Agentes israelenses vão a rede social tentar convencer palestinos

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Foto: Eitan Hess-Ashkenazi/AP

Conhecido como Shin Bet, o serviço de segurança interna de Israel conversa com palestinos via Facebook. Por mais estranho que isso pareça na vida real, agentes e cidadãos do outro lado do muro trocam mensagens virtuais e públicas sobre o conflito na Cisjordânia.

Chefe do Departamento de Estudos Islâmicos e do Oriente Médio da Universidade Hebraica de Jerusalém, Hillel Cohen estudou o assunto e publicou um artigo neste sábado em um dos mais prestigiados jornais de Israel, o Haaretz. O professor explica que a série de posts dos agentes busca mudar a percepção de palestinos sobre os territórios ocupados na Cisjordânia. Não se trata de campanha digital com publicações patrocinadas governamentais, tampouco memes que pregam para convertidos, tão comuns no dia a dia da polarização política brasileira.

As PsyOps — sigla para operações psicológicas — são comuns em períodos de guerra ou de conflitos duradouros, como acontece no Oriente Médio. O que difere a atual estratégia dos oficiais do Shin Bet, explica Cohen, é a tentativa de se apresentarem como parceiros que tentam ensinar, “apresentar fatos e interpretá-los, avisar sobre pessoas que cometem erros e fazer promessas”.

Ao Sonar, o professor Cohen diz que ainda é discutível o efeito prático desse tipo de operação. Ele explica que muitos palestinos se comunicam com os agentes porque buscam empregos com salários melhores em Israel — o Shin Bet é responsável por decidir quem entra e quem sai.

No artigo, o professor cita um exemplo que permite paralelo com a guerra psicológica que também é jogada por autoridades policiais brasileiras, mesmo que em um nível menos sofisticado. No último mês de junho, um policial da fronteira israelense em Jerusalém atirou e matou um palestino de 27 anos que dirigiu rapidamente em direção aos soldados. Naquele momento, conhecidos desse jovem vieram a público dizer que ele não atacaria os soldados, na verdade dirigia para buscar sua mãe e ir junto com ela ao casamento da irmã.

A discussão no Facebook estava quente, narra Cohen, e ganhou a participação de um agente do Shin Bet. Em um caso semelhante no Brasil, por exemplo, um policial envolvido em caso parecido dificilmente se manifestaria publicamente em um grupo de Facebook de vítimas. O caminho mais usual seria o do WhatsApp em outros grupos que pensam de forma parecida.

O oficial do Shin Bet escreveu: “Este não foi um ato heroico. Não é um ato de sacrifício em nome de Deus. Isto é nada mais do que um ato de suicídio. No dia do casamento da sua irmão. O suicida Ahmed Erekat”.

O plano, analisa o professor, é claro: se o jovem Erekat fosse considerado um mártir, poderiam ser feitos novos ataques e atos de protesto. Muitos palestinos responderam no post do agente do Shin Bet, com críticas à sua interpretação. Mesmo assim, o objetivo fora alcançado: estabelecer um canal. Dialogar com um representante da segurança israelense é algo muito difícil nos interrogatórios presenciais, quando palestinos sob pressão e oficiais ficam frente a frente.

Essa nova relação em curso no Facebook fica clara na forma como os agentes se apresentam em seus perfis. Em geral usam fotos surpreendentes que sugerem parcerias entre palestinos e israelenses, como iguais, com relações fraternais. Em uma das fotos usadas por eles, uma mão pintada nas cores da bandeira da palestina aperta outra com as cores da bandeira de Israel.

— O Facebook é a principal ferramenta, mas outros meios também são usados pelas Forças Armadas e o Ministério das Relações Exteriores — diz Cohen ao Sonar.

Cohen observa que, apesar de não fazer sentido com a realidade de conflitos armados constantes, a estratégia busca criar laços, com opções de telefones diretos ou Facebook Messenger disponíveis para palestinos entrarem em contato.

— A percepção é que essa estratégia não trará nenhuma mudança (no quadro geral do conflito), mas, no nível tático, pode ser efetiva. Por exemplo: pode resultar na não participação de um indivíduo em uma atividade de resistência ou pode aumentar o espaço que divide os apoiadores de Fatah e Hamas — explica Cohen ao Sonar.

O Globo