Ruralistas atacam organizações contra o desmatamento

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Foto: Reprodução/YouTube

No auge da troca de farpas entre o presidente Jair Bolsonaro e o francês Emmanuel Macron por causa das queimadas na Amazônia, o general Eduardo Villas Boas usou o Twitter para pedir que os brasileiros se unissem “em torno daqueles que têm procurado trazer à luz a verdade sobre essas questões ambientais e indigenistas”.

Entre os nomes citados no dia 22 de agosto por Villas Boas, assessor do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, estava o mexicano Lorenzo Carrasco, autor do livro “Máfia Verde: O Ambientalismo a Serviço do Governo Mundial”.

Guia de muitos sindicatos de produtores rurais no país, o livro Máfia Verde chegou a ocupar o primeiro lugar na lista dos mais vendidos no tema ambiente na livraria virtual Amazon nas últimas semanas. E exerce grande influência sobre o entorno do presidente Jair Bolsonaro, que cita muitas das expressões popularizadas pelo livro, como dizer que as reservas indígenas são “zoológicos humanos”.

A primeira edição da obra é de 2001, mas ela foi atualizada e continua a centrar fogo sobre o mesmo inimigo: a rede internacional de ONGs ambientalistas e indigenistas, “financiadas por países estrangeiros, que querem emperrar o desenvolvimento da Amazônia e interferir na soberania brasileira”.

Para Carrasco, a “agenda ambientalista-indigenista” se insere no globalismo, “um regime global de limitações de soberanias”, forçando os Estados a se enquadrarem “em uma estrutura de governo mundial”.

Palavras que remetem a muitos dos discursos e tuítes do chanceler Ernesto Araújo e do assessor internacional da Presidência, Filipe Martins.

Carrasco é autor de outros livros que vão na mesma linha, como “Máfia Verde 2” e “Quem Manipula os Povos Indígenas Contra o Desenvolvimento do Brasil: um olhar nos porões do Conselho Mundial de Igrejas”. Também editou “A Fraude do Aquecimento Global: como um fenômeno natural foi convertido numa falsa emergência mundial”, de Geraldo Luís Lino.

Mas seu maior sucesso é mesmo o primeiro Máfia Verde, e ele roda o país dando palestras em sindicatos de produtores rurais, universidades, e auditórios cheios de empresários e políticos.
Vez ou outra, conversa com parlamentares, como o senador Marcio Bittar (MDB-AC), membro da Frente Parlamentar Agropecuária, que o recebeu em Brasília em setembro.

Na ocasião, Bittar divulgou release dizendo que ambos se preocupam com a “a perda de soberania nacional sobre a Amazônia”, causada pela “atuação de ONGs internacionais que, há décadas, influenciam governos e populações locais a mando de interesses internacionais escusos”.

“A Amazônia está sendo invadida de uma maneira diferente; os países com experiência colonial não intervêm militarmente, eles usam um novo colonialismo, ambiental, e os agentes são as ONGs”, disse Carrasco à Folha. Ele, que mora no Brasil com a mulher há mais de 30 anos, define seu livro como “um clássico sobre a luta de defesa da soberania do Brasil”.

Para ele, a reação internacional às queimadas faz parte da guerra travada por potências mundiais por meio de ONGs. “A Amazônia estava já controlada pelas ONGs, e Bolsonaro entrou com uma agenda diferente, de soberania. É claro que elas iam reagir por meio dessa repercussão internacional das queimadas.”

Assim como a família Bolsonaro, ele não poupa críticas ao cacique Raoni e à ambientalista sueca Greta Thunberg.

“Levar o cacique Raoni a uma reunião com Macron é brincadeira, ele não é líder nem da própria maloca, não tem o respeito dos caciques caiapós”, diz. “É preciso permitir que cientistas que discordam da teoria do aquecimento global participem da discussão, é um assunto sério demais para deixar uma garota [Greta Thunberg] discutir, isso é sentimentalismo.”

Carrasco veio para o Brasil como correspondente estrangeiro, com a mulher, Silvia, nos anos 1980, e começou a pesquisar a atuação de ambientalistas após o assassinato de Chico Mendes, em 1988.

“Na África, essas ONGs criaram reservas para gorilas, rinocerontes. Já as reservas humanas são uma coisa muito específica criada no Brasil. Eles fazem zoológicos humanos, onde aprisionam os índios sem nenhuma dignidade”, diz. “No México, de onde venho, cerca de 10% da população é indígena, mas não há nenhuma reserva indígena.”

Carrasco já participou de várias CPIs que discutiram a internacionalização da Amazônia, as ONGs e a Funai.

“Mas o que mais ajudou a promover as minhas obras foi a tentativa de censura por parte da WWF Brasil”, disse.

A entidade de defesa do meio ambiente processou Carrasco em 2000 por calúnia e difamação. Procurada, a WWF afirmou que “respeita a liberdade de expressão, mas não concorda com a disseminação de inverdades”.

“Em 2000, recorremos à Justiça para nos defender de uma campanha difamatória do Movimento de Solidariedade Ibero-Americana (MSIA) que se utilizava de inverdades contidas no livro Máfia Verde e em outros materiais de comunicação”, disse a entidade.

Carrasco foi também um dos primeiros a soar o alarme sobre o chamado corredor Triplo A. Em 2015, um artigo seu sobre o tema viralizou e quase levou Bolsonaro a tirar o país do acordo do Clima de Paris.

Ao decidir que o Brasil não mais sediaria a conferência do Clima da ONU em 2019, Bolsonaro declarou que o Triplo A seria parte do Acordo de Paris. “O que é o Triplo A? É uma grande faixa que pega do Andes, a Amazônia e Atlântico, de 136 milhões de hectares, que poderá fazer com que percamos a nossa soberania nessa área”, disse em novembro.

Na realidade, o corredor foi uma proposta do ambientalista Martin von Hildebrand de criar um corredor ecológico-cultural que protegeria até 230 milhões de hectares da Amazônia dos Andes até a costa do Atlântico.” A proposta não avançou e não há no acordo do Clima nenhuma referência a isso.

Folha