Bolsonaro faz lista acusando governadores por mortes

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Foto: Sérgio Lima/Poder360

O Palácio do Planalto elaborou um ranking vinculando o número de casos e mortes pela Covid-19 a governadores. Há um “top 5” de locais com mais “novos casos” e “novos óbitos”. Ao lado dos indicadores, vem o nome dos cinco chefes do Executivo estadual respectivos, começando por João Doria, que governa São Paulo, adversário político do presidente Jair Bolsonaro.

O documento, ao qual O GLOBO teve acesso, foi elaborado pela Secretaria de Governo (Segov) da Presidência da República usando dados do Ministério da Saúde do último sábado, dia em que o Brasil ultrapassou os 100 mil mortos pela Covid-19. Com o marco simbólico, as cobranças sobre o governo federal em relação ao combate à pandemia se intensificaram.

Repassado pelo Planalto a parlamentares da base aliada, o material causou furor nesta segunda-feira entre deputados, que chegaram a considerar inicialmente que se tratava de “fake news”. Eles viram no material uma tentativa de Bolsonaro de se eximir das responsabilidades, ao mesmo tempo em que ataca governadores e prefeitos, e discutem se farão uma manifestação pública de repúdio.

O documento traz um “top 5” dos municípios que têm mais casos confirmados da doença. A lista começa com Bruno Covas, prefeito pelo PSDB de São Paulo, com 213,5 mil diagnosticados. Covas tem criticado Bolsonaro por omissão na condução do combate à pandemia.

Curiosamente, o segundo do ranking registrado é “Brasília”, mas o nome de Ibaneis Rocha (MDB), que governa o Distrito Federal (DF) e tem se alinhado a Bolsonaro nos últimos meses, não aparece. É o único caso em que o documento omite o nome do chefe do Executivo local, apesar dos 121,8 mil casos de Covid-19 no DF.

Em terceiro do “top 5” dos municípios está Marcelo Crivella, que comanda a cidade do Rio de Janeiro pelo Republicanos, onde já houve 74,4 mil casos, aponta o documento. Antonio Carlos Magalhães Neto, prefeito de Salvador pelo DEM, fica em quarto lugar, pelo registro de 62,2 mil casos, seguido de Roberto Cláudio, que administra pelo PDT a cidade de Fortaleza, com 43,9 mil diagnosticados.

No ranking dos governadores, há o “top 5” de novos casos e de novos óbitos. Em ambos, João Doria aparece em primeiro, com São Paulo tendo registrado 13,3 mil casos novos e 281 novas mortes, de acordo com o material do Planalto, que aponta como fonte os dados do Ministério da Saúde do último sábado, dia 8 de agosto.

Doria se tornou o principal opositor de Bolsonaro no contexto da pandemia da Covid-19. Os dois discutiram em uma videoconferência em que governadores debatiam medidas contra a pandemia. Doria ameaçou ir à Justiça contra a União.

Bolsonaro chamou Doria, em uma reunião interna com seus ministros, de “bosta”. O vídeo do encontro foi divulgado por ordem judicial após denúncias do ex-ministro Sergio Moro sobre interferências do presidente na Polícia Federal.

Na lista do Planalto de “novos óbitos”, após Doria, o documento aponta Romeu Zema, governador pelo Novo de Minas Gerais, com indicação de 68 novas mortes no dia do levantamento. Depois vêm Eduardo Leite, que comanda o Rio Grande do Sul pelo PSDB, com 64 registros; Ronaldo Caiado, dirigente de Goiás pelo DEM, com 62 notificações; e o petista Rui Costa, da Bahia, que aparece com 56 novos óbitos em seu estado.

Já na lista de “novos casos”, com Doria também em primeiro lugar, outros três nomes da relação anterior se repetem, mas em ordem diferente: Eduardo Leite na segunda colocação, seguido de Rui Costa e Romeu Zema. Por fim, vem o Comandante Moisés, governador de Santa Catarina pelo PSL.

Produzido pela Secretaria Especial de Assuntos Federativos (Seaf) da Secretaria de Governo da Presidência, o documento gerou mal-estar entre os parlamentares. A tentativa de vincular, nominalmente, as mortes aos governadores não foi bem digerida por deputados.

Integrantes do DEM manifestaram, de forma reservada, incômodo com o que chamaram de ranking “infantil” e tentativa de o governo federal fugir de suas responsabilidades. Nesta semana, o Congresso pretende fazer uma espécie de homenagem aos mais de 100 mil mortos pela Covid-19. Deputados querem, na ocasião, denunciar os termos do documento que consideram “irresponsáveis”.

Um parlamentar cobrou que se colocasse “Jair Bolsonaro na frente dos 3.012.412”, referindo-se ao total de casos da Covid-19 mostrado no mesmo documento. Além dos casos, o material feito pelo Planalto traz ainda o número de óbitos: 100.477.

O documento mostra também que havia, até sábado passado, 2.094.293 pessoas recuperadas e 817.642 em recuperação no país. Os dois indicadores passaram a ser exibidos pelo governo nos últimos meses por ordem do Palácio do Planalto. Ainda conforme o material, a Covid-19 está em 5.488 municípios, ou 98,53% do total.

Abaixo da apresentação do “top 5” de novos casos, de novas mortes e do total de diagnosticados, relacionando os dados aos nomes de governadores e prefeitos, o material destaca ações do governo federal: total de leitos de UTI habilitados (11.353), respiradores distribuídos (8.923), testes rápidos (7,8 milhões) e testes PCR (5,3 milhões). Sobre esses insumos, segundo o documento, os dados são do último dia 3.

A Secretaria Especial de Assuntos Federativos (Seaf) da Secretaria de Governo da Presidência da República informou, em nota, que o documento tem como objetivo “monitorar a disseminação da Covid-19 nos Entes Federativos para auxiliar na articulação do Governo Federal”. A intenção é “contribuir internamente na gestão de curto prazo de como a pandemia está se comportando nos Estados e Municípios”, disse o órgão.

A Seaf não respondeu se a vinculação nominal de governadores e prefeitos em um ranking de mortes e casos foi feita para indicar a responsabilidade deles pelo avanço da doença. Também não comentou o descontentamento causado pelo documento entre parlamentares.

A Secretaria ressaltou, na nota, que faz parte das suas atribuições “acompanhar a situação social, econômica e política dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”; “acompanhar o desenvolvimento das ações federais no âmbito dos entes federativos”; e “gerenciar informações, promover estudos e elaborar propostas e recomendações para o aperfeiçoamento do pacto federativo”.

O Globo