Bolsonaro rompe promessa de campanha e dá dinheiro a quilombolas
Foto: Antonio Lacerda/EFE
Com o presidente recentemente convertido à moderação, a retórica agressiva foi deixada de lado. Algumas áreas do Executivo já se anteciparam e estão fechando convênios com organizações não governamentais e associações que até então vinham sendo alijadas desde o início do governo, quando Bolsonaro assinou uma medida provisória para monitorar ONGs. No último dia 5, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos assinou o repasse de 200 mil reais para o Coletivo Margarida Alves de Assessoria Popular. O objetivo é “promover formação e fortalecimento identitário de 13 comunidades quilombolas da Rede Quilombola da Região Metropolitana de Belo Horizonte (MG)”. O repasse guarda uma simbologia: o nome de Margarida Alves inspirou o MST a criar a Marcha das Margaridas, que todo ano leva milhares de mulheres para protestar em Brasília.
No dia 11, o mesmo ministério decidiu repassar 100 mil reais para o Centro de Cultura e Estudos Étnicos Anajô. O extrato do termo de fomento diz que o dinheiro é para a promoção da igualdade racial da população afrodescendente, indígena e cigana, na Serra da Barriga, em União dos Palmares, Alagoas. Essa fase do governo chama a atenção até dos próprios beneficiários dos recursos. “O presidente Bolsonaro está tentando se aproximar das ONGs, tentando se aproximar de uma forma sutil dos movimentos sociais. Eu não sei se é por causa das eleições municipais e das majoritárias que virão, ou se ele quer apagar a imagem negativa que ele tem diante da população”, diz Benedito Jorge, coordenador do Centro Anajô.
No dia 17, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, do Ministério do Turismo, liberou o repasse de 110 mil reais para o Polis Instituto. O acordo diz que “o objetivo final, para além de proteger e valorizar os territórios culturais LGBTQI+ com bens imateriais, é avançar na reflexão e construção de espaços seguros e acolhedores para todas as pessoas, especialmente aquelas discriminadas por seus marcadores sociais, como raça, gênero e sexualidade”.
A liberação de dinheiro para o terceiro setor deve ganhar mais impulso ainda. A Secretaria Especial de Articulação Social da Presidência da República vem desde o dia 30 de julho fazendo reuniões com os ministérios da Justiça, Agricultura, Cidadania, Mulher, Infraestrutura, Saúde e Educação para canalizar mais verba para o terceiro setor. As reuniões também já foram feitas com 15 parlamentares que historicamente destinam mais verbas para ONGs.
O projeto do governo é destinar mais recursos de emendas parlamentares para o terceiro setor. Anualmente, os parlamentares podem distribuir 13,5 bilhões de reais em emendas impositivas individuais e coletivas, com maior volume para a área da saúde. O governo ainda não sabe o volume de recursos de emendas que poderão ter mudança de destinatários. “Há organizações aptas a receber os recursos, parte da política pública, e há parlamentares que têm interesse em atender estas organizações, visando o cidadão na ponta. Então, é um jogo de ganha-ganha”, diz o secretário Especial de Articulação Social, Iury Revoredo.
Os parlamentares podem, por exemplo, trocar o destinatário dos recursos da emenda impositiva, muitas vezes de um município, que já foi beneficiado com outras emendas, para uma ONG específica investir, por exemplo, em um projeto de criação de peixe. “O governo consegue fazer essa aproximação, convergir interesses dos parlamentares com os interesses dos ministérios e do terceiro setor”, diz Revoredo. Os recursos do Orçamento Geral da União para o terceiro setor devem aumentar também. Revoredo afirma que o orçamento da União específico só para o terceiro setor este ano é de 611 milhões de reais, mas que no ano que vem pode chegar a 700 milhões de reais. “O objetivo de tudo isso é gerar renda”, diz o secretário.