Senadores dão vexame ao apoiar ministro indiciado

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Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Convocado a prestar esclarecimentos no Senado oito meses depois da revelação do caso das candidaturas de laranjas no PSL de Minas Gerais, o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, encontrou na manhã desta terça-feira (22) um clima de solidariedade na maior parte das 2 horas e 35 minutos em que permaneceu na Comissão de Fiscalização e Controle da Casa.

Dos 13 senadores que fizeram uso da palavra, 7 manifestaram apoio aberto ao ministro, que foi denunciado pelo Ministério Público sob acusação de patrocinar com dinheiro público esquema de candidaturas femininas de fachada nas eleições de 2018.

De quebra, defenderam a revogação, com apoio de Álvaro Antônio, da exigência de cota mínima para candidaturas femininas.

Apenas 4 dos 81 senadores da Casa fizeram perguntas sobre o esquema das laranjas —caso revelado pela Folha por meio de diversas reportagens publicadas neste ano— , sendo que Álvaro Antônio respondeu a apenas três.

Em suma, o ministro de Jair Bolsonaro afirmou não ter existido candidaturas de laranjas em Minas Gerais nem caixa dois em sua campanha ou na do presidente da República.

Apesar disso, minimizou a gravidade do caixa dois eleitoral —que é a movimentação de recursos de campanha sem conhecimento da Justiça— e se negou a abonar a conduta de assessores e candidatas (outras dez pessoas foram denunciadas) que estavam sob sua coordenação durante as eleições.

O ministro do Turismo chegou à comissão pouco depois das 9h e fez uma exposição inicial.

“O PSL de Minas, no ano de 2018, não teve candidaturas laranjas. Todos os candidatos e candidatas, isso eu posso afirmar categoricamente, fizeram campanha política, inclusive as quatro candidatas denunciadas”, afirmou, em referência às postulantes que, apesar de receber uma das mais expressivas fatias nacionais de dinheiro público do partido, tiveram apenas cerca de 2.000 votos.

Em 2018, Marcelo Álvaro Antônio concorreu à reeleição como deputado federal e presidia o PSL em Minas, sendo também o responsável pela coordenação de campanha de Bolsonaro no estado.

O ministro voltou a afirmar ainda que foi investigado por nove meses por Polícia Federal, Ministério Público e imprensa —ele citou por diversas vezes a Folha— , sem que “uma pessoa sequer” das cerca de 80 ouvidas tivesse citado o seu nome em algum procedimento inadequado.

Na verdade, vários depoentes fizeram acusações contra o ministro, incluindo candidatas do PSL, uma deputada federal eleita pelo partido (Alê Silva) e o então coordenador e assessor de sua campanha no Vale do Rio Doce, Haissander Souza de Paula.

Em um primeiro depoimento à PF, Haissander disse que com certeza o dinheiro de uma candidata laranja não foi usado por ela e que achava que esses valores foram desviados para campanha de Álvaro Antônio e de Bolsonaro, por meio de caixa dois.

Apesar de vários outros elementos colhidos pelos investigadores, o ministro diz ter sido denunciado apenas com base na teoria do domínio do fato —tese segundo a qual o ocupante de cargo mais alto de um esquema nem sempre atua diretamente nas fraudes, mas tem conhecimento sobre elas.

Após a fala inicial, teve início a fase de perguntas.

Entre os sete senadores que se manifestaram para apoiar o ministro estavam o novo líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO), e o presidente nacional do PP, Ciro Nogueira (PI).

Todos afirmaram que os problemas enfrentados por Álvaro Antônio ocorreram em todos os partidos, sendo causados, em grande parte, pela exigência legal de que pelo menos 30% das candidaturas têm que ser do sexo feminino.

“Tenho certeza de que tanto a PF quanto os órgãos de controle e o Tribunal Regional Eleitoral de Minas vão chegar à analise fria dos fatos e ver que, por sua carreira como deputado federal e o trabalho que vossa excelência faz no Ministério do Turismo, disso vossa excelência não se serviu”, afirmou Eduardo Gomes, para quem tudo não passa de “ressaca eleitoral”.

Ciro Nogueira chegou a dizer que acusações de caixa dois ocorrem no país inteiro e que o caso de Álvaro Antônio só ganhou repercussão porque ele teve “a sorte ou o azar” de, depois, de virar ministro de Estado.

