Começam depoimentos de ministros militares

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Foto: A Gazeta

O inquérito que apura a suposta interferência do presidente Jair Bolsonaro na Polícia Federal chegou a uma semana decisiva. Começaram a ser ouvidos nesta segunda-feira, 11, os depoimentos de testemunhas e partes interessadas no caso que apresentarão suas versões para os fatos narrados pelo ex-ministro da Justiça Sérgio Moro.

De acordo com juristas ouvidos pelo Estado, os depoimentos terão um peso decisivo para a abertura de um processo judicial – seja contra o Bolsonaro ou Moro – ou para o arquivamento da investigação.

A abertura do inquérito foi pedida pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, para averiguar possíveis atos ilícitos revelados no discurso de demissão de Moro. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello, autorizou a abertura da investigação e intimou o ex-juiz, que já foi ouvido pela PF.

Após o depoimento de Moro, foram intimados a depor delegados da PF, ministros de Estado que teriam participado de uma reunião citada pelo ex-juiz e a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP), implicada no caso por uma troca de mensagens em que ela pediu que Moro aceitasse a saída de Valeixo da direção-geral.

O ex-diretor-geral da PF e aliado de Moro, Maurício Valeixo, foi o primeiro a ser ouvido nesta segunda-feira, 11, na superintendência de Curitiba. Ele afirmou que o presidente Jair Bolsonaro lhe disse que não tinha nada “contra a sua pessoa”, mas queria um diretor-geral com quem tivesse mais “afinidade”. Também foram ouvidos nesta segunda-feira os delegados Alexandre Ramagem – indicado por Bolsonaro como substituto de Valeixo – e Ricardo Saad, ex-superintendente do órgão no Rio.

Para o advogado criminalista André Damiani, o depoimento de Valeixo tem uma importância chave para o rumo que o inquérito irá tomar. De acordo com Damiani, uma vez que o delegado chefiava o cargo do órgão que estaria sofrendo interferência, o depoimento dele se torna fundamental para bancar ou não as afirmações de Moro.

“Com certeza o ex-diretor-geral será chamado a explicar se houve ou não interferências ou tentativas de interferências à sua gestão. Isso é muito importante porque as condutas atribuídas ao presidente passam muito por uma eventual tentativa de interferir em investigações ou no direcionamento da Polícia Federal como instituição”, disse.

Nesta terça-feira, 12, está prevista a exibição do vídeo da reunião ministerial citada por Moro em seu depoimento. A gravação foi posta em sigilo pelo ministro Celso de Mello após uma série de tentativas da AGU de não divulgar o conteúdo na íntegra. Como mostrou o Estado, palavrões e ameaças marcaram a reunião.

Apesar da polêmica quanto a divulgação do material, o advogado Abid Abdouni, criminalista e professor de Direito Constitucional, disse não crer que a gravação seja capaz de comprovar o crime. Para ele, a principal utilidade deve ser o confronto entre o conteúdo e o depoimento das testemunhas.

“Depende muito do conteúdo. Acredito que será mais útil para confrontar as testemunhas. Uma prova vai acabar tendo mais valor que a outra, mas elas têm que estar em consonância. Qualquer inconsistência a prova se torna inválida”, opinou.

Os ministros Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, e Walter Braga Netto, da Casa Civil, foram intimados pela Polícia Federal em razão da participação na reunião do conselho de ministros citada por Moro. O depoimento dos ministros será tomado no Palácio do Planalto, às 15h.

“Diferentemente de Moro, os ministros foram convocados como testemunhas, o que os coloca em uma posição em que têm que falar a verdade, sob pena de cometer o crime de falso testemunho. Eles serão bastante exigidos quanto a essa dinâmica do presidente em requerer condutas do ministro da Justiça a fim de interferir na PF”, afirmou Damiani.

Os delegados Carlos Henrique de Oliveira Sousa, ex-superintendente da PF no Rio, e Alexandre da Silva Saraiva, ex-superintendente no Amazonas, serão ouvidos na quarta-feira, 13, às 15h, em Brasília. O depoimento dos delegados, segundo os juristas, são importantes para esclarecer se houve pressão por parte do governo para que agissem de alguma forma específica.

Outra que será ouvida na quarta-feira é a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP). Assim como os delegados, Zambelli será ouvida em Brasília para esclarecer diálogos apresentados por Moro onde pedia que ele aceitasse a substituição de Valeixo por Ramagem.

Zambelli divulgou uma carta aberta a Moro no dia seguinte à divulgação das conversas pelo ex-ministro, e questionou se Moro respondeu às mensagens dela premeditando o vazamento da conversa.

O ex-superintendente em Minas Gerais Rodrigo de Melo Teixeira é o último depoimento marcado para esta semana. O horário da oitiva também está marcado para às 15h, mas o local ainda não foi definido.

O inquérito não tem um prazo determinado para conclusão, como explica o advogado Abid Abdouni. Após os depoimentos, ainda na fase investigativa, podem ser solicitadas perícias, quebras de sigilo telefônico e telemático e outras diligências. No entanto, a cada 30 dias, o ministro Celso de Mello deve ser informado sobre o andamento da investigação, quando pode se pedir a dilação de prazo para continuidade do inquérito.

Ao fim da etapa investigativa, caberá à procuradoria-geral da República decidir por denunciar o presidente da República por um dos crimes alegados – entre eles, prevaricação e obstrução de justiça -, pelo arquivamento, ou mesmo pelo indiciamento do próprio Moro, caso se configure denunciação caluniosa ou outro crime cometido por ele na divulgação das informações ou na atuação como ministro.

Estadão