Para senadora, ‘Bolsonarismo é uma seita’
Selma Arruda quer um pedido de desculpas de Flávio Bolsonaro. A senadora , eleita sob o apelido de “Moro de saias”, deixou esta semana o PSL de Jair Bolsonaro, após dizer-se ofendida pelo filho mais velho do presidente, que teria gritado com ela ordenando que Selma tirasse sua assinatura do requerimento de instalação da CPI da Lava Toga.
Em entrevista à coluna, Selma afirmou que foi alvo da “seita” do bolsonarismo, que “engole sem mastigar”. “Quero ver o que vão dizer quando Bolsonaro também mudar de partido”.
Leia a entrevista.
Por que a senhora saiu do PSL?
Meu desentendimento com o Flávio. Me senti desconfortável de continuar no partido. Eu não sou menos senadora do que nenhum daqueles senadores. Não importa de quem eles sejam filhos, o poder extra-Senado que possam ter. Não tinha como eu permanecer ali depois daquilo, né? Tive de me impor e me dar ao respeito, como política, senadora e mulher. Outra razão é a estrutura do Podemos, bem mais organizada do que o PSL.
Como é estar em posição oposta ao filho do presidente?
Não tenho nenhum temor sobre isso. Não me vejo menos senadora.
Flávio voltou a falar com a senhora?
Não.
Ele pediu desculpas por ter gritado com a senhora?
Não pediu. Ele se desculpou com a Soraya Thronicke. Comigo e com o Major Olimpio, não.
Flávio te deve desculpas?
Com certeza, né? Flávio me deve desculpas. É o mínimo.
Jair Bolsonaro falou com a senhora?
Não. Nem o presidente do partido (Luciano Bivar).
A senhora imaginava sair do PSL com nove meses de mandato?
Não. Um mês atrás eu estava fazendo filiações para o PSL. Muita gente entrou no PSL por causa do Jair Bolsonaro. O PSL é uma coisa, Bolsonaro é outra. Sair do PSL não quer dizer que você deixou de defender as bandeiras do Bolsonaro. Infelizmente, não temos candidatura avulsa. Assim que eu entrei no Senado, senti uma simpatia muito grande pelos senadores do Podemos. O Alvaro Dias é uma grande liderança e tem uma postura maravilhosa. É um cavalheiro, extremamente inteligente.
O governo Bolsonaro já brigou com a PF, assistiu em silêncio à desidratação do Coaf e não quer a CPI da Lava Toga. Na campanha, era tudo ao contrário. Os lavajatistas estão decepcionados?
Sim. Isso também vai precisar de um ajuste. Não é difícil as coisas se resolverem. Precisa de mais diálogo e menos truculência.
Moro, que lhe deu o apelido, também deveria sair do governo?
Não. O Moro tem outra meta. Ele quer ir para o STF, e acabar de cumprir sua missão lá como julgador. É muito precoce a gente dizer que esse rompimento pode acontecer.
Em quem a senhora votará em 2022?
Sou leal. Se o Podemos tiver um candidato, é claro que vou trabalhar para ele.
Como foi virar alvo de ataques de bolsonaristas nas redes?
Recebi ataques dos radicais. Tem uma ala do bolsonarismo que, se você não for um robô que concorde com tudo… É como se fosse um time de futebol… Impressionante. Como se fosse uma seita. Agora, quero ver o que vão dizer do presidente quando o presidente também mudar de partido.
O presidente vai mudar de partido?
O que eu sei é pela mídia.
A senhora se arrepende de ter se filiado ao PSL?
Toda experiência é válida, né?
Por que a CPI da Lava Toga é importante?
Antes, as pessoas iam às ruas protestar pela CPI da Lava Toga, pelo Sergio Moro, pelo fim da corrupção, pelo fim do foro privilegiado. Não sei o que aconteceu que, de pouco tempo para cá, espalharam uma fake news, por robô ou sei lá o quê, de que a CPI da Lava Toga teria sido bolada por uma esquerda golpista que queria desestabilizar o Brasil. Uma coisa absurda. Esses radicais engolem isso sem mastigar, saem repetindo isso, e agora há um mantra de que a CPI não tem utilidade. A CPI é o melhor caminho porque somos um grupo minoritário no Senado. Para instalar uma CPI, bastam 27 assinaturas. Se a gente pensar em uma proposta de emenda à Constituição, esse grupo que quer derrubar a hegemonia do STF precisaria de 49 votos no plenário. Poxa, se a gente mal consegue 27 assinaturas, quando você acha que vamos ter 49 votos? Nunca. O impeachment de um ministro do STF, por exemplo, precisa de uma maioria enorme. A ideia, talvez, seja começar com uma CPI e obter elementos suficientes para o impeachment. O resultado dessa CPI pode, sim, mobilizar a sociedade, e a sociedade cobrar dos senadores que votem pelo impeachment de um ministro.
Davi Alcolumbre criticou a CPI, dizendo que ela traria instabilidade. Concorda?
É um absurdo. Não me representa. Não vejo nenhuma relação de uma coisa com a outra. Não adianta querer limpar sua casa e deixar um quartinho sujo. Se queremos passar o país a limpo, precisamos também limpar o Judiciário. Todos os dias há notícias de decisões estapafúrdias tomadas por alguns membros do Judiciário. A CPI não é em relação a todo o STF, não desestabiliza a instituição. Quem está tomando decisões contrárias à lei, fazendo mais do que deveria, querendo comandar o país com atitudes não republicanas? A gente precisa descobrir isso. Gilmar Mendes disse que, se houver CPI, o STF a engavetará. Isso é o que nós vamos ver!
O STF acertou em ordenar a busca e apreensão no gabinete do líder do governo no Senado?
Ora, se eu posso ser processada e isso não afronta a instituição, é óbvio que um ministro pode ser investigado sem afrontar o Judiciário. Pelo amor de Deus. Então, tudo bem, vamos ficar todo mundo impune aí e deixa o pau comer.
Quando era juíza, soube de algum caso corrupção na Justiça?
Prefiro não me manifestar.
A senhora tem medo de ser cassada pelo TSE?
Não tenho medo. Espero que o TSE faça um julgamento técnico, confio no TSE. Agora, se isso acontecer, se considerarem caixa dois, volto tranquila para casa. Já concluí minha carreira, sou absolutamente satisfeita profissionalmente.
De ÉPOCA