Apoio do Centrão ao governo enfrenta teste

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Foto: Ailton de Freitas / O Globo – 01/02/2005

A análise de vetos do presidente Jair Bolsonaro a projetos recentemente aprovados pelo Congresso — o novo marco regulatório do saneamento e a prorrogação da desoneração da folha de pagamentos de empresas — deverá servir como primeira mostra da recomposição, pelo Palácio do Planalto, de uma base aliada no Legislativo. Nos últimos meses, o governo aproximou-se de partidos do centrão, aumentando seu apoio formal na Câmara e no Senado.

As duas pautas econômicas, porém, chegam ao Congresso num momento em que parlamentares relatam insatisfação com o não atendimento de demandas pelo governo. Além disso, em especial na votação do marco do saneamento, a importância do tema para governadores e prefeitos deve levar congressistas a se guiar também pela lógica regional.

Nos últimos meses, sem garantia de uma base ampla pelo governo, votações mais sensíveis têm sido postergadas. Na quarta-feira, o presidente do Congresso Nacional, Davi Alcolumbre (DEM-AP), adiou a sessão conjunta que reúne deputados e senadores. Segundo seus aliados, havia um temor de que houvesse a derrubada de diversos vetos do governo. O motivo seria a quebra de um acordo feito pelo governo com senadores depois de Bolsonaro vetar o trecho do novo marco regulatório do saneamento que permitiria a prorrogação de contratos de estatais.

No Senado, instaurou-se um clima de retaliação. Com isso, aumentou a pressão pela derrubada de outros vetos, como o que barrou a prorrogação até o fim de 2021 da desoneração da folha de pagamento de empresas e o que impediu a ampliação das categorias que recebem o auxílio emergencial. No primeiro ano do governo Bolsonaro, houve derrubada recorde de vetos.

— É importante manter os acordos e os textos conforme foram aprovados no Parlamento. Nós vamos trabalhar para derrubar os vetos — disse o líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB), ressaltando que, no caso do saneamento, houve envolvimento da liderança do governo na negociação.

Essas votações devem ser testes importantes para o governo aferir o resultado das negociações políticas empreendidas nos últimos meses, tendo como linha de frente a composição com o centrão, beneficiado com a entrega de diversos cargos de segundo e terceiro escalão.

Bolsonaro passou a fazer as concessões em função do temor de um processo de impeachment, mas o governo também tem como objetivo evitar derrotas em série no Congresso, como ocorreu em 2019.

Na Câmara, há frustração principalmente por conta de uma portaria do Ministério da Saúde publicada no início de julho, distribuindo a verba de combate ao coronavírus para municípios. Como mostrou O GLOBO, parlamentares se irritaram porque os valores não correspondiam ao que foi indicado. Eles se queixam de que, enquanto líderes conseguiram indicar aliados para postos de terceiro escalão nos últimos meses, o governo não honrou o que era mais importante para os integrantes do “baixo clero”: a liberação de verba para suas bases eleitorais.

O episódio aumentou a insatisfação com o ministro interino da Saúde, Eduardo Pazuello. Deputados pressionaram o governo nessa semana para que Bolsonaro escolha logo um novo ministro para a área.

Há reclamações entre os deputados também de que a distribuição de cargos loteados em um “consórcio” entre Republicanos, PSD, PP e PL nos últimos meses tem beneficiado apenas os expoentes das legendas. Devido ao trabalho remoto na Câmara e as medidas de distanciamento social, os líderes têm viajado a Brasília e frequentado os ministérios, enquanto integrantes do “baixo clero” permanecem nos estados e tentam, em vão, cobrar os líderes, à distância, para atenderem às demandas.

Ainda que a frustração seja maior na base do que na cúpula do Congresso, líderes do centrão tampouco tiveram todas as suas sugestões atendidas. Ainda há nomes de indicados em análise pelo governo para diretorias do Banco do Nordeste (BNB) e para a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento).

Parlamentares ouvidos pelo GLOBO também se queixam de verbas represadas pelo Ministério do Turismo, comandado por Marcelo Álvaro Antônio, do PSL. A Secretaria Nacional de Infraestrutura Turística, ocupada por um interino desde janeiro, chegou a ser negociada com o PL em maio, mas ainda não houve a troca.

Em cargos em que ocorreram mudanças recentes, como na Funasa (Fundação Nacional de Saúde), que foi para as mãos do PSD, e na Secretaria de Mobilidade do Ministério de Desenvolvimento Regional, nas mãos do Republicanos, políticos relatam melhoria na relação e mais facilidade em liberar verbas.

— Eu já estive com o novo presidente da Funasa duas vezes. Da primeira vez, ele já liberou um convênio que estava parado — conta Alexandre Baldy, secretário dos Transportes Metropolitanos de São Paulo e filiado ao PP.

Outro elogio que deputados fazem ao governo é relacionado ao pagamento de emendas. Neste ano, foi superado novamente o recorde, desde 2015, em liberação de emendas, com R$ 12,4 bilhões pagos até julho, 23% mais do que em todo o ano de 2019.

O Globo