Toffoli ficou isolado no caso do Coaf

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Foto: Fátima Meira/Futura Press/Estadão Conteúdo

 

O julgamento sobre o compartilhamento de dados sigilosos da Receita e do antigo Conselho de Controle de Atividade Financeira (Coaf) – que deve ser concluído nesta quarta-feira, 4 – marcou o momento de maior isolamento do ministro Dias Toffoli desde que assumiu a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF), em setembro do ano passado.

Na iminência de uma derrota, Toffoli mudou o próprio voto e se alinhou ao grupo que defende o amplo repasse de informações da Receita. Antes do recuo, o ministro recebeu (nos bastidores e publicamente) uma série de críticas dos próprios colegas.

A principal queixa dos integrantes da Corte foi a inclusão, por Toffoli, do Coaf na discussão. Originalmente, o caso tratava sobre sonegação fiscal por parte de donos de um posto de gasolina em Americana (SP). A matéria girava em torno da atuação da Receita, mas Toffoli ampliou o escopo, incluindo o órgão de inteligência financeira na análise, o que abriu margem para dar uma liminar que suspendeu 935 casos e beneficiou o senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ). A apuração de um esquema de “rachadinha” no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) se apoia em relatórios do Coaf.

A manobra foi duramente criticada nas sessões de julgamento transmitidas ao vivo pela TV Justiça. Conhecida pela postura discreta, a ministra Rosa Weber disse ter “perplexidade” em analisar a questão do Coaf em um caso que não dizia “uma linha a respeito” do órgão.

Cármen Lúcia, por sua vez, considerou a inclusão do Coaf uma “expansão inadequada juridicamente”. “O interessado (Flávio) não compõe este processo, não comparece em qualquer condição, não era parte”, reprovou Cármen. Ricardo Lewandowski endossou a ala contrária à ampliação do debate: “Eu tenho muita dificuldade em enfrentar esse tema (Coaf), que não foi suscitado em nenhum momento.”

Marco Aurélio Mello e Celso de Mello também se manifestaram pela exclusão do Coaf da decisão final, que vai ser proclamada nesta quarta. Toffoli entende que a questão já foi superada, mas é possível que a controvérsia volte a dominar o plenário na hora em que os ministros forem definir a tese do julgamento, que é uma espécie de resumo com o entendimento da Corte sobre o tema.

Após Toffoli ler o “primeiro” voto, que colocava limites à atuação da Receita e do Coaf, integrantes da Corte, do Ministério Público e da Receita enfrentaram dificuldade para compreender totalmente a posição do presidente do Supremo.

O ministro Luís Roberto Barroso chegou a dizer a colegas que seria preciso chamar um “professor de javanês” para compreender o voto do presidente, em um comentário flagrado pela imprensa, e pediu desculpas depois.

O entrave de compreensão reapareceria na última sessão, quando Toffoli retificou o voto, mas sem informar totalmente a extensão do ajuste. “O que se verificou, que durante os debates, e o ministro Alexandre (de Moraes) apontou isso, que seria possível avançar para já ao cassar o acórdão determinar o retorno da sentença condenatória de primeira instância. Nesse sentido eu retifico o meu voto, para também votar no sentido de cassar o acórdão proferido para restabelecer a primeira instância. Faço ressalvas, mantenho as minhas ressalvas, mas adiro à conclusão da douta maioria”, disse.

Coube à assessoria do presidente do Supremo prestar os esclarecimentos depois, explicando que o ministro também acompanharia o entendimento a favor do amplo compartilhamento de informações da Receita, como havia defendido Moraes.

O caso representou mais um recuo de Toffoli em julgamentos relevantes. Ele já havia alterado sua posição sobre a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância e mudou o próprio voto em julgamento sobre a blindagem de deputados estaduais. Em comum, todos os casos tinham como pano de fundo interesses da classe política.

Esta não é a primeira vez que a postura de Toffoli é alvo de insatisfação dentro da Corte. Ministros já haviam reprovado a decisão – tomada por Alexandre de Moraes, no inquérito instaurado por Toffoli – de censurar reportagem jornalística no site O Antagonista e na revista digital Crusoé, que mencionava Toffoli.

O controverso edital de R$ 481 mil para a compra de medalhões de lagosta e vinhos importados – com premiação internacional – para as refeições servidas aos integrantes do STF e convidados também provocou desconforto. Um ministro disse reservadamente à reportagem que a compra não foi previamente discutida pelos magistrados em sessão administrativa e, portanto, não foi chancelada pelo colegiado.

Estadão