Hackers aumentam atividade com crise política

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Foto: Reuters

Sites governamentais desfigurados com mensagens políticas, reaparecimento de hackers que andavam sumidos e o vazamento de dados do presidente da República e seus familiares chamaram a atenção para o crescimento de um fenômeno conhecido como hacktivismo. O termo, criado pela combinação das palavras hacker e ativismo, designa quem usa seus conhecimentos tecnológicos para atacar alguém ou defender uma causa. Um relatório obtido pelo GLOBO e produzido pela empresa HarpiaTech, que realiza o monitoramento de 1479 hackers, indica que o período de forte turbulência política no país, nos últimos meses, foi acompanhado de uma explosão de ativismo na comunidade hacker brasileira.

Apenas em maio e junho, foram observados mais registros vazamentos e outras ações do tipo em redes sociais ou grupos de hackers do que nos cinco meses anteriores somados. Foram 247 menções ou ataques ao governo e ao presidente nesses dois meses em comparação a 221 no período anterior.

Para Filipe Soares, da HarpiaTech, os praticantes de hacktivismo hoje no Brasil não possuem grande capacidade técnica, por isso o estrago que eles podem produzir tende a não ser alto.

– As ações hacktivistas contrárias ao governo Bolsonaro cresceram de forma expressiva nos últimos seis meses com o agravamento da pandemia e da crise institucional. Mas a maioria dos ataques foram realizados contra secretarias estaduais e municípios que possuem nível de segurança cibernética baixo. Demonstra que boa parte do movimento hacktivista não tem capacidade para promover ataques contra alvos sensíveis.

É o caso do vazamento de dados de Jair Bolsonaro e de seus filhos, na última semana, divulgado pelo grupo “Anonymous” e que acabou sendo alvo de uma investigação do Ministério da Justiça. O caso teve repercussão, mas foi minimizado por especialistas em segurança da informação. Eles afirmam que muitos dos dados já circulam há mais tempo na internet, seja em vazamentos anteriores ou em serviços de proteção ao crédito. Dados do ex-ministro Sergio Moro e de sua mulher, Rosângela, do governador de São Paulo, João Doria, e da primeira-dama Michelle Bolsonaro também circularam em perfis com repercussão menor.

– Por enquanto, tem muita molecada que nem faz ideia do real propósito de uma campanha hacktivista. São pessoas com o linguajar chulo, sem conhecimento político – afirma Thiago Bordini, diretor de inteligência da NewSpace.

O fato de os ataques, até o momento, não terem exigido grande capacidade técnica, não diminui seu potencial de causar problemas. Informações sensíveis do presidente e de sua família podem causar estrago caso sejam utilizados por criminosos. Há exemplos com potenciais mais destrutivos– um dos grupos acessou o sistema de exames do Hospital das Forças Armadas e vazou exames antigos do presidente Jair Bolsonaro.

— Nós temos um terreno muito fértil no Brasil porque a infraestrutura de governos e autarquias é frágil e temos hackers com capacidade técnica. Para usar uma analogia: tinha ácido nítrico de um lado, nitroglicerina do outro. Os dois já estão juntos e sabemos que, para explodir, é só dar uma chacoalhada — afirma João Lucas Melo Brasio, diretor executivo da Elytron Security, empresa especializada em detecção de vulnerabilidades críticas em sistemas.

Outro ponto que preocupa são os e-mails vazados. Muitos fazem parte de vazamentos de grande porte compartilhados nos rincões da internet, fora do alcance dos serviços de busca, na chamada deep web. Uma pesquisa realizada pela NewSpace em 2019 apontou que, por ano, são vazadas mais de 1 bilhão de credenciais (e-mails e senhas) no mundo.

– No Brasil há muita promiscuidade de dados. Para todo lado há vazamentos e a tendência é piorar – afirma o analista de inteligência Ronaldo Vasconcellos, autor de um dos principais estudos sobre a comunidade hacker no Brasil.

A dificuldade de punir os hackers contribui para estimular ações do gênero.

– É preciso investir em tecnologia e na qualificação de pessoal – diz Emerson Wendt, ex-delegado da Polícia Civil gaúcha e diretor do Departamento de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do estado.

O Globo