Sem saída, Moro “manda” The Intercept fazer o que já vinha fazendo

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O ministro da Justiça, Sérgio Moro; conversas do ex-juiz com Deltan Dallagnol foram publicadas por site Foto: Dida Sampaio/Estadão

Com a entrevista ao Estadocujos principais eixos repetiu depois ao longo do dia de ontemSérgio Moro tentou uma mudança de estratégia diante da revelação de suas conversas com Deltan Dallagnol, que vinham sendo publicadas desde domingo pelo The Intercept Brasil, a partir da extração de mensagens de um aplicativo de forma ilegal.

Antes bastante na defensiva, sem negar o conteúdo das conversas – que mostravam uma colaboração entre ele e a acusação na forma da troca de ideias, de dicas e de combinação de táticas –, Moro passou a colocá-las em dúvida, a condenar de forma mais veemente sua obtenção, que atribuiu a um crime ainda em andamento, praticado ao que tudo indica por uma organização, e a se amparar em três lastros para se contrapor à tentativa de desestabilizá-lo e de anular decisões da Lava Jato.

O primeiro deles foi dizer que os ataques não atingem a ele ou à operação, mas as instituições do País de maneira geral. Incluiu Legislativo, o STF, jornalistas e empresas de mídia entre alvos potenciais, na clara disposição de obter solidariedade.

A segunda linha da nova estratégia de Moro foi buscar amparo na opinião pública, por meio do apoio da “rua”. Sentiu-se seguro para fazê-lo depois de passar pelo “teste da arquibancada” ao lado de Bolsonaro no jogo do Flamengo. Lançou a cartada de que a Lava Jato é um patrimônio do qual a população não aceitará abrir mão caso tentem abatê-la.

Por fim, se valeu do apoio do presidente, começando por isentar o governo de qualquer ligação com os fatos em tela.

O dia terminou com a impressão de que ele poderia se fortalecer. Da minha parte, ressalvei que essa afirmação dependeria de múltiplos fatores, o principal sendo o que ainda estava por vir no conta-gotas bastante questionável estabelecido pelo site detentor das conversas.

Não demorou. Na própria noite de ontem, o site publicou mais uma leva de troca de mensagens entre Moro e procuradores, depois do primeiro depoimento de Lula perante o juiz, combinando uma reação à nota da defesa, a afirmações feitas por Lula e a reportagens que, no entender do ex-magistrado e dos acusadores, não refletiam o que acontecera. Moro sugere, inclusive, que a força-tarefa deveria soltar uma nota ou pautar a imprensa, algo depois descartado.

É grave e é a conversa que mostra, até aqui, a maior iniciativa de Moro concernente ao caso específico que levou à condenação de Lula pelo triplex e a sua prisão, após confirmação da condenação em segunda instância.

Moro abriu o flanco e tomou um novo golpe. Não poderá nem se dizer surpreso: foi ele quem instou o site a divulgar o que mais tivesse, em tom desafiador.

As várias possíveis consequências das revelações já estão em curso, com iniciativas parlamentares para mitigar eventuais abusos de autoridade. Antes não havia clima para tratar disso. Agora haverá?

Há, ainda, o julgamento, no dia 25, do pedido de suspeição de Moro pela Segunda Turma do STF no processo de Lula. O que Celso de Mello pensa disso tudo que já foi divulgado? É uma peça com a qual o enxadrista Moro deveria se preocupar.

Do Estadão.