CNMP é oposição a Aras

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Foto: ED ALVES

O Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF) tem, desde ontem, uma nova formação, e a maioria dos integrantes adota postura mais crítica em relação ao procurador-geral da República, Augusto Aras. Dos quatro integrantes que tomaram posse para o próximo biênio, somente um é alinhado ao chefe do MPF.

Foram empossados Maria Caetana Cintra Santos, José Bonifácio Borges de Andrada, Nicolao Dino e Mário Bonsaglia. Desses, somente Maria Caetana Santos, que foi reeleita, é alinhada com Aras. De acordo com um dos integrantes do Conselho, que falou com a reportagem sob a condição de anonimato, a nova equipe concorda que deve seguir uma linha independente. A intenção é se afastar de engajamento às ações com Aras e não se prender a amarras ideológicas.

Mário Bonsaglia foi o mais votado na lista tríplice da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) para presidir a PGR. O presidente Jair Bolsonaro, no entanto, ignorou os nomes sugeridos e indicou Aras como procurador-geral. Como chefe do Executivo nacional, ele tem prerrogativa para tal, mas é de costume que o presidente escolha um dos nomes da lista tríplice, no geral, o primeiro colocado. No passado, o então presidente Michel Temer não escolheu o nome com maioria de votos, mas não ignorou a lista, nomeando Raquel Dodge, que estava em segundo lugar.

Bonsaglia é um crítico de Aras. Recentemente, postou no Twitter que “o MPF vive a maior crise de sua história, em meio a uma clara tentativa de centralização hierárquica”. A publicação se deu um dia depois do bate-boca na sessão do CSMPF em que o PGR se irritou e perdeu a linha. “Princípios constitucionais fundamentais que regem o Ministério Público, como a independência funcional de seus membros, e a democracia interna, vêm sendo alvo de ataques. Mandamentos constitucionais, como a autonomia da instituição, a independência funcional de seus membros e a regra do procurador natural, objetivam a salvaguarda do próprio Estado democrático de direito, impedindo que o Ministério Público possa ser dirigido monoliticamente”, escreveu Bonsaglia.

Também crítico de Aras, Nicolao Dino já integrava o Conselho, e José Bonifácio de Andrada não é próximo ao procurador-geral. Continuam no quadro Luiza Frischeisen, José Adonis Callou de Araújo Sá e José Elaeres Marques Teixeira. Assim, além de Maria Caetana Santos, permanecem no conselho com postura favorável ao PGR Alcides Martins e o vice-procurador-geral, Humberto Jacques. Eles somam quatro votos com Aras, que tem também o voto de minerva.

Aras não participou da posse, feita por videoconferência. O curto discurso dele foi lido por Humberto Jacques. O vice-procurador e o mestre de cerimônia justificaram que o PGR não compareceu por um problema de conexão. Mas, nas outras sessões do conselho realizadas da mesma forma, ele presidiu da sede do órgão, onde estava Jacques. A assessoria de imprensa informou que Aras não estava na PGR no momento da sessão e participaria a distância. A ausência do PGR foi vista com estranhamento por subprocuradores.

No discurso lido por Jacques, Aras afirmou que “podemos ter opiniões que ora convergem, ora divergem, mas não menosprezamos o caráter uno do Ministério Público brasileiro”. “A desavença, diferentemente da discordância, serve apenas para o enfraquecimento da carreira e da instituição. Somos uma família que compartilha da mesma missão, submetidos à mesma Constituição Federal”, enfatizou.

“Assim, pela impessoalidade dos atos e pela unidade do nosso corpo institucional, queremos fortalecer o Ministério Público, redefinir rumos, para que sejamos mais eficazes, transparentes e coesos em prol da segurança jurídica que foi traçada nos artigos 127 e 129 da Constituição Federal, combinados com o artigo 37, dos quais extraímos os princípios concorrentes da unidade, indivisibilidade e independência funcional”, pontuou.

Segundo Aras, por esses princípios será possível “alçar uma instituição lúcida, dinâmica, transparente e indutora de políticas públicas que tragam futuro promissor à nação brasileira”. “As reverberações deste Conselho continuaram a ser sopesadas por um grupo seleto de subprocuradores-gerais da República, que compreendem a ampla dimensão dos seus atos, que exige capacidade de planejamento, antecipação das consequências das suas decisões”, emendou.

A novela relacionada ao compartilhamento dos dados produzidos pela Lava-Jato ganhou outro capítulo ontem. O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), manteve veto ao repasse de informações dos seis anos de diligências da força-tarefa para a PGR. O procurador-geral da República, Augusto Aras, solicitou o acesso, alegando que existem indícios de que autoridades com foro por prerrogativa de função estavam sendo investigadas pelos procuradores que atuam em Curitiba.

O compartilhamento de dados tinha sido autorizado pelo ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo, durante o recesso do Judiciário. Ao retornar ao trabalho, Fachin reformou a decisão do colega. Ao analisar novo recurso da PGR, negou outra vez a solicitação. “Recebo o recurso interposto pela Procuradoria-Geral da República. Nos termos do art. 317, § 2º, do RISTF, mantenho a decisão agravada, diante da pacífica jurisprudência da Corte quanto à não transcendência dos motivos de determinantes e pelos demais fundamentos nela declinados, os quais se mantêm de modo hígido mesmo diante das razões recursais”, escreveu.

No despacho, Fachin concedeu prazo de cinco dias para que procuradores nos três estados envolvidos se manifestem sobre o recurso da PGR e destacou que levará o caso para o plenário.

A polêmica começou após a subprocuradora Lindora Araújo, braço direito de Aras, ir a Curitiba e solicitar acesso ao banco de dados. O pedido, no fim de junho, foi negado pelos integrantes da força-tarefa, o que gerou indignação do PGR. As informações, que se referem a 350 terabytes de arquivos, já estão parcialmente em poder da Procuradoria.

O Conselho é o órgão máximo dentro do MPF, ao qual cabe elaborar normas de concursos, determinar a realização de sindicâncias e os critérios para distribuição de inquéritos. Como PGR, Aras o preside e tem o vice-procurador, Humberto Jacques, também como membro nato. Os outros são eleitos para mandatos de dois anos.

Na sessão do Conselho, Nicolao Dino leu uma carta assinada por ele e outros três colegas com crítica a Aras pelos ataques à Lava-Jato. Em uma transmissão ao vivo com advogados, em 28 de julho, o PGR atacou a força-tarefa e disse que “é hora de corrigir os rumos para que lavajatismo não perdure”. O procurador afirmou que a operação era como uma “caixa de segredos” e que ia atuar para acabar com o “punitivismo” no MP. A reunião foi marcada pelo bate-boca e terminou com Aras se levantando em meio a protesto de membros do conselho, que pediam para falar. Depois do embate, em reunião na semana passada, Aras adotou um tom conciliador.

A 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal (5CCR/MPF) defendeu, ontem, que o órgão não faça adesão ao acordo de cooperação que define novas regras para a oficialização de acordos de leniência com empresas acusadas de corrupção. As alterações foram assinadas, na semana passada, pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, e pelo governo, sem a presença do chefe do Ministério Público, Augusto Aras. Na prática, o acordo abre margem para que o Ministério Público seja deixado de fora das negociações dos pactos de leniência em todo o país.

Em nota técnica, a 5ª Câmara afirmou que “o MPF não deve aderir ao Acordo de Cooperação Técnica sobre Leniência firmado na última semana pela Advocacia-Geral da União (AGU), Controladoria-Geral da União (CGU), Tribunal de Contas da União (TCU) e Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), com participação do Supremo Tribunal Federal (STF)”.

No texto, a equipe técnica diz que “o acordo celebrado não contribui para uma cooperação interinstitucional sistemática em matéria de leniência. Ao contrário, esvazia a atuação de diversos órgãos — dentre eles o próprio MPF — indispensáveis para uma atuação conjunta eficiente, em prejuízo da segurança jurídica da colaboração”.

O parecer será enviado ao procurador-geral da República, Augusto Aras, que decidirá se assina ou não o contrato. Durante o evento de oficialização do ato, Toffoli chegou a dizer que não haveria exclusão do MP das negociações. “O acordo de cooperação sobre acordos de leniência não cria nem retira competências, pois estas decorrem da Constituição e das leis”, argumentou, na ocasião.

Os integrantes da 5ª Câmara ressaltaram, ainda, que o acordo assinado não encontra respaldo na Constituição e “limita inconstitucionalmente a atuação cível do MPF no enfrentamento da corrupção, reduzindo a abrangência da missão outorgada pela Constituição na proteção do patrimônio público e social (artigo 129, inciso III da CF)”. “Isso porque, conforme os termos propostos, a atuação do MPF ficaria reservada à investigação criminal de pessoas físicas, enquanto a legitimidade para a responsabilização de pessoas jurídicas envolvidas em corrupção, incluindo a negociação e celebração de acordos de leniência, caberia à AGU e à CGU.” (RS)

Correio Braziliense