Sobrinho de Alckmin terá que pagar indenização ao MP-SP
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O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) apresentou ação civil pública para cobrar do sobrinho do ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin, Othon César Ribeiro, uma indenização por danos coletivos equivalente a até 20% do faturamento de suas empresas. Apresentado à 12ª Vara da Fazenda Pública na última sexta-feira, o pedido considera que ele obteve condições ilegais para exploração de duas áreas de hangar do aeroporto de Jundiaí, no interior de São Paulo, em 2010, durante gestão tucana no estado.
Na ocasião, Othon obteve prazos de 65 e 58 anos para descontar do aluguel pago ao governo os valores de investimentos realizados por ele nos terrenos. O caso foi revelado em outubro do ano passado pela revista Época. Tomando como base a Lei Anticorrupção, o pedido estima a indenização em valores que devem variar entre R$ 6 mil e R$ 60 milhões.
Na ação, o MP pede que o então diretor do Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo (Daesp), Sérgio Augusto de Arruda Camargo, também seja condenado a pagar parte da indenização, por ter sido o agente público responsável por assinar o termo aditivo contratual que garantiu a Othon o prazo prolongado recorde. O Ministério Público solicitou, ainda, que as cláusulas contratuais que beneficiaram o sobrinho do ex-governador sejam anuladas.
Othon é filho de Adhemar César Ribeiro, cunhado do ex-candidato à Presidência e citado na delação da Odebrecht como arrecadador de R$ 2 milhões irregulares para a campanha do tucano, em 2010. Ex-diretor do Daesp, Sérgio Camargo atualmente é presidente da Fundação Energia e Saneamento, vinculada ao governo Doria. Nesta segunda-feira, a juíza Paula Micheletto Cometti notificou os dois para que apresentem defesa prévia em 15 dias.
Pelo acordo entre concessionários de áreas de aeroportos estaduais e o Estado, investimentos próprios realizados na área cedida poderiam ser descontados em parcelas que representavam entre 60% e 90% do valor de aluguel, mas sempre dentro do prazo dos contratos, definidos entre 15 e 25 anos, em média. Com isso, em vários contratos, parte do custo de melhorias realizadas nas áreas acabou absorvida pelos concessionários, o que não foi o caso do sobrinho do ex-governador.
O primeiro contrato de concessão a Othon foi assinado em 2001, durante o governo Alckmin (2001-2006), e resultou na destinação de uma área de 2.100 metros quadrados do aeroporto de Jundiaí para instalação de um hangar. Em 2007, já na gestão do aliado tucano José Serra (2007-2010), Othon informou ao governo ter realizado um investimento de R$ 1,2 milhão no terreno. Com isso, em 2010 o prazo para amortecimento foi estendido até 2062.
O mesmo ocorreu em relação a um segundo contrato de concessão, assinado em 2008 para uso de mais uma área de 3.000 metros quadrados. Para justificar investimentos de R$ 2,6 milhões, em 2010 o prazo de contrato foi ampliado para 65 anos, o mais extenso já oferecido pelo Daesp. Se estiver vivo até o final do contrato, Othon terá 108 anos de idade.
“Restou demonstrado que as empresas foram extremamente beneficiadas por termos de alteração e prorrogação, por motivos que não foram apurados, em que pese ter sido mencionado em diversas oportunidades nos autos o parentesco do primeiro com importante liderança do PSDB”, escreveu o promotor Christiano Jorge Santos na ação apresentada à Justiça. Ele classificou o prazo diferenciado para empresas de Othon como “prática discriminatória” e exemplo de “flagrante afronta aos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da impessoalidade”.
Por meio de nota, a assessoria do Daesp destacou nesta segunda-feira que a concessão ocorreu em gestões anteriores. “A atual gestão do Departamento apoia toda e qualquer investigação do Ministério Público e está à disposição para quaisquer esclarecimentos”.
A concessão a Othon e a avaliação de investimentos foram realizados sob a gestão de Flávio Sganzela como superintendente do Daesp, no biênio 2007/2008. Em depoimento à Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social do Ministério Público paulista, ele disse ter conhecido na época Othon Ribeiro, “um rapaz novo, de aproximadamente 30 anos”, apresentado a ele “como o sobrinho de Geraldo Alckmin”.
Ele disse “não se recordar” de ter havido alguma “irregularidade para favorecê-lo”. Perguntado se era comum a extensão de prazos de concessão por até 65 anos, Sganzela disse que “nunca soube de prática semelhante” e que “trata-se de situação excepcional, desconhecendo o motivos para que assim se tenha dado”.
Responsável pela concessão dos prazos recordes, em 2010, seu sucessor no Daesp, o engenheiro Sérgio Camargo negou em depoimento ter conhecido Othon. Disse também não se lembrar da autorização de “prazo para amortização tão longo” como o dele, “pois eram muitos contratos”.
Em seu depoimento, Camargo citou artigo do Código Brasileiro de Aeronáutica, que prevê que “o termo de utilização para a construção de benfeitorias permanentes deverá ter prazo que permita a amortização do capital empregado”. Mas não mencionou a resolução 113/2009 da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que limitou o direito do governo estadual de negociar “o prazo de outorga para explorar a infraestrutura aeroportuária” a um “máximo de 25 anos”.
No entendimento do Ministério Público, o Código Brasileiro de Aeronáutica caracteriza-se como “norma geral”, enquanto resoluções da Anac “devem ser aplicadas prioritariamente aos casos concretos em atenção ao princípio da especialidade”. Procurados nesta segunda e na terça, Othon e Sérgio não retornaram os contatos da reportagem.
Ao ser perguntado no ano passado sobre o assunto, Alckmin não quis responder a pergunta se o fato de Othon ser seu sobrinho foi determinante para que ele obtivesse o maior prazo entre os concessionários. Por meio da sua assessoria, informou que “em fevereiro de 2010 ele não era governador e não teve qualquer relação com o processo mencionado”. Alckmin ocupou o Palácio dos Bandeirantes entre 2001 e 2006 e, depois, entre 2011 e 2018.