Para juíza, “Dallagnol age como estagiário de Moro”
Reportagem da revista Veja, em parceria com o The Intercept Brasil, revela mais diálogos travados entre o então juiz Sergio Moro e o procurador Deltan Dallagnol, que oficialmente coordena a Operação Lava Jato.
Na prática, era Moro quem comandava o trabalho dos procuradores, sugerindo testemunhas, orientando a produção de provas e controlando o andamento de delações premiadas.
A magistrada Raquel Braga, integrante da Associação Juízes para a Democracia (AJD), destaca a relação de submissão entre o juiz e o procurador.
“É triste, para os procuradores, a conduta do Dallagnol, que age como se fosse o estagiário do Moro”, diz Raquel. E lembra que a Constituição garante a autonomia do Ministério Público Federal (MPF) frente ao Poder Judiciário, justamente para que os procuradores possam atuar com independência. “As garantias são dadas a esses ofícios para que atuem com independência, e exerçam seu ofício sem nenhum tipo de ingerência ou pressão”, disse ela, em entrevista aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria, para o Jornal Brasil Atual, nesta sexta-feira (5).
Raquel Braga também lamenta a postura de Moro como juiz. Sobre a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a magistrada diz que havia um pré-julgamento, com uma sentença já concebida, antes mesmo do início do processo. “Não é comum, por mais que se diga, um juiz orientar a acusação, indicar provas. São procedimentos absolutamente heterodoxos. Os juízes não se comportam assim. Todo o curso desse processo mostra que a sentença já estava pronta, e tinha um percurso a seguir para confirmar o que ele já entendia como sentença, com a condenação do réu. Mais grave ainda, esse réu era o Lula, e a sua prisão comprometeu o processo eleitoral.”
Delações
Para Raquel, a carta do ex-executivo da OAS Léo Pinheiro, por meio da qual nega ter sido coagido a incriminar Lula, é “absolutamente irrelevante”.
Além de ser réu, o ex-executivo preso tem interesse em manter de pé a sua versão, após duas alterações, para garantir a redução de pena.
Ela usa esse episódio para dizer que Moro e a Lava Jato colocaram em descrédito o estatuto da delação premiada. “Essa carta não é crível para o cidadão comum, dentro dessas circunstâncias, quanto mais para os operadores de direito, sobretudo para os ministros do STF.”
A juíza também alerta para os riscos de manipulação do devido processo legal.
O “voluntarismo” da parte de um juiz, que conduz a investigação para alcançar um juízo pré-estabelecido, viola todas as garantias do cidadão, que passa a ficar à mercê da autoridade de plantão.
“Se foram capazes de fazer isso com um ex-presidente, são capazes de fazer com qualquer um de nós, e todos estaremos vulneráveis.”