Irã diz que deu “tapa na cara dos EUA”
Foto: Site oficial do aitolá Ali Khamenei / Via Reuters
Em um pronunciamento televisivo, o aiatolá Ali Khamenei, líder supremo do Irã, disse que o ataque com mísseis contra bases que abrigam tropas americanas no Iraque foi “um tapa na cara” dos Estados Unidos e que Washington deve pôr um fim a sua “presença corrupta” na região, abandonando-a de vez. Os projéteis iranianos foram lançados em retaliação ao assassinato do general Qassem Soleimani pelos EUA, no dia 3 de janeiro (noite do dia 2, horário de Brasília). Segundo o governo iraquiano, não fizeram vítimas.
Em seu primeiro discurso desde a morte do general, Khamenei disse que o Oriente Médio “não irá tolerar a presença americana na região” e que “as nações e os governos apoiados por seus povos também não a tolerarão”. Ele não fez novas ameaças militares aos americanos, mas afirmou que os apelos americanos a negociações são simplesmente“o início de uma intervenção”.
O líder supremo fez ainda elogios a Soleimani, chamando o general de “corajoso e atencioso” e “cuidadoso” nas arenas política e militar. Anteriormente, Khamenei só havia se pronunciado em seu Twitter, quando prometeu “vingança implacável” pela morte do comandante das Forças Quds da Guarda Revolucionária do Irã, unidade de elite responsável pela articulação regional dos grupos pró-Irã em países como Síria e Iraque.
De acordo com militares iraquianos, o Irã teria lançado 22 mísseis contra duas bases que abrigam boa parte dos 5.200 soldados americanos no Iraque: Ayn al-Asad, no Oeste, e Irbil, no Curdistão iraquiano. Os mísseis balísticos foram lançados diretamente do território iraniano pela Guarda Revolucionária, e não pelas tradicionais milícias pró-Irã da região, como informações prévias apontavam que seria feito.
Segundo o primeiro-ministro iraquiano, Adel Abdul Mahdi, suas tropas foram alertadas sobre a iminência do ataque por Teerã e passaram a informação para os soldados americanos.
“Logo após a meia-noite de quarta-feira, nós recebemos uma mensagem verbal da República Islâmica do Irã de que a resposta iraniana para o assassinato do mártir Qasse Soleimani havia começado ou estava prestes a começar”, seu porta-voz disse em um comunicado, afirmando ainda que a comunicação iraniana não especificava o lugar dos ataques, citando apenas que seriam em bases com presença americana.
O ataque, segundo forças iranianas, teria começado às 1h20 da manhã desta quarta-feira, 19h20 no horário de Brasília — mesma hora do ataque que matou Soleimani. Funcionários da alta cúpula das Forças Armadas iraquianas que trabalham ao lado dos EUA disseram que nenhum americano ou iraquiano foi morto. Washington, no entanto, não confirmou esta informação. Os governos do Reino Unido, da Suécia, da Polônia, da Austrália e da Dinamarca, que também estão em território iraquiano, também afirmaram que nenhum de seus cidadãos perdeu a vida.
Baseando-se nestas informações oficiais, analistas apontam que os ataques iranianos indicam de fato uma vingança proporcional ao assassinato de Soleimani, mas sua escala e as declarações de Khamenei apontam cautela. Em mensagens postadas na manhã desta quarta-feira, o presidente Hassan Rouhani reforçou a fala de Khamenei, afirmando que a resposta final para o assassinato de Soleimani será “expulsar todas as forças americanas da região” e que o general “lutou heroicamente contra o Estado Islâmico, o al-Nusrah, a al-Qaeda etc”. Se não fosse por ele, “capitais europeias estariam em grande perigo agora”.
Horas antes, logo após o ataque, o chanceler Java Zarif já havia afirmado que a operação iraniana foi de “autodefesa”, segundo o Artigo 51 da Carta da ONU, que prevê o direito de resposta em caso de agressão, e direcionada a “base a partir da qual o covarde ataque” foi lançado. Ele disse ainda o país persa “não busca uma escalada de guerra”, mas que irá se defender de agressões.
Os comentários imediatos do presidente americano, Donald Trump, que até a tarde de ontem prometia responder de maneira “desproporcional” a qualquer retaliação iraniana, também representaram uma mudança de retórica. Em seu Twitter, o líder americano disse que está “tudo está bem” e que os EUA “têm as Forças Armadas mais poderosas e bem equipadas do mundo, de longe”. A Casa Branca cogitou fazer um pronunciamento oficial à nação na noite de ontem, mas o adiou para a manhã desta quarta-feira. Isto, segundo New York Times, pode ser um indicativo de uma retaliação americana pode demorar — ou simplesmente não acontecer.
— Eu acho que esta é a primeira indicação de que o presidente planeja reduzir [as tensões] — disse ao Financial Times Mike Rogers, principal republicano na Comissão de Segurança Interna da Câmara americana. — Eu acredito que foi intencional da parte dos iranianos não matar americanos, para que possam pôr um fim a esta situação.