Entenda a Vaza Jato e a perseguição contra Glenn
Foto: Dida Sampaio/Estadão
O jornalista Glenn Greenwald foi denunciado pelo Ministério Público Federal nesta terça, 21, no âmbito da operação Spoofing, que apura a invasão de aplicativos de mensagens de autoridades brasileiras, entre elas o atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, e procuradores da Lava-Jato.
Integrantes da cúpula da Procuradoria-Geral da República (PGR) ouvidos pelo Estado/Broadcast avaliam que não há empecilhos legais para o jornalista Glenn Greenwald ter se tornado alvo de denúncia do Ministério Público Federal (MPF), mesmo sem ser formalmente investigado na Operação Spoofing.
Veja a cronologia do caso:
Às 18h45 do dia 4 de junho de 2019 teve início uma reunião de emergência na sede do Ministério da Justiça e da Segurança Pública, em Brasília. Uma hora antes, a conta do ministro Sérgio Moro no aplicativo de troca de mensagens Telegram havia sido alvo de um ataque hacker.
Sérgio Moro
O site The Intercept Brasil, do jornalista Glenn Greenwald, começa a divulgar reportagens com base em fonte anônima que revelam conversas privadas pelo aplicativo Telegram entre Moro e o procurador Deltan Dallagnol, de quando o atual ministro ainda atuava como juiz federal em Curitiba.
Na Operação Spoofing, a Polícia Federal prende quatro suspeitos de invadir o celular de autoridades do País. Entre os presos está Walter Delgatti Neto, o ‘Vermelho’, que admitiu ter capturado mensagens pessoais de procuradores da Lava Jato e repassado a Glenn, que não confirmava a fontes das informações.
A investigação sobre a invasão de telefones de autoridades indica que centenas de celulares de autoridades, entre elas o ministro da Economia, Paulo Guedes, e a então líder do governo, deputada Joice Hasselmann, a até o presidente Jair Bolsonaro, foram hackeados ou sofreram tentativas de hackeamento, em uma ação ‘muito além da Lava Jato’.
Vermelho diz em depoimento à Polícia Federal que conseguiu o telefone de Glenn ao invadir a conta da ex-deputada federal Manuela D’Ávila (PCdoB-RS) no Telegram. Em nota, Manuela diz que, em maio, seu aplicativo foi invadido e confirmou que repassou ao “invasor” do seu celular o contato de Greenwald. O jornalista não revelava sua fonte.
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), atende a pedido do partido Rede Sustentabilidade e dá liminar para impedir que Glenn, por ser jornalista, seja investigado e responsabilizado pelas autoridades públicas e órgãos de apuração administrativa ou criminal (como a Polícia Federal) pela “recepção, obtenção ou transmissão” de informações publicadas na imprensa.
Na segunda fase da Operação Spoofing, a Polícia Federal prende mais dois suspeitos de participar da invasão dos celulares de autoridades. Foram presos o programador de computadores Thiago Martins, o ‘Chiclete’, e Luiz Molição.
2 de dezembro de 2019
O juiz Vallisney Oliveira da 10ª Vara Federal de Brasília homologa o acordo de delação premiada do estudante de Direito Luiz Henrique Molição, de 19 anos, que é solto um dia depois.
21 de janeiro de 2020
O Ministério Público Federal denuncia Glenn e seis hackers. No que se refere à responsabilização do jornalista, o MPF ressalta que o jornalista não era alvo das investigações. Ocorre que, durante a análise de um computador apreendido na casa de Walter Delgatti Netto, o ‘Vermelho’, foi encontrado um áudio de um diálogo entre Luiz Molição e Glenn no qual o jornalista teria orientado os hackers. Glenn reage à denúncia e diz ver “retaliação”. Denúncia é criticada pela OAB e Abraji. Leia o diálogo entre Glenn e o hacker.
Entenda quem são os personagens envolvidos no caso:
Glenn Greenwald
Jornalista do site The Intercept Brasil, produziu as reportagens que revelaram as supostas mensagens de procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato. Segundo a Procuradoria, teria incentivado e orientado o grupo durante os períodos das invasões. Em agosto do ano passado, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, havia concedido uma liminar que impedia o jornalista de ser investigado e responsabilizado. Norte-americano, é casado com o deputado federal David Miranda (PSOL-RJ). Recebeu o Prêmio Pulitzer em 2014 por reportagens que revelaram a espionagem da Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA).
Walter Delgatti Neto (Vermelho)
Estudante de Direito. Segundo a denúncia, ‘Vermelho’ seria o líder do “Grupo de Araraquara”, organização criminosa que praticava crimes cibernéticos bancários desde 2017. Teria sido o responsável por 126 interceptações telefônicas e 176 invasões de dispositivos informáticos. Foi investigado em, pelo menos, outros oito casos e acumula processos por estelionato, falsificação de documentos e furto. Foi preso em flagrante em 2015 por portar remédios de uso controlado e receitas em nomes de pacientes. Em 2018, foi condenado a 2 anos em regime semiaberto por falsificação de documentos.
Thiago Eliezer Martins Santos
Empresário e programador, também conhecido como ‘Chiclete’. Atuaria ao lado de Vermelho na mentoria da organização criminosa.
Gustavo Henrique Elias Santos
Também conhecido como ‘DJ Guto Dubra’, amigo de Vermelho. Programador da organização criminosa, segundo a Procuradoria. Teria desenvolvido técnicas que permitiram a invasão do Telegram e atuado em fraudes bancárias. Já havia sido condenado por receptação de uma caminhonete furtada em 2015. No mesmo ano, foi detido com Delgatti e a esposa Suelen em um parque temático em Santa Catarina.
Suelen Priscila de Oliveira
Esposa de Gustavo, seria laranja do grupo e recrutadora de pessoas para participar das ações do grupo.
Danilo Cristiano Marques
Motorista de aplicativo. ‘Testa-de-ferro’ de Vermelho, de acordo com a denúncia. Teria proporcionado meios materiais para que o líder executasse os crimes. Ainda teria atuado como laranja de Delgatti. Apontado como amigo antigo de Delgatti, foi testemunha de defesa dele em dois processos criminais.
Luiz Henrique Molição
Estudante de Direito, colega de turma de Vermelho. De acordo com a denúncia, invadia terminais informáticos e aconselhava o líder sobre as ações que deveriam ser tomadas pelo grupo. Fechou delação premiada com a Polícia Federal e afirmou que Delgatti tem “perfil narcisista e sociopata”. Foi o porta-voz nas conversas com o jornalista Glenn Greenwald.
Wellington Divino Marques de Oliveira
Procurador da República no Distrito Federal. Assina a denúncia da Operação Spoofing contra os seis suspeitos de hackear celulares de procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato e o jornalista Glenn Greenwald. Em dezembro do ano passado, Oliveira denunciou por calúnia o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, por declarações contra o ministro da Justiça Sergio Moro. A acusação foi rejeitada pela 15ª Vara da Justiça Federal de Brasília.