“A sua presença aqui nessa comissão é mais fruto de o sr. ser ministro hoje, não para querer apurar essa questão de caixa dois. Porque essa questão do caixa dois teve no país inteiro, esse tipo de acusação”, disse Ciro, acrescentando ser favorável à destinação de ao menos 30% dos recursos eleitorais às mulheres, mas contra a cota de 30% para as candidaturas femininas.

“Ter esse número de candidatas é que causa esse tipo de situação. E depois se elas não tiverem voto? Acompanhei isso nos pequenos municípios, é uma dificuldade muito grande. Às vezes temos que tentar esconder isso da sociedade, é uma dificuldade que os partidos têm de cumprir essa cota.”

Angelo Coronel (PSD-BA) seguiu na mesma linha de argumentação e citou a “figura franzina” do ministro para dizer que ele está sendo “pego para cristo”.

Os outros que prestaram solidariedade a Álvaro Antônio foram Weverton (PDT-MA), Izalci Lucas (PSDB-DF), Telmário Mota (PROS-RR) e Luis Carlos Heinze (PP-RS).

Apenas Randolfe Rodrigues (Rede-AP), autor do requerimento de convocação, Reguffe (Podemos-DF), Fabiano Contarato (Rede-ES) e Paulo Rocha (PT-PA) fizeram perguntas —a desse último, sobre se Álvaro Antônio havia conversado com o ministro Sergio Moro (Justiça), chefe da PF, acerca das investigações, ficou sem resposta.

Um dos poucos momentos em que o ministro foi questionado de forma mais incisiva ocorreu quando Contarato insistiu na pergunta sobre se ele considera caixa dois corrupção.

“O caixa dois é um gasto de campanha não contabilizado, mas a origem de dinheiro não necessariamente foi de desvio de verba pública, às vezes a origem é lícita. Essa discussão tem uma linha tênue. É tão grave como a corrupção? (…) É uma discussão que precisa debater bem”, disse Álvaro Antônio, acrescentando em outro momento: “Caixa dois é crime, e não houve essa prática no PSL de Minas, pelo menos respondo pela minha campanha”.

A questão foi suscitada em comparação ao recuo de Moro sobre o tema. Quando era juiz responsável pela Lava Jato, chegou a dizer que o caixa dois era pior do que desvio de dinheiro público para contas no exterior. Depois, já no governo Bolsonaro, afirmou que é um crime menor gravidade em relação à corrupção.

Conforme a Folha mostrou, o depoimento de Haissander de Paula e uma planilha apreendida na empresa Viu Midia sugerem que dinheiro do esquema de laranjas pode ter sido desviado, por meio de caixa dois, para a campanha do ministro e de Bolsonaro.

Sobre esse ponto, Álvaro Antônio voltou a criticar a Folha e afirmou que a ombudsman do jornal, Flavia Lima, apontou erro nesta reportagem.

Na verdade, ela apontou ponderações de leitores de que a edição da reportagem “valorizou algo de pouco peso”, o depoimento em que Haissander diz achar que os valores foram desviados, em detrimento de uma planilha encontrada numa gráfica que prestou serviços ao PSL, também sugerindo caixa dois.

Sobre essa planilha, Álvaro Antônio disse aos senadores que a empresa deu uma explicação plausível aos investigadores, mas que não poderia citar devido ao segredo de Justiça.

Em outro ponto em que o ministro foi questionado com mais insistência, Reguffe perguntou se ele reconhecia ter havido erro na campanha do PSL em Minas.

“Quem vai dizer isso é a Justiça. O que posso afirmar é que não houve candidaturas laranjas. Existe uma investigação da Justiça. Se houve irregularidades ou não, não tenho como falar antes da posição da Justiça”, afirmou, repetindo ter tido a vida escaneada de cima a baixo.

Ao fim, o ministro concordou com as críticas à cota de candidatas, afirmando serem raras as oportunidades em que os partidos conseguem cumpri-la com folga. Minas foi uma exceção em 2018, afirma.

Autor do requerimento, Randolfe Rodrigues afirmou que, em sua avaliação, o ministro não esclareceu as acusações que pesam contra ele, em especial a planilha que cita o nome de Bolsonaro. O senador também criticou os ataques à cota feminina, afirmando que esse tipo de argumento é coisa de séculos passados.

Folha