Ainda choram Marias e Clarices no solo do Brasil
Com um abano para o filósofo alemão Immanuel Kant, esta crônica poderia ter o mesmo título da sua obra mais importante, “Crítica da razão pura”, com uma única mudança: em vez de “razão pura”, “puro cinismo”.
Immanuel Kant escreveu sobre os limites do conhecimento humano, sobre física versus metafísica, sobre o saber intuitivo e o saber empírico. Se eu quisesse aproveitar seu título, não precisaria ir a esferas tão altas para minha crítica nada filosófica, bastaria ler os jornais do dia.
Quando o presidente Bolsonaro substitui quatro membros da Comissão da Verdade por quatro membros escolhidos por, notoriamente, não terem o menor interesse em esclarecer os crimes da ditadura, e justifica a mudança porque o governo agora é de direita, e a direita, deduz-se, não quer saber de verdade, chegamos a um grau de cinismo destilado, puro cinismo, que deixa para trás todas as suas manifestações anteriores.
A direita tem todo o direito, conquistado nas urnas, de querer mudar a História, esquecer as vítimas da ditadura e os desaparecidos e não falar mais nisto. Só o que se pede ao presidente e aos generais que, cargo a cargo, vão ocupando o poder é que na sua tentativa de apagar o passado de uma vez por todas tenham um pouco de pudor, gente.
Ainda tem mães procurando filhos que desapareceram.
De OGLOBO