do local em que foi assassinado.

Na delegacia de Caarapó, Orlandino Carneiro Gonçalves assumiu a autoria dos disparos mortais. Logo depois negou. Em Nova York, nesta quinta (25), durante evento paralelo ao Fórum Permanente sobre Questões Indígena das Nações Unidas (ONU), a versão Guarani Kaiowá para esta e outras histórias foi contada.

“Enquanto esperamos as demarcações das nossas terras, tiram nossas vidas. Câmeras nos vigiam, se entrarmos na propriedade do fazendeiro pra pescar ou caçar, só sai o corpo de cada jovem que lá entra”, diz Erileide Domingues Guarani Kaiowá.

Ao lado do vice-procurador Geral da República, Luciano Maia, e do presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Dom Roque Paloschi, a indígena falou ao painel “A importância da prevenção do genocídio na sobrevivência do conhecimento tradicional”. A incidência internacional ocorre de forma paralela ao 15º Acampamento Terra Livre (ATL), que ocorre em Brasília até sexta (26).

“O Brasil vive um momento em que o ódio foi plantado e uma flor ruim está nascendo. Não conseguimos respirar como os não indígenas respiram. Não conseguimos dormir debaixo de lonas pensando no próximo ataque, nos idosos, nas crianças, na próxima morte”, afirma.

O tekoha – lugar onde se é – Guyraroká possui 11 mil hectares. “Ocupamos 55 hectares com 120 famílias. Não temos esperança de plantar e de ter a nossa dignidade. Parecemos formigas em nossa aldeia”, explica Erileide ao falar do confinamento.

“A nossa água é contaminada direto no lençol freático, pulverização na soja nos afeta… Nós, povos tradicionais, que tiramos alimento do mato já acabaram contaminando tudo com agrotóxico”, explica. Diante da comunidade internacional, a Guarani Kaiowá disse: “não conseguimos nem aproveitar o animal morto envenenado para comer”.

Erileide explica que até mesmo o sangue Guarani Kaiowá é atacado porque está poluído por agrotóxicos lançados sobre aldeias do povo, que insiste em se manter em terras tradicionais mesmo dominadas por monocultivos.

“Quando o governo brasileiro olha para os povos indígenas, somos como mortos vagando pela terra destruída. Somos ameaçados a cada minuto da nossa vida. Só por sermos vistos já somos ameaçados”.

A indígena faz um apelo: “eu peço em nome do povo Guarani Kaiowá que olhem para nós, nos ajude. Do governo brasileiro já não temos mais atenção ou esperança de seguir as nossas vidas com a nossa tradição”. O presidente Jair Bolsonaro foi descrito pela Guarani Kaiowá como um “cego que enxerga como um animal”.

“Chamam nós de invasores de territórios. Se nós retomamos um pedacinho de terra é para nossa vida e futuras gerações. Nós vamos permanecer na nossa terra. Porque o que está no papel do branco não ouve a terra que grita e os povos originários ouvem”. Cerca de 42 retomadas e acampamentos Guarani Kaiowá aguardam demarcação.

O recado para a bancada ruralista, artífice deste cenário de terror e medo, é um ensinamento generoso: “ela [a bancada] não sabe, mas ela morre também com os indígenas que morrem”. Erileide lembra que os rezadores de seu povo convivem com os espíritos, sabem o que vem pela frente; para os não índios também.

Seu avô, Tito Vilhalva, um ancião com mais de 100 anos, mantém o sonho de se juntar aos espíritos para quem reza com a terra demarcada. “A função do mais jovem é cuidar do mais velho. Por isso fazemos retomadas, mas o jovem Guarani Kaiowá está se matando porque é chamado de invasor, ladrão, é discriminado, não vê um futuro”.

“Vamos lutar pela terra, nem que eles abram um buraco, nos matem e enterrem”, diz. Para Erileide, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) precisam garantir que os direitos indígenas sejam respeitados quando não há mais possibilidade de esperar isso do governo.

Do Mobilização Nacional Indígena