Plano de Trump para a Palestina ignora palestinos
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Com o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, ao seu lado, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, divulgou o seu muito alardeado plano de paz para o Oriente Médio na tarde desta terça-feira, desenvolvido sob a supervisão do seu genro e conselheiro, Jared Kushner, ao longo de mais de dois anos. O plano, favorável aos pleitos israelenses, reduz substancialmente o território de um futuro Estado palestino em relação à Linha Verde, a fronteira anterior à Guerra dos Seis Dias, em 1967, quando Israel ocupou a Cisjordânia e a Faixa de Gaza.
O plano de Trump garantiria a Israel o controle de Jerusalém, que seria, segundo o presidente, ” a capital indivisível” do Estado israelense. Apesar disso, prevê uma capital palestina em “áreas” do setor oriental de Jerusalém, onde, segundo Trump, “os EUA orgulhosamente abrirão sua embaixada”. Ainda não está claro o que são essas “áreas”, porque as duas informações parecem contraditórias, mas algumas fontes indicaram tratar-se de Abu Dis, uma pequena vila da Cisjordânia contígua — mas fora — de Jerusalém Oriental, onde estão situados vários escritórios palestinos relacionados à cidade.
O plano não prevê a desocupação de nenhum dos assentamentos israelenses na Cisjordânia, que são atualmente considerados o principal obstáculo à paz entre os dois lados. O acordo inclui a continuidade da presença militar de Israel no Vale do Jordão, uma área agrícola e estratégica da Cisjordânia contígua à Jordânia. O primeiro-ministro de Israel, que falou após Trump, confirmou que, sob o plano, Washington reconhecerá os assentamentos, onde vivem mais de 400 mil israelenses, como parte de Israel.
O plano também prevê que um futuro Estado palestino seria fracionado territorialmente e desmilitarizado, sem Forças Armadas, e reconheceria Israel, onde vivem 1,8 milhão de árabes, como um Estado judeu. Segundo o proposto, refugiados palestinos perderiam esse status e não teriam direito a retornar às áreas em Israel ou sob controle de Israel de onde partiram ou foram expulsos após as guerras de 1948 e 1967. O chamado “direito de retorno” é uma reivindicação histórica dos palestinos, que teriam então que optar entre viver no novo Estado reduzido, optar pela cidadania do país onde vivem ou por realocar-se em terceiros países.
Tal como proposto, o plano de Trump se distancia substancialmente de todos os que foram negociados pelos presidentes americanos antes dele desde os anos 1990, quandos os Acordos de Oslo, nunca integralmente implementados, abriram caminho para o que seria a criação de um Estado palestino. As negociações estão paradas desde 2014.
O plano foi apresentado na Casa Branca, perante uma plateia que aplaudia Trump entusiasticamente. Em um aceno à sua própria candidatura à reeleição — os evangélicos, base importante do eleitorado republicano, são fortes apoiadores de Israel — Trump se gabou:
— Eu fiz muito por Israel. Nunca pediremos a Israel que comprometa sua segurança — disse ele. — Nossa aliança com o Estado de Israel nunca foi mais forte do que é hoje.
Os líderes palestinos, que consideram que Trump não é um mediador confiável entre os dois lados, já deram sinais de que se oporão a todos os elementos do plano, mesmo com a promessa de recompensas econômicas de US$ 50 bilhões ou mais que o governo Trump diz que pode oferecer.
Trump insistiu que seu plano seria bom para os palestinos e, em seu discurso, fez um chamado ao presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas.
— Quero que saiba que, se você escolher o caminho para a paz, os EUA e muitos outros países estaremos lá para ajudá-lo de tantas maneiras diferentes — disse, embora o plano não tenha sido discutido com nenhuma autoridade palestina. — Minha visão apresenta uma oportunidade de ganho para ambos os lados, uma solução realista de dois Estados.
Netanyahu destacou que, pelo plano, Israel está oferecendo aos palestinos “no final do processo, soberania condicional e limitada”. Para o ex-ministro israelense Yossi Beilin, figura crucial nos Acordos de Olso nos anos 1990, o plano de paz apresentado por Trump é “totalmente unilateral”.
— É inacreditável propor um plano assim sem falar conversar com os palestinos — criticou ele em entrevista à CNN.
Logo após o anúncio de Trump, a Jordânia já rejeitou o plano, alegando apoiar apenas uma solução baseada nas fronteiras de 1967 com Jerusalém Oriental como capital de um Estado palestino. O chanceler Ayman Safadi alertou Israel contra tentativas unilaterais de anexar território palestino.
Muitos analistas destacam que um aspecto relevante do plano é seu efeito potencial nas eleições de Israel em 2 de março, que provavelmente decidirão o destino de Netanyahu, às voltas com processos por corrupção, e, também, como uma maneira de desviar a atenção do processo de impeachment de Trump em curso no Senado.
Na segunda-feira, Trump apresentou os detalhes do plano a Netanyahu e seu principal rival político, Benny Gantz, do Partido Azul e Branco, sem a presença de nenhum palestino.
Segundo o embaixador palestino no Reino Unido, o plano de paz do presidente de Trump dá luz verde a Israel para estabelecer um Estado de apartheid, e “mata” as possibilidades de paz”.
— O presidente Trump acabou de matar as perspectivas de uma solução de dois Estados negociada — afirmou Husam Zomlot. — O primeiro-ministro israelense já tinha embolsado Jerusalém, todos os assentamentos, o Vale do Jordão, que é mais de um terço da Cisjordânia ocupada.
O presidente da Autoridade Nacional Palestina Mahmoud Abbas fará um pronunciamento na tarde desta terça-feira.