Checagem mostra Bolsonaro como fonte soberana de mentiras
O presidente Jair Bolsonaro foi o mais citado nas 348 checagens de desinformação publicadas em 2019 por Aos Fatos dentro da parceria firmada com o Facebook. O capitão reformado do Exército recebeu menções em 55 conteúdos desmentidos no ano passado; na metade deles (27), as informações falsas favoreciam sua imagem ou a de seu governo. A publicação mais compartilhada (81 mil vezes), por exemplo, afirmava que o presidente havia cortado verbas destinadas ao Carnaval e a paradas LGBTI.
Como reflexo da polarização política, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi o segundo mais citado nas peças de desinformação checadas: 26 delas o envolviam. Diferentemente do atual mandatário, a maior parte dos conteúdos sobre o petista (21) tiveram o intuito de atacar a sua imagem.
Ainda que tenha sido assunto de quase o dobro de peças de desinformação veiculadas, o conteúdo sobre Bolsonaro engajou menos o público do que as postagens enganosas a respeito de Lula. Enquanto as 55 notícias falsas que envolviam o presidente acumularam ao menos 582 mil compartilhamentos, as 26 que traziam o nome do petista somaram 639 mil.
É possível perceber outra diferença ao analisar o posicionamento das postagens com Lula ou Bolsonaro. No caso do atual presidente, as três peças de desinformação mais compartilhadas apelavam para o gosto do seu eleitorado: a primeira anunciava que o presidente teria cortado verbas do Carnaval via decreto (80 mil compartilhamentos); a segunda trazia fotos descontextualizadas para inflar manifestações pró-governo (41 mil compartilhamentos); e a terceira propagava que o orçamento do governo para a Educação seria o maior da história (40 mil compartilhamentos).
No caso de Lula, ocorreu o contrário. As três notícias falsas com mais compartilhamentos no momento em que foram checadas depreciavam a imagem do petista. A mais republicada (133 mil compartilhamentos) foi um vídeo em que um suposto irmão de Lula afirmava que o político “não teria caráter”. Em seguida, vieram um áudio falso em que Lula pedia o assassinato de Antonio Palocci (75 mil compartilhamentos) e uma gravação em que a CUT, central sindical historicamente ligado ao PT, estaria pedindo a prisão do ex-presidente (70 mil compartilhamentos).
Aparecem ainda entre os mais citados o PT, com 12 checagens; Sergio Moro, com 11; Dilma Rousseff, com nove; veículos de imprensa e jornalistas, com oito; o STF (Supremo Tribunal Federal), com sete; e as ONGs, com seis. Com exceção do ministro Sergio Moro, que teve três peças de desinformação que exaltavam sua imagem, todos os outros citados só foram desfavorecidos pelas publicações enganosas.
O levantamento completo das peças de desinformação pode ser conferido aqui. Em nossa análise, separamos as publicações por citações (as que mencionavam “Lula” ou “Lula livre”, por exemplo, ficaram na aba do ex-presidente). Vale ressaltar também que o número de compartilhamentos que aparece na tabela representa apenas o alcance das peças de desinformação no momento em que Aos Fatos realizou a marcação na ferramenta do Facebook. Os números, portanto, podem ser maiores hoje.
O Aos Fatos tem por princípio tratar todos os espectros políticos de forma equilibrada nas suas publicações. No entanto, não ignoramos a força dos principais difusores de desinformação, porque isso resultaria em um tratamento assimétrico do fluxo de informações falsas. Ou seja, o volume de checagens acompanha de forma proporcional o número de peças de desinformação que é difundido por cada um dos lados.
A escolha do que será checado dentro do universo de desinformação fornecido pelo Facebook segue critérios objetivos. Aos Fatos preza pela checagem de conteúdos de acordo com o alcance (número de visualizações e compartilhamentos) e com o dano potencial que a informação falsa pode causar. Assim, é normal que políticos com mandato recebam atenção especial pela influência que têm na formulação e execução de políticas públicas.
O que é? A parceria do Aos Fatos com o Facebook para verificar conteúdo distribuído na rede social começou em maio de 2018, antes das eleições presidenciais. O projeto, presente hoje em mais de 50 países, faz com que, uma vez identificada e checada a desinformação, o algoritmo da plataforma reduza o alcance da postagem e notifique usuários que viram ou interagiram com ela. A parceria foi estendida em dezembro para o Instagram e prevê sanções similares aos disseminadores de conteúdo falso na plataforma.
O conteúdo fornecido pelo Facebook aos checadores é selecionado primariamente a partir da denúncia de usuários. No canto superior direito das publicações, é possível encontrar a opção “Obter apoio ou fazer denúncia”. Ali, pode-se classificar algo como “Notícia falsa”.
Há ainda machine learning: ao passo que as checagens são publicadas, o algoritmo do Facebook começa a fazer suas próprias sugestões de conteúdos potencialmente falsos ou distorcidos.
Quem faz? A escolha dos parceiros pelo Facebook não foi aleatória. Assim como o Aos Fatos, todos os veículos integrantes do projeto são membros da IFCN (International Fact-Checking Networking). Isso significa que os parceiros seguem o Código de Princípios definido pela organização, que prevê imparcialidade, transparência e política de correção.
Sobre esse último quesito, o Facebook permite que usuários e administradores marcados por disseminar conteúdo enganoso possam contestar as checagens na plataforma. No caso do Aos Fatos pedidos de correção podem ser enviados pelo e-mail ouvidoria@aosfatos.org em um período de sete dias após a marcação do post na rede social. Caso os verificadores atestem que o erro foi corrigido, a penalidade é retirada da publicação.
Mais lidas. Além de política, desinformações sobre saúde e questões socioambientais também deram o tom das checagens em 2019. O desastre de Brumadinho, as obras na BR-163 (que liga o Rio Grande do Sul ao Pará) e a ativista Greta Thunberg estão entre as checagens feitas dentro da parceria com o Facebook mais lidas pela audiência este ano.
Conteúdos enganosos que envolviam temas de saúde se sobressaíram em relação ao número de compartilhamentos na época em que foram checados. Um vídeo que sugeria que perfurar dedos e orelhas auxiliaria vítimas de AVC tinha sido compartilhado ao menos 720 mil vezes antes de ser checado como falso. E pelo menos 700 mil pessoas haviam divulgado as imagens que mostravam um suposto verme mortal em pimentões.