Fritura não é rara no Governo Bolsonaro
Foto: Jorge William / Agência O Globo
Apesar de o presidente Jair Bolsonaro dizer recentemente que não precisa “fritar” seus ministros antes de demiti-los, não foi esse o padrão observado em pouco mais de um ano de governo, mesmo com integrantes do antigo “núcleo duro”, como Gustavo Bebianno e Carlos Alberto dos Santos Cruz, exonerados depois de um processo de exposição pública. Agora, o esvaziamento das funções de Onyx Lorenzoni (Casa Civil) aparenta seguir o mesmo modelo.
A queda de Bebianno, que ocupava a Secretaria-Geral, começou quando, em meio a rumores de que Bolsonaro estaria irritado com ele, o então ministro disse ao GLOBO que havia falado três vezes com o presidente naquele dia. No dia seguinte, o vereador Carlos Bolsonaro acusou, no Twitter, o ministro de estar mentindo. As publicações de Carlos foram retuitadas pelo pai que, horas depois, repetiu em uma entrevista que não havia conversado com Bebianno.
Dois dias depois, uma sexta-feira, a situação continuava indefinida: o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, disse que Bebianno seria mantido no cargo. O próprio Bebianno disse que não havia “crise”. No fim do dia, contudo, Bolsonaro tomou a decisão de demiti-lo, após uma reunião entre os dois. Após um fim de semana de expectativas, a demissão foi confirmada apenas na tarde segunda-feira, pelo porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, que limitou-se a dizer que foi uma decisão de “foro íntimo” do presidente.
A segunda demissão do governo foi de Ricardo Vélez, da Educação. Após uma gestão considerada desastrosa, com demissões em série na pasta, a decisão de dispensar o ministro foi noticiada pela “Globonews”. No mesmo dia, Bolsonaro chamou a notícia de “fake news”. Menos de 15 dias depois, no entanto, Vélez foi exonerado, dias após o presidente dizer que estava “claro” que sua gestão não estava “dando certo”.
O terceiro ministro demitido, Carlos Alberto dos Santos Cruz (Secretaria de Governo), caiu depois de mais de um mês de ataques de Carlos Bolsonaro e do ideólogo Olavo de Carvalho. Carlos chamou de “falha” a comunicação do governo, área subordinada a Santos Cruz. Já o ministro e Olavo de Carvalho trocaram acusações publicamente. Além disso, Santos Cruz relatou a Bolsonaro que foi alvo de uma ação coordenada nas redes sociais, com a participação dos filhos do presidente, do chefe da Secretaria de Comunicação, Fábio Wajngarten, e de assessores ligados ao ideólogo de direita, Olavo de Carvalho. Na época da demissão, um auxiliar do presidente relatou que Bolsonaro já tinha decidido exonera-lo um mês antes, mas esperou para criar um consenso entre a equipe de que a permanência do ministro era insustentável.
Em outros episódios, a “fritura” não é explícita, e tem idas e vindas, como com o ministro da Justiça (Sergio Moro). Em agosto do ano passado, Bolsonaro desautorizou Moro publicamente, ao dizer que é ele, e não o ministro, que indica o diretor-geral da Polícia Federal (PF), e ao ameaçar demitir o atual diretor, Maurício Valeixo. Uma semana depois, contudo, Bolsonaro fez afagos públicos ao ministro durante uma cerimônia no Palácio do Planalto, abraçando ele e posando para fotos e elogiando ele em seus discursos.
Recentemente, outra crise entre os dois foi causada após Bolsonaro dizer a secretários estaduais, e depois reafirmar à imprensa, que estudava recriar o Ministério da Segurança Pública, mesmo admitindo que Moro era contrário — a medida enfraqueceria o ministro, que atualmente é responsável pela área. Depois de Moro indicar que poderia sair do governo e de uma reação contrária forte nas redes sociais, o presidente recuou e disse que a chance “no momento” de recriar o ministério era “zero”.
Foi nesse contexto que Bolsonaro disse, em uma entrevista, que não precisa “fritar” os ministros e que eles não têm medo dele — uma afirmação confrontada com os fatos uma semana depois, quando Onyx Lorenzoni viu, à distância, subordinados seus serem demitidos e seu ministério perder uma das suas principais funções, a coordenação do Programa de Parcerias e Investimentos (PPI). O ministro antecipou seu retorno das férias para conversar com Bolsonaro ainda nesta sexta-feira, mas a previsão do encontro ainda não consta na agenda deles.