Parlamentares bolsonaristas usam dinheiro público para protestos

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Foto: José Cruz/Agência Brasil

Políticos estão por trás de movimentos que organizam uma manifestação contra o Congresso e em defesa do presidente Jair Bolsonaro. Em alguns casos, usam a estrutura dos seus gabinetes para divulgar o ato e atacar opositores. Um dos principais organizadores da manifestação, o grupo Movimento Conservador, funciona dentro do gabinete do deputado estadual Douglas Garcia (PSL) na Assembleia Legislativa de São Paulo, no que está sendo chamado de versão paulista do “gabinete do ódio” da Presidência da República.

O presidente do movimento é Edson Salomão, chefe de gabinete de Garcia. Assim como o parlamentar, ele é ligado ao deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). Segundo denúncia feita à Justiça de São Paulo pelo deputado federal Junior Bozzella (PSL-SP), que rompeu com a família Bolsonaro, a atuação do escritório de Garcia é similar ao do gabinete que funciona no terceiro andar do Palácio do Planalto e abriga os assessores responsáveis pelas redes sociais de Bolsonaro, o “gabinete do ódio” original. Preocupados com a atuação do grupo, deputados estaduais já trabalham para instaurar na Assembleia, na semana que vem, uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre fake news.

Outras duas organizações bolsonaristas que estão convocando as manifestações são diretamente ligadas a parlamentares que apoiam o presidente. O Movimento Avança Brasil tem como um de seus principais quadros o deputado federal Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSL-SP), enquanto o Nas Ruas é liderado pela deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP).

Essa estrutura orgânica é alimentada pelas declarações de Bolsonaro, que tem usado os atos para pressionar o Congresso a abrir mão do controle sobre parte do Orçamento. Com ação majoritariamente virtual, os grupos bolsonaristas também estão por trás dos ataques nas redes sociais contra adversários do governo.

Na semana passada, uma reportagem do portal UOL revelou que uma das páginas utilizadas para ataques virtuais e para estimular o ódio contra supostos adversários do presidente foi criada a partir de um computador localizado na Câmara dos Deputados. A página, chamada Bolsofeios, também foi registrada a partir de um telefone utilizado pelo secretário parlamentar de Eduardo Bolsonaro, Eduardo Guimarães.

 

Em suas redes sociais, o Movimento Conservador fez uma ofensiva sobre outros organizadores dos atos para que não sejam apresentadas demandas além da defesa do presidente. “Qualquer outro grupo que apresente pautas diversas tem o único objetivo que é dispersar a manifestação”, escreveu Salomão, no último dia 23.

Na Assembleia de São Paulo, a CPI das Fake News foi protocolada pelo deputado Mauro Bragato (PSDB). A iniciativa conta com apoio expressivo dos deputados, inclusive da oposição. “Isso aqui parece a farra do boi. Tem deputado fazendo fake news contra outros deputados”, disse Carlos Pignatari (PSDB), líder do governo na Casa, que questionou a atuação do gabinete de Garcia. “É triste que se use dinheiro público para ficar no Twitter batendo em todo mundo.”

O Estado apurou que a bancada do PSL indicou Gil Diniz e Janaína Paschoal para integrar a comissão. Garcia foi indicado como suplente. A bancada do PT deve ter uma cadeira no colegiado. As indicações ainda precisam ser homologadas pela presidência da Casa. Sem partido, Arthur do Val fez uma autoindicação para integrar a CPI. “Como líder (do Patriota), quero participar para que não ocorram arbitrariedades. O que é fake news? Defendo a liberdade de expressão”, disse do Val.

 

Ao menos um deputado da oposição ouvido pelo Estado defende que Garcia seja convocado para prestar esclarecimentos sobre a possibilidade de notícias falsas terem sido disparadas de seu gabinete. “A CPI pode ter um papel importante, até porque a eleição do ano retrasado foi um processo muito complicado. Hoje sabemos que o uso de ‘fazenda de bots’ foi impressionante”, disse o deputado Paulo Fiorilo (PT), indicado para a comissão.

Na noite desta quarta-feira, 11, o plenário da Assembleia Legislativa aprovou um projeto de lei que torna mais duras as penalidades para quem produz ou compartilha notícias falsas. O texto estabelece multa de R$ 2,7 mil para quem compartilhar fake news no território do Estado de São Paulo, e R$ 5,5 mil para os responsáveis pela notícia falsa. Além de Janaína e Diniz, a bancada do partido Novo se declarou contra o projeto.

O projeto, que é de autoria do deputado estadual Edmir Chedid (DEM), agora segue para sanção do governador.

Após a denúncia feita pelo deputado federal Junior Bozzella na semana passada, o Tribunal de Justiça de São Paulo determinou ao Facebook a quebra do sigilo de computadores usados para disseminar ofensas e notícias falsas relacionadas a ele e a outros parlamentares que deixaram de apoiar o presidente.

Ao examinar de onde partiram as mensagens, os advogados do parlamentar chegaram a um provedor público de São Paulo ligado à Companhia de Processamento de Dados do Estado de São Paulo (Prodesp), a estatal responsável pelo processamento de dados para todo o governo de São Paulo e suas respectivas estruturas, entre elas a Assembleia Legislativa.

“O deputado deveria usar seu gabinete para atender a população em vez de fazer orquestrações políticas. Há uma tropa miliciana fazendo ataques virtuais contra diversos deputados”, disse Bozzella ao Estado. Procurados, Edson Salomão e Douglas Garcia não responderam até a conclusão desta edição.

Estadão