Promotores não acreditam que o líder da quadrilha da Alerj seja o ex-motorista e ex-assessor Queiroz
Ao pedir a quebra de sigilo do senador Flávio Bolsonaro (PSL) e de outras 94 pessoas, o Ministério Público Estadual do Rio afirmou que são ‘inverossímeis’ as justificativas do ex-assessor Fabrício Queiroz sobre as movimentações financeiras de R$ 1,2 milhão consideradas suspeitas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). O Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção da Promotoria do Rio atribui ao senador indícios de ‘fantasmas’, compra e venda sub e superfaturada de imóveis, apropriação de salários e ‘laranjas’.
De acordo com a Promotoria, ‘não parece crível a insinuação da defesa de que a liderança da organização criminosa caberia ao próprio Queiroz, um assessor subalterno, que teria agido sem conhecimento de seus superiores hierárquicos durante tantos anos’.
O Ministério Público ainda diz que ainda estão pendentes a identificação das lideranças do núcleo político e outros possíveis integrantes dos núcleos operacional e executivo, bem como a descoberta do destino final dos recursos desviados’.
Nos autos da investigação, Queiroz afirmou, por meio de seus advogados, ter conhecido Flávio na década de 1980, e foi convidado a exercer o cargo em 2007.
Ele justifica que, em razão de o parlamentar ter tido uma ‘margem pequena de votos’ nas eleições de 2006, teve a ideia de construir uma ‘aproximação maior com a base eleitoral nos setores de segurança pública e forças armadas’, acrescentando que, apesar de o chefe de gabinete oficial da reserva da Força Aérea Brasileira e já cuidar da relação superior e institucional da base eleitoral, coube a Fabrício Queiroz ‘gerenciar as questões relacionadas à atuação dos assessores fora do gabinete do deputado, ou seja, em caráter externo, trabalhando para ‘expandir as redes de contato e de colaboradores do deputado’.
Queiroz diz que acertou com os comissionados que, para trabalharem no gabinete de Flávio, teriam de entregar parte dos vencimentos para que ele repassasse a outras pessoas que atuariam como assistentes informais da base eleitoral do deputado estadual.
Antes ainda de se manifestar por meio de defensores, Queiroz havia dado outra versão, em entrevista ao SBT na qual afirmou ter obtido o dinheiro com revenda de carros usados. “Sou muito bom de negócio”.
Para os promotores, as afirmações não são factíveis. “As declarações de Fabrício Queiroz, com nítido objetivo de tentar assumir sozinho a responsabilidade penal e desviar o foco da investigação que também recai sobre o ex-deputado estadual que nomeou os assessores envolvidos no esquema criminoso, não foram acompanhadas por nenhum momento de prova e pecam por diversas fragilidades e contradições”.
A Promotoria ressalta que a defesa ‘nem sequer indicou os nomes desses supostos assessores ‘externos’ ou apresentou a contabilidade de tais pagamentos’.
“Ora, caso a destinação dos recursos desviados realmente tivesse a finalidade alegada pela defesa, Fabrício Queiroz não teria dificuldades de indicar os dados qualificativos e a quantia que cada pessoa teria recebido, já que se intitulou como gerente dos ‘assessores’ de fora do gabinete”.
“Não se pode sequer alegar que não houve tempo de providenciar a relação dos destinatários dos recursos, pois a defesa técnica do investigado já teve acesso aos autos há mais de três meses e mesmo assim não juntou qualquer comprovação material de suas alegações”, afirmam os promotores.
Eles destacam que,’além de não ter sido fornecido pela defesa técnica nenhum documento com a identificação das pessoas e a contabilização dos recursos repassados aos supostos assessores, pela argumentação defensiva tampouco haveria qualquer controle sobre as atividades externas, supostamente desenvolvidas por essas pessoas’.
“Ou seja, não há evidências de que quaisquer pessoas tenham sido remuneradas pelos valores desviados para a conta de Fabrício Queiroz, nem de que quaisquer valores lhes tenham sido repassados, nem de que quaisquer atividades tenham sido desempenhadas pelas mesmas, inexistindo qualquer elemento de corroboração a indicar que tal alegação seja algo diverso do que uma conveniente obra de ficção.”
Segundo os promotores, a versão de Queiroz também não é compatível com os relatórios de inteligência financeira do Coaf, que mostram que ele ‘acolheu como vencimentos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro o valor de R$ 81 mil, enquanto os pagamentos de títulos bancários, despesas eminentemente pessoais, superam seus vencimentos, alcançando o valor de R$ 101 mil, de onde é possível concluir que, no mínimo, Fabrício Queiroz se apropriava de parte dos valores desviados dos salários dos assessores depositados em sua conta bancária para pagar despesas pessoais que superavam sua capacidade financeira’.
“Outro ponto que fragiliza sobremaneira a tese defensiva é a existência de centenas de milhares de reais movimentados através de depósitos e saques fracionados em espécie na conta de Fabrício Queiroz ao lado de transferências bancárias identificadas envolvendo outros assessores”, afirmam os promotores.
“Ora, se o investigado entendia ser lícita a conduta de ecigir parte dos salários dos assessores e transferir para terceiros, por que ao invés de transferir diretamente os recursos para as contas dos destinatários realizava vários depósitos e saques em espécie de forma fracionada, em notória tentativa de burlar os mecanismos de identificação do Coaf?”, indagam
Os promotores ainda questionam. “E por que o advogado do investigado, mais de três meses depois de ter tido acesso aos autos da investigação, ainda não sabe informar a relação das pessoas que teriam sido beneficiadas pelas contratações informais?”
E exemplificam. “Mais uma circunstância que torna incoerente a tese defensiva é o fato de o Policial Militar Jorge Luís de Souza, também assessor do ex-deputado estadual Flávio Bolsonaro, ter depositado a expressiva quantia de R$ 90 mil em uma única transação, em espécie, na conta bancária de sua mãe”.
“Portanto, todas essas circunstâncias levantam suspeitas de que os valores transferidos ou sacados em espécie pelos assessores não eram destinados para a contratação de assistentes informais como afirma a defesa de Queiroz. Ao revés, as informações de inteligência financeira sugerem que as quantias desviadas do orçamento da Alerj eram distribuídas entre as principais lideranças do Gabinete Parlamentar, razão pela qual se justifica a presente medida cautelar para aprofundamento das investigações”, concluem.
COM A PALAVRA, FLÁVIO BOLSONARO
O senador Flávio Bolsonaro defende-se por meio de nota divulgada por sua assessoria dizendo que ‘não são verdadeiras as informações vazadas acerca de meu patrimônio’. Ele afirmou que continua sendo ‘vítima de seguidos e constantes vazamentos de informações contidas em processo que está em segredo de justiça’.
COM A PALAVRA, A DEFESA DE QUEIROZ
O advogado Paulo Klein, defensor da família Queiroz, também rebateu as acusações. “O que dizer do MP que depois de 1 ano e 5 meses não tem indícios mínimos de prática criminosa? Tanto é que não existe denúncia até agora.”
De Estadão