Assassinato de Marielle completa 2 anos sem solução

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Foto: Reprodução

O assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) e de seu motorista Anderson Gomes completa dois anos neste sábado (14) com uma investigação marcada por conflitos políticos e institucionais na busca pelo mandante do crime.

Enquanto às vésperas do fim do primeiro ano da apuração a polícia divulgou ter descoberto os executores dos assassinatos, agora os episódios têm sido de discussões entre o presidente Jair Bolsonaro, o governador Wilson Witzel (PSC), a ex-procuradora-geral da República Raquel Dodge e membros do Ministério Público do Rio de Janeiro.

Os embates ocorrem em torno da condução das investigações sobre um possível mandante do crime. A apuração, sob sigilo, ainda não apontou o mentor dos homicídios.

Marielle e Anderson foram mortos numa emboscada no centro do Rio de Janeiro em 14 de março de 2018, quando o estado estava sob intervenção federal na segurança pública, sob coordenação operacional do Exército.​

A vereadora havia participado de um debate de mulheres negras e se dirigia para casa quando foi atingida por quatro tiros na cabeça. O motorista foi atingido por três projéteis nas costas. A ex-assessora que os acompanhava ficou ferida por estilhaços.

Dois foram acusados pela execução do crime. O policial Ronnie Lessa e o ex-PM Élcio de Queiroz serão julgados pelo Tribunal do Júri em data a ser marcada. Presos em março de 2019, eles negam participação.

Outros três já foram investigados sob suspeita de terem mandado matar Marielle: o vereador Marcelo Siciliano, o ex-vereador Cristiano Girão e o ex-deputado Domingos Brazão, conselheiro afastado do TCE (Tribunal de Contas do Estado). Todos também negam envolvimento.

A suspeita sobre Brazão se tornou o pivô da briga entre Dodge e o MP-RJ. A então procuradora-geral da República afirmou em denúncia ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) que o ex-deputado “arquitetou o homicídio da vereadora Marielle Franco e, visando manter-se impune, esquematizou a difusão de notícia falsa sobre os responsáveis” pelo crime.

Embora tenha apontado o conselheiro afastado como mandante, Dodge não apresentou provas sobre o tema nem sequer o acusou do crime de homicídio. A frase foi colocada na denúncia por obstrução de Justiça contra ele, por inclusão de uma testemunha falsa no início da investigação, em 2018.

A ex-PGR também pediu ao STJ a federalização do caso, sob a justificativa de que a Polícia Civil fluminense estava vulnerável às tentativas de interferência na investigação. Na peça, expôs um áudio entre dois investigados no qual sugeriam que os acusados pelo crime não eram os reais executores.

O pedido sofreu dura resposta do MP-RJ. Nela, o pedido de federalização é descrito como um “capricho pessoal” de Dodge baseado em “disse me disse” e “fofocas de corredores penitenciários”.

Criticou ainda a exposição da gravação que apontava outros executores do crime. A Promotoria afirma que checou as informações ali contidas e todas se revelaram infundadas.

“Naturalmente, o conteúdo do áudio está sendo cuidadosamente checado, embora cause o mínimo de perplexidade que a ex-PGR acredite que nos dias atuais alguém, sobretudo milicianos e criminosos, possam confessar ou revelar os reais integrantes de um crime numa conversa telefônica. É espantoso!”, escreveram os membros do MP-RJ, em peça sob sigilo revelada pelo G1 e confirmada pela Folha.

A apuração sobre um possível mandante também culminou no rompimento entre Bolsonaro e Witzel, aliados na campanha eleitoral de 2018. O atrito ocorreu após ser divulgada a menção ao presidente no depoimento de um porteiro do condomínio Vivendas da Barra, em que viviam Bolsonaro e Lessa.

O porteiro disse que foi o então deputado federal quem autorizou a entrada de Élcio no local no dia do crime. Uma planilha manuscrita também indicava como destino do ex-PM a casa 58, de Bolsonaro.

Contudo o presidente estava em Brasília quando o acusado entrou no condomínio. Além disso, uma gravação no sistema de interfone do condomínio apontou que o responsável por autorizar a entrada foi Lessa, e não o hoje presidente Bolsonaro.

Apesar de logo terem vindo à tona as circunstâncias duvidosas sobre a menção a Bolsonaro, o presidente passou a acusar o governador do Rio de interferir nas investigações com o objetivo de envolver sua família no assassinato da vereadora. Witzel nega ter conduzido as linhas de apuração do inquérito.

De qualquer forma, a investigação do caso Marielle gerou desdobramentos que causam preocupação real à família presidencial.

A apuração do homicídio deu início a um procedimento do MP-RJ para investigar a existência de um suposto grupo de assassinos de aluguel, chamado pela Promotoria de “Escritório do Crime”.

Nele, já era alvo o ex-capitão PM Adriano da Nóbrega, ligado ao senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ) e recentemente chamado de “herói” pelo presidente da República.

O inquérito sobre os supostos assassinos profissionais deu origem à investigação sobre a milícia de Rio das Pedras. Foi nesse caso que o mandado de prisão contra Adriano foi expedido, em janeiro de 2019.

O ex-capitão foi morto em fevereiro passado, após ficar mais de um ano foragido. Neste período, identificou-se que ele tinha duas parentes nomeadas por Flávio na Assembleia do Rio e que contas controladas pelo ex-PM abasteceram Fabrício Queiroz, apontado como operador da “rachadinha” no antigo gabinete do filho do presidente.

Adriano já havia sido homenageado em 2005 por Flávio com a Medalha Tiradentes e defendido por Jair Bolsonaro, no mesmo ano, quando foi condenado por homicídio —caso no qual foi absolvido dois anos depois.

Redação com Folha