Sucessor de Sara Winter está a um passo do xadrez
O engenheiro eletricista Renan da Silva Sena, 57, se juntou na segunda quinzena de abril ao grupo bolsonarista autointitulado Patriotas, então acampado sob a marquise do Museu da Cidade na Praça dos Três Poderes, em Brasília.
Envolveu-se, a partir dali, em uma série de episódios que lhe renderam acusações formais de agressão ou ameaça por pessoas por ele consideradas adversárias políticas intencionadas a tirar Jair Bolsonaro da Presidência da República.
Sena entrou no foco do STF (Supremo Tribunal Federal) na semana passada por causa dos rojões lançados na direção da corte na noite do último dia 13.
Há uma suspeita de que seja dele a voz do homem que comenta a queima de fogos em gravação que circula na internet. “Supremo dos infernos”, diz o narrador.
Até meados de abril o engenheiro eletricista trabalhava como funcionário terceirizado do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, pasta comandada por Damares Alves.
Não há registros na Justiça Eleitoral de que tenha disputado alguma eleição. Nos final dos anos 1990, ele se filiou em Goiânia ao DC (Democracia Cristã), partido do sempre presidenciável José Maria Eymael. No cadastro do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) consta atualmente a condição de desfiliado.
Mas foi a partir do último 1º de maio que o país conheceu sua militância política ao tentar impedir que profissionais da saúde vestidos de jaleco branco fizessem um protesto silencioso em homenagem aos colegas que atuam na linha frente de combate ao coronavírus e pelo reforço das medidas de isolamento.
O caso rendeu a ele dez boletins de ocorrência na Polícia Civil do Distrito Federal, além de representações enviadas ao Ministério Público por entidades ligadas aos enfermeiros, incluindo o Cofen (Conselho Nacional de Enfermagem).
No relatório final enviado à Promotoria, o delegado encarregado do caso indiciou Sena por injúria, difamação e ameaça em relação a uma enfermeira, além de vias de fato contra outras duas —pena de prisão de 15 dias a 3 meses ou multa.
A polícia anotou ainda no documento que, por estar sem máscara e sem respeitar o distanciamento social, o engenheiro eletricista infringiu a determinação do poder público destinada a impedir propagação de doença contagiosa, imputando a ele suposta conduta prevista no artigo 268 do Código Penal.
A Promotoria analisará o relatório e avaliará se será o caso de denunciá-lo à Justiça.
Sena apresentou queixa contra uma estudante de medicina que passava de bicicleta na praça dos Três Poderes e defendeu o direito dos profissionais de enfermagem se fazerem se protesto. O caso dela também será avaliado pelo MP.
Outras denúncias de agressão e ameaça atribuídas a ele estão sob a análise da polícia.
A Folha tentou falar com Sena por telefone e o procurou em dois endereços residenciais que constam dos cadastros oficiais, mas ele não foi localizado.
Os desdobramentos deste episódio não impediram Sena de continuar a tocar sua militância radical no centro de Brasília.
No domingo (14), dia seguinte à queima de fogos sobre o STF, ele e outros integrantes do grupo Patriotas furaram o bloqueio imposto pelo governo do DF para a Esplanada dos Ministérios.
Tentaram novamente marcar presença na praça dos Três Poderes na frente do Palácio do Planalto, palco de manifestações em apoio ao chefe do Executivo nas últimas semanas. A Polícia Militar conteve o grupo.
O engenheiro eletricista e os demais seguiram para o QG do Exército, em outra área da cidade, onde outros apoiadores de Bolsonaro já se encontravam.
Um pouco mais tarde, Sena foi preso pela Polícia Civil após gravar e divulgar vídeo com ofensas ao governador Ibaneis Rocha (MDB). No fim de semana, além do bloqueio da Esplanada, o governo do DF promoveu uma ação para desmobilizar acampamentos.
O militante bolsonarista foi solto, mas durante a semana a DRCC (Delegacia de Repressão a Crimes Cibernéticos) o indiciou por injúria e difamação contra o governador.
Na terça-feira (17), Sena e mais umas 15 pessoas voltaram a contrariar a ordem de Ibaneis, que mandara fechar a Esplanada dos Ministérios após integrantes da inteligência do governo detectarem que remanescentes de outro grupo de extrema direita, o 300 do Brasil, liderado por Sara Giromini, conhecida com Sara Winter, fizeram ameaças ao bispo dom Marcony Vinícius Ferreira.
O grupo foi para a frente do Ministério da Educação para apoiar Abraham Weintraub. Sena gravou vídeo em apoio ao então ministro, que foi demitido na quinta-feira (18) e teve sua exoneração publicada neste sábado (20) no Diário Oficial.
“Weintraub é o único ministro de direita com valores extremamente conservadores, que luta com todas as forças pelos objetivos do nosso presidente Bolsonaro. Se Weintraub sair do governo, vai ser uma perda muito grande para nós”, disse.
E criticou os generais ministros Walter Souza Braga Netto, da Casa Civil, e Eduardo Pazuello, ministro interino da Saúde. “Pazuello e Braga Netto, pede pra sair! [sic] Vocês são pais fracassados. Comunistas são o câncer do Brasil. Vocês são assassinos! Nós vamos lutar pelo país! Não vamos virar escravos de vocês.”
Sena havia iniciado em fevereiro um período de experiência no ministério comando por Damares para o cargo de assistente-técnico administrativo.
Em meados de abril, o ministério informou à prestadora de serviços que ele não estava sendo localizado, suspeitaram que ele pudesse estar com problemas de saúde. Descobriram, após um contato que não era o caso. O contrato foi cancelado no dia 23 de abril.
No dia 28, o engenheiro eletricista postou em uma rede social foto do Congresso com faixas fixadas no gramado de “Fora Maia” e “Apoio Bolsonaro”. Uma legenda dizia que aquele era o 8º dia do acampamento Patriotas, na praça dos Três Poderes.
Folha de SP