T.PROTTI (CARMIGNAC FOUNDATION)

Líder indígena morto negociava proteção do Estado

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T.PROTTI (CARMIGNAC FOUNDATION)
T.PROTTI (CARMIGNAC FOUNDATION)

Paulo Paulino Guajajara, conhecido como Lobo Mau, foi assassinado a tiros na tarde desta sexta-feira na Terra Indígena Arariboia, no Estado do Maranhão. Paulino era um guardião da floresta, responsável por fiscalizar e denunciar invasões na mata, hoje uma das atividades mais perigosas no Brasil. Estava acompanhado de Laércio Guajajara, liderança da região, que conseguiu fugir do ataque, embora tenha sido alvejado. Laercio tomou tiros no braço e nas costas, e outros de raspão.

“Ambos voltavam de um dia de caça, quando se depararam com uma emboscada, homens armados que podem ser caçadores ou madeireiros”, conta Carlos Travassos, indigenista que trabalha para os Guajajara, e que era o melhor amigo de Paulo Paulino. O indigenista conversou neste sábado com Laércio que foi hospitalizado, mas está fora de perigo. A liderança Guajajara contou os detalhes do ataque, que estão sendo repassados às autoridades locais. “Eles ficaram um dia e pouco caçando para alimentar suas famílias. Voltaram por uma lagoa para pegar água e quando enchiam a garrafa, ouviram um barulho e foram surpreendidos por homens armados`“, relata Travassos.

A morte de Paulo Paulino despertou comoção imediata entre as entidades de apoio ao meio ambiente. Jovem, com espírito de preservação da mata e de seu povo, era casado e pai de um menino. “O pai de Paulino é o maior cantor tradicional dos Guajajara, um líder espiritual”, conta Travassos. O guardião já estava sob ameaças de morte há algum tempo, tanto que começava a negociar o ingresso num programa estadual de direitos humanos para reforçar sua segurança. “Infelizmente não deu tempo”, diz Sônia Guajajara, coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, e integrante do mesmo povo de Paulo Paulino.

Ironicamente, Sônia está na Europa em reunião com lideranças e parlamentares de países europeus para denunciar as mortes de indígenas no Brasil, sob a campanha “Sangue Indígena, nenhuma gota a mais”.“Há um genocídio institucionalizado. Há uma permissão para matar, para armar pessoas, ainda mais quando crimes ficam impunes e agora diante da autoridade máxima do país dizendo que não vai mais demarcar terras, que pretende explorá-las, um discurso que favorece a contrariedade aos povos indígenas”, diz Sônia. “Os invasores se sentem legitimados pelo presidente”, conclui.

O ministro da Justiça Sergio Moro, contudo, anunciou que o assassinato será investigado. “A Polícia federal irá apurar o assassinato do líder indígena Paulo Paulino Guajajara na terra indígena de Arariboia, no Maranhão. Não pouparemos esforços para levar os responsáveis por este crime grave à Justiça”, afirmou no twitter. Apesar do compromisso assumido, os grupos de apoio aos povos indígenas veem o anúncio do ministro com desconfiança. “O terror que cresce nessas comunidades é fruto das políticas do mesmo governo que agora diz que vai trazer justiça nesse caso. É uma contradição enorme”, diz Christian Poirier, da Amazonia Watch, que acompanha vários casos de vulnerabilidade em comunidades indígenas no Brasil.

Também o governador do Maranhão, Flavio Dino, garantiu apoio do Estado. “Os secretários de Segurança Pública e de Direitos Humanos do Governo do Maranhão estão em Imperatriz [cidade ao lado de Arariboia], em reuniões sobre terra indígena Arariboia. Estamos colaborando com os órgãos federais, que legalmente são os competentes para atuação neste caso criminal.

Arariboia tem somado dores nos últimos anos pelos ataques à região, que soma 413.000 hectares e abriga 14.000 indígenas guajajara, e é ainda o lar de 60 índios isolados da aldeia Awá Guajá. No ano passado foi morto o cacique Jorginho Guajajara, num crime que ficou sob uma zona cinzenta, como todos os que atingem lideranças ambientais no Brasil. Segundo a polícia, Jorginho teria se afogado sozinho, hipótese que os guajajara negam terminantemente. Em 2015, o povo também viu metade da sua floresta sob fogo, em incêndios considerados suspeitos. “Neste ano, também estamos enfrentando focos de incêndio”, conta Sônia Guajajara.

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