Indicado ao STF é contra prisão automática em 2a instância

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Foto: Reprodução

O desembargador Kassio Marques, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para a vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), escreveu em uma decisão judicial que a prisão após condenação em segunda instância não deve ser “automática” e precisa ser analisada caso a caso. A afirmação foi feita em um despacho no qual ele concedeu liberdade a um ex-prefeito do interior do Amazonas condenado a 57 anos de prisão por corrupção e outros crimes.

“Ressalto que, ao meu sentir, nem mesmo a decretação de prisão após o julgamento da causa em segundo grau de jurisdição resulta na automática e compulsória prisão do requerido, porque, mesmo nessa hipótese, é necessário que seja fundamentada e justificada, caso a caso, a imposição do comando de prisão”, escreveu na decisão, de dezembro de 2018.

A indicação de Marques ao STF tem o apoio de políticos do Centrão, que são alvos de investigações da Lava-Jato, e de uma ala do Supremo que é crítica à operação, capitaneada pelos ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli. A nomeação ainda precisa ser aprovada pelo Senado.

Na decisão, proferida durante um plantão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), Marques adiantou sua posição a respeito do tema da prisão em segunda instância, que divide o STF e passou por dois julgamentos recentes. O caso envolvia o ex-prefeito de Coari Adail Pinheiro, condenado em dezembro de 2018s sob acusação de participar de um esquema de fraude em licitações na prefeitura e desvio de recursos públicos de convênios federais e de royalties pagos pela Petrobras, em decorrência da exploração de gás e petróleo no município. Em uma busca e apreensão, a Polícia Federal chegou a encontrar R$ 7 milhões em um imóvel da prefeitura. Em um caso anterior, Adail Pinheiro também foi condenado por pedofilia e chegou a cumprir pena.

Após a condenação do caso de corrupção, a Justiça Federal de primeira instância decretou sua prisão preventiva, por causa da gravidade dos crimes cometidos e dos indícios encontrados na investigação.

A defesa apresentou um habeas corpus ao TRF-1 e, em regime de plantão, Kássio Marques acolheu o pedido e determinou a “imediata soltura”, sob argumento de que não havia elementos novos para a prisão.

“No caso em exame, observo que a sentença, ao referir as razões de fato e de direito que justificariam o decreto de prisão preventiva do paciente, que respondera em liberdade todo o processo, em essência, remete à gravidade dos mesmos fatos típicos que levaram à conclusão condenatória, bem como à conduta delituosa apresentada pelo réu: reiteração da conduta que revela o descaso com as coisas públicas; a apreensão com o grupo que o paciente integrava, em maio de 2008, de mais de R$ 7.000.000,00 (sete milhões de reais). Contudo, não identifiquei o registro de nenhum fato que houvesse, objetivamente, alterado a conduta exercida pelo paciente antes da prolação da sentença e após esse momento”, escreveu Marques em sua decisão, de cinco páginas.

Prosseguiu o desembargador em sua decisão: “Registra a sentença, ainda, