Corporativismo no Senado pode salvar Flávio

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Foto: Denio Simões/Valor – 6/4/2020

Corporativismo e a manutenção de interesses particulares dos senadores pesam, neste momento, contra um possível processo que leve à cassação do mandato de Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ).

Com o Senado desarticulado e em reuniões à distância por causa da pandemia – no caso das comissões, nem isso -, qualquer movimento, se ocorrer, só deve ganhar fôlego após a volta dos encontros presenciais, ainda sem data.

O Rede, que já havia apresentado representação contra o filho do presidente Jair Bolsonaro em 19 de fevereiro, requisitou ao presidente da Comissão de Ética da Casa, senador Jayme Campos (DEM-MT), análise imediata da admissibilidade da medida, dados os fatos novos trazidos pela prisão do ex-assessor de Flávio, Fabrício Queiroz, em um imóvel que pertence ao, até ontem, advogado do senador, Frederick Wassef.

A possibilidade de se configurar uma quebra de decoro cometida por Flávio durante o mandato de senador, caso se revele que ele atuou para ajudar a esconder Queiroz, evitando que ele prestasse esclarecimentos à Justiça, é o motor do novo pedido. Mas, estranhamente, o Senado não se movimentou em torno da ofensiva a Flávio. Nem mesmo as siglas que compõem a oposição. O pedido é assinado apenas pelo Rede e pelo Psol, que não tem representante no Senado.

Segundo fontes da Casa ouvidas pelo Valor, pesa um certo “espírito de corpo”, no qual os senadores avaliam cassar um mandato como algo “delicado” e que pode abrir caminhos para que vários outros possam virar alvo. Além disso, com a crise por conta pandemia do coronavírus e eleições municipais no horizonte, muitos senadores preferem não mexer nesse vespeiro. Avaliam que, salvo se surgir prova cabal de ilegalidade na conduta de Flávio, no momento vale mais manter as portas abertas nos ministérios para suas demandas regionais. Há até senador que, nos bastidores, diz Flávio é “um cara legal”, de boa convivência no parlamento – ao contrário da beligerância que marca a atuação pública da família Bolsonaro.

Por fim, há o jogo de forças que a situação impõe. Quanto mais frágil é a situação de Flávio, mais o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP) ganha poder de barganha junto ao Palácio do Planalto. Ele atuou pessoalmente para fazer de Jayme Campos, seu aliado, o presidente do Conselho de Ética – uma prática comum na Casa: Os ex-presidentes do Senado José Sarney (MDB-AP) e Renan Calheiros (MDB-AL) confiaram a tarefa, por seis mandatos de dois anos cada, ao escudeiro João Alberto Souza (MDB-MA), que entre outros salvou, em 2017, o senador Aécio Neves (PSDB-MG), arquivando pedido de cassação por quebra de decoro após surgirem conversas em que o parlamentar pedia dinheiro ao empresário Joesley Batista.

Para Randolfe Rodrigues (Rede-AP), apesar de todas as dificuldades, o desenrolar dos fatos só tende a complicar mais e mais o primogênito de Bolsonaro. “A situação mudou totalmente. O sujeito da ação é o advogado dele. Quebra de decoro é um conceito bastante alargado, mas podemos lembrar, por exemplo, do caso [do deputado] Eduardo Cunha, que foi cassado por ter mentido a uma CPI sobre manter contas no exterior”, lembra.

Segundo o caseiro de Wassef, ouvido pela Polícia Federal, Queiroz estava no imóvel havia um ano. Há um ano, em junho de 2019, o senador dizia, quando questionado sobre o ex-assessor: “Eu não tenho mais nenhum tipo de contato com ele [Queiroz] há quase um ano [desde 2018]. Nunca mais falei. A última notícia que tive, foi pela imprensa”.

Ontem, o senador oficializou a saída de Wassef no Twitter. “A lealdade e a competência do advogado Frederick Wassef são ímpares e insubstituíveis. Contudo, por decisão dele e contra a minha vontade, acreditando que está sendo usado para prejudicar a mim e ao presidente Bolsonaro, deixa a causa mesmo ciente de que nada fez de errado”, disse.

Valor Econômico