MPF impede Doria de “cadastrar” críticos

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Foto: Zanone Fraissat/Folhapress

O procurador do Ministério Público de Contas José Mendes Neto pediu a suspensão do edital de R$ 15,8 milhões para a comunicação do governo João Doria (PSDB). Em representação ao Tribunal de Contas do Estado, ele afirma que, ao dispor sobre ‘fichas individualizadas de detratores e apoiadores’, o edital pode incorrer em ‘censura’ ou ‘classificação crítica’ dos usuários, ferindo a liberdade de expressão nas redes.

O governo estadual afirmou que se ‘adiantou’ e mudou trechos do edital. “Por dever de cuidado e objetivando afastar toda e qualquer possibilidade de mal entendido e, ainda, para que não paire a menor dúvida a respeito da legitimidade e lisura do presente certame, foi providenciada a publicação de novo edital no qual foram ajustadas as disposições de seu Anexo I”.

“Ainda que nenhum pedido de esclarecimento tenha sido apresentado e a todos os licitantes os termos do edital parecer estar bastante claros e precisos, em nome do interesse público, foram retirados do texto os termos que davam margem a falsas interpretações, trazendo ainda mais transparência ao processo”, ressalta o governo.

O pedido do Ministério Público de Contas se dá no âmbito de um requerimento do senador Major Olímpio (PSL/SP) contra a concorrência, marcada para 16 de março.

Uma das principais críticas do parlamentar e, agora, do procurador, se dá em torno do item ‘monitoramento online’, presente no edital, que dispõe sobre a classificação de ‘todas as interações de usuários (neutro, positiva e
negativa), indicar sua repercussão, reputação, evolução de sentimento, principais influenciadores e demais informações estratégicas para a tomada de decisões’.

“Situações que indiquem possíveis repercussões com alto volume devem gerar alerta, especialmente àquelas que possam gerar crise. Os perfis, temas, veículos online e redes sociais serão indicados pela contratante”, diz o edital, que prevê a entrega de informações sobre ‘principais influenciadores (detratores e apoiadores) em fichas individualizadas’.

Para o procurador de Contas, ‘sendo “livre a manifestação do pensamento, por determinação constitucional (artigo 5e, inciso lV), não cabe à Administração Estadual, no mesmo contexto, conceber formas de censura ou de classificação crítica que possam tolher essa liberdade’.

“Ora, pelo emprego da expressão “fichas individualizadas’, deixa claro o edital que serão colhidas e armazenadas informações a respeito de pessoa determinada ou de ente específico, que possa ser compreendido como influenciador de relevo na rede social, catalogando-o, por fim, como detrator ou como apoiador”, escreve.

Segundo Mendes Neto, ‘dentre as obrigações da contratada, há também a de emitir juízo de valor depreciativo a respeito de usuários das redes sociais, e é certo que, ao se rotular alguém como “detrator”, o significado do termo, no caso concreto, estará identificando aquele que desvaloriza o mérito ou deprecia a importância de uma ação de governo, compreendendo-se esta, naturalmente, como uma referência positiva’.

“É inconcebível, todavia, sob a égide da liberdade de manifestação do pensamento (CF, artigo 5e, inciso lV), que os usuários das redes sociais estejam sujeitos a esse labor de classificação individual e de valoração depreciativa, contratado e custeado pela Administração Estadual. A expressão das opiniões não pode estar submetida às influências cerceadoras de um banco de dados público que passe a fiscalizar e controlar as redes sociais”, anota.

O procurador sustenta que ‘é inequívoco que a possibilidade de monitoramento das redes sociais e da análise de seus informes deverá estar circunscrita ao escopo de aprimoramento dos planos e dos projetos de governo, devendo ser extirpadas do projeto básico as atividades consistentes na classificação de “apoiadores e detratores”, e no exame individualizado d as manifestações dos indigitados “principais influenciadores”.

O procurador também se manifesta contra a aglutinação de itens que poderiam ser objeto de licitações separadas no mesmo contrato.

“Ainda quanto ao projeto básico, há de se reconhecer que o objeto licitatório, sob os nominados “serviços de planejamento, desenvolvimento e execução de soluções de inteligência em comunicação digital”, reúne, em verdade, atividades bastante diferenciadas, enquanto o edital, a caracterizar a aglutinação que impõe ilegítima restrição à participação dos potenciais interessados no certame, silencia acerca da formação de consórcios e veda a subcontratação”, anota.

O procurador de Contas ainda é contra a possibilidade de cooperativas participarem do edital. Ele avalia que o edital restringe o o termo ao mero fornecimento de mão de obra, o que não é permitido para termos com as cooperativas.

Estadão