Apoio de Bolsonaro prejudica candidaturas

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Foto: Edilson Dantas/Agência O Globo

Sem produzir crescimento de candidaturas nas pesquisas eleitorais, a estratégia de alinhamento ao presidente Jair Bolsonaro passa a ser revista por campanhas a prefeituras de capitais. Enquanto o prefeito do Rio, Marcelo Crivella (Republicanos), dobrou a aposta no apoio de Bolsonaro, seu colega de partido Celso Russomanno, candidato em São Paulo, se descolou da retórica antivacina do presidente um dia depois de ser ultrapassado numericamente pelo atual prefeito, Bruno Covas (PSDB).

Para especialistas, o aumento da rejeição a lideranças políticas e também da “desorganização partidária”, combinados ao cálculo do próprio Bolsonaro para evitar perda de popularidade, tendem a afastar o presidente da campanha municipal. Em Belo Horizonte, onde Bolsonaro gravou um vídeo em apoio a Bruno Engler (PRTB) há duas semanas, o atual prefeito Alexandre Kalil (PSD) caminha para uma reeleição em primeiro turno, segundo o Datafolha. Em Recife, a candidata Delegada Patrícia (Podemos), que tenta se viabilizar como alternativa à direita, cresceu seis pontos na pesquisa desta semana evitando se associar a Bolsonaro.

Em entrevista à rádio Eldorado na manhã de ontem, Russomanno fez um gesto conciliador ao governador de São Paulo, João Doria (PSDB), e afirmou que, se eleito, faria convênio com o Instituto Butantan para a compra da vacina produzida em parceria com o laboratório chinês Sinovac Biotech, a Coronavac, contra Covid-19. Na quarta-feira, Bolsonaro afirmou que não comprará a Coronavac mesmo se houver autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a chamou de “vacina chinesa de João Doria”, seu desafeto político.

— Se for aprovada pela Anvisa, sem problema nenhum. Sou totalmente favorável à vacina. Quero que ela fique pronta e quero tomar a vacina também — disse Russomanno.

O candidato do Republicanos vinha intensificando nas últimas semanas sua adesão às pautas defendidas pelo presidente. Russomanno chegou a minimizar a pandemia do coronavírus em entrevistas e sugeriu que moradores de rua teriam mais resistência ao vírus por não tomarem banho, gafe semelhante à cometida por Bolsonaro, em março, ao dizer que “brasileiro cai no esgoto e não pega nada”. Pesquisa Datafolha divulgada na quinta-feira apontou queda de sete pontos percentuais para Russomanno, que agora aparece com 20%, numericamente atrás de Covas, com 23%. No fim de setembro, o Datafolha apontou que 46% dos paulistanos rejeitam o presidente.

Ainda ontem, Russomanno declarou à revista “Veja” concordar com Bolsonaro “em algumas coisas”, e disse ter “opinião própria” em outras. O distanciamento em relação ao presidente difere da postura de Crivella no Rio, que mantém o alinhamento mesmo patinando nas pesquisas. Em relação ao levantamento anterior do Datafolha, Crivella oscilou um ponto para baixo e agora está com 13%, numericamente empatado com Martha Rocha (PDT) na segunda colocação.

Repetindo discurso adotado por Bolsonaro na eleição de 2018, a campanha de Crivella tem buscado desacreditar as pesquisas e entrou com impugnações no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-RJ) para impedir a divulgação do Datafolha anteontem e do Ibope de semana passada. A defesa do prefeito alegou inconsistências na base estatística. Ambos os pedidos foram negados pela juíza Regina Chuquer, da 23ª Zona Eleitoral. Aliados de Crivella defendem que a imagem de Bolsonaro continue sendo amplamente explorada no horário eleitoral e contam com uma declaração explícita de voto do presidente na reta final.

Para o cientista político Josué Medeiros, do Núcleo de Estudos Sobre a Democracia Brasileira (Nudeb) da UFRJ, uma “mobilização subterrânea” do bolsonarismo nas redes a exemplo de 2018 não pode ser descartada, mas um impacto do próprio Bolsonaro no primeiro turno é improvável.

— Bolsonaro tenta fugir da lógica habitual de palanques locais, o que exigiu alianças amplas de presidentes no passado para eleger prefeitos, como fez Lula com o MDB no Rio. Ele faz um cálculo político, prefere que os candidatos briguem pelo apoio dele — afirmou.

Para Cristiano Noronha, da Arko Advice Pesquisas, a avaliação das gestões locais vem norteando o voto em capitais.

— O apoio do Bolsonaro poderia ajudar na consolidação de uma candidatura, mas não como causa primeira que levaria o eleitor a votar — avaliou.

O Globo