Ibama denuncia: Exército não age contra garimpos ilegais
Um documento do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) obtido pelo GLOBO afirma que os comandos militares envolvidos na missão de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) ambiental decretada pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) se recusaram, por três vezes, a dar suporte a operações de combate a garimpeiros ilegais. A alegação dada foi que as ações poderiam resultar na destruição de equipamentos dos infratores.
O documento é um ofício encaminhado no dia 23 de setembro pela coordenação de operações de fiscalização à coordenação-geral de fiscalização do Ibama, diretamente ligada ao presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim. No documento, o órgão relata que, por três vezes, os comandos militares que atuam na GLO na Amazônia negaram apoio às ações de combate a garimpos ilegais na região.
“Foi reportado pelos coordenadores de campo três situações em que embora as bases do GLO e as bases do GCDA estivessem articuladas no mesmo município e no mesmo período os Comandos Militares recusaram-se a prestar apoio devido ao fato de que a ação do IBAMA pudesse acarretar destruição de bens”, diz um trecho do documento. CGDA é a sigla para Coordenação Geral de Defesa e Área.
Procurado pelo GLOBO sobre a recusa de ajuda ao Ibama nos casos tratados pelo documento obtido pela reportagem, o Ministério da Defesa enviou nota em que não trata diretamente do tema. A pasta afirma que “a Operação Verde Brasil, por ser uma operação conjunta, demanda a execução de ações coordenadas entre as Forças (Armadas) e agências envolvidas” e que “as tomadas de decisões são sempre em conjunto e os resultados são consolidados à medida em que são informados para o comando da missão”.
A nota segue informando que “dessa forma, para execução de ações necessárias à solução das ocorrências, há a necessidade de adoção para a melhor estratégia para cada situação”. E termina com um balanço dos resultados da GLO até agora: 22.661,98m³ de madeira apreendida, interdição de 4 madeireiras ilegais, destruição de 18 acampamentos clandestinos, 204 termos de infração lavrados, R$ 56 milhões em multas, oito pontes destruídas, 77 pessoas detidas, 17 caminhões, oito tratores e uma escavadeira apreendidos. Também procurados, o Ibama e o Ministério do Meio Ambiente não responderam até o fechamento da edição.
Tema sensível no governo
A destruição de equipamentos em operações de fiscalização ambiental é um tema sensível na gestão da política do governo Bolsonaro para o setor. Em abril, o presidente gravou um vídeo no qual desautorizou uma ação do Ibama que resultou na destruição de equipamentos de madeireiros ilegais em Rondônia. À época, o governo chegou a anunciar que iria editar uma norma para mudar os critérios de destruição desses equipamentos.
A ação, no entanto, é autorizada por um decreto de 2008 que tinha como objetivo a inutilização de maquinário apreendido em situações de crimes ambientais quando o transporte ou a guarda desses equipamentos for inviável ou representar riscos aos fiscais.
Em duas das três ocasiões relatadas, os fiscais do Ibama tiveram que abortar as missões por conta da falta de suporte dos militares. Em outra ocasião, a missão foi realizada com o apoio da Polícia Federal.
A primeira situação documentada ocorreu em 11 de setembro. Segundo o Ibama, a GLO negou apoio para o combate a um garimpo ilegal na terra indígena Trincheira Bacajá, no Pará. A justificativa ao Ibama foi a de que a ação poderia resultar na apreensão e destruição dos equipamentos dos garimpeiros.
A segunda situação aconteceu em 15 de setembro, quando uma equipe do Ibama na região do Alto Rio Guamá, entre o Pará e o Maranhão, também não obteve o apoio do Comando Militar do Norte — a ação foi executada com apoio da Polícia Federal. O ofício destaca que, apesar de não terem atuado na operação, os militares teriam computado os resultados como se obtidos a partir da sua ação.
A terceira situação teria ocorrido em 23 de setembro. Os fiscais preparavam uma operação de combate a garimpos ao longo da BR-163, mas ela teve que ser abortada porque o Comando Militar do Norte se recusou a dar suporte logístico. A alegação foi, segundo o documento, que “a operação poderia causar problemas” devido às negociações em curso com os garimpeiros e o recente bloqueio da BR-163.
Tropa de 8,1 mil militares em ação
A GLO foi decretada pelo presidente Bolsonaro em agosto, em meio à pressão causada pelo aumento de queimadas na Amazônia. Aproximadamente 8,1 mil militares foram acionados para combater incêndios florestais e desmatamento na região. A operação duraria um mês, mas foi prorrogada por mais um. Segundo o Ministério da Defesa, o governo liberou R$ 86 milhões para custear as ações.
Desde então, o número de incêndios caiu. Em agosto, foram registrados 30,9 mil incêndios no bioma Amazônia. Em setembro, quando normalmente há mais incêndios que em agosto, o número caiu para 19,1 mil até o dia 28 — dados mais recentes do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Na semana passada, o ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, defendeu a efetividade da GLO.
A destruição de equipamentos é criticada por garimpeiros e madeireiros ilegais. Com a chegada da GLO à região, garimpeiros do Pará bloquearam um trecho da BR-163. Em 15 de agosto, tiveram uma reunião com os ministros do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, para pressionar por punições aos fiscais que destroem equipamentos nas fiscalizações.
De O Globo