Chanceler radical isola Brasil no exterior
Foto: Carl de Souza/AFP
Na quinta-feira 5, aconteceu a 55ª cúpula dos líderes do Mercosul em Bento Gonçalves (RS). O bloco de livre comércio, formado em 1991 por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, se reuniu para passar a presidência rotativa ao presidente paraguaio, Mario Abdo Benítez. Estiveram presentes ao evento, além de Benítez, os presidentes do Brasil e da Argentina, Jair Bolsonaro e Mauricio Macri, além de representantes da Colômbia, Equador, Peru e Suriname.
A reunião teria tudo para ser tranquila, já que aparentemente reina a paz no bucólico Vale dos Vinhedos. O Brasil poderia exaltar as vantagens de que goza com os parceiros, sobretudo o mais importante, a Argentina. Bolsonaro poderia dizer que o Brasil é superavitário em relação ao bloco, embora perca para os argentinos. Segundo o governo, em 2018 o País exportou para o Mercosul US$ 20,83 milhões, enquanto importou US$ 7,48 milhões. Mas o clima resultou tenso, por causa do país mais poderoso.
Desde meados de novembro, membros do governo trataram de atacar o Mercosul. O mais eloquente e agressivo foi o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. “O Mercosul não é apenas um nome, uma bandeira hasteada. Se o projeto é desvirtuado, precisa ser repensado”, afirmou, respondendo a Paula Espanõl, conselheira econômica do presidente eleito da Argentina, Alberto Fernández, ao elogiar as medidas protecionistas realizadas no governo de Cristina Kirchner, vice-presidente eleita.
Araújo repetiu os ataques na abertura da 55ª Cúpula. “Acabou o Mercosul protecionista e ineficaz”, discursou. “Não voltaremos às cavernas. O Mercosul deixou de ser um freio e passou a ser um acelerador. Um Mercosul fechado, mal posicionado, que não produz resultados, como garantia de atraso e bandeira de isolamento, não é o que desejamos. O Brasil está pronto para continuar trabalhando com todos por um Mercosul à luz do Sol, e não na caverna. Construir pontes com espírito construtivo, pragmático. Não queremos construir pontes com um passado recente e desastroso.”
Nenhum dos participantes parece ter se espantado com a posição do Brasil. Afinal, ainda em novembro, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, já havia anunciado que o País deixaria de integrar as reuniões na área educacional do bloco. “A razão é que, após 28 anos, não há resultados concretos, objetivos para a gente mostrar, e a despesa e o custo foram elevadíssimos em diárias, passagens, hospedagem, tempo, esforço despendido”, afirmou.
Como se não bastasse, Bolsonaro dedica antipatia especial ao bloco, sobretudo ao peronista Fernández. Ele não cumprimentou o presidente eleito argentino e disse que não irá a sua posse, dia 10, em resposta ao apoio de Fernández ao ex-presidente Lula. Com a proximidade da cúpula, porém, os dois presidentes prometeram manter relações amistosas, ainda que distantes. Bolsonaro chegou sorridente a Bento Gonçalves e cumprimentou efusivamente o presidente paraguaio, de direita.
Os governantes e representantes de outros países se perguntam por que o Brasil está se isolando do restante do bloco. Não é interesse do governo, já que o Mercosul fechou este ano um histórico acordo de livre comércio com a União Europeia.
Segundo especialistas, como Maurício Santoro, professor de Relações Internacionais na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), trata-se de uma atitude pragmática. “Pode ser uma maneira de pressionar a Argentina a adotar uma posição mais liberal no comércio internacional”, disse.
Ainda assim, por mais que Ernesto Araújo e correligionários arreganhem os dentes contra os vizinhos, estes permanecerão ligados cultural e territorialmente ao Brasil por um tempo bem mais longo do que um ou dois mandatos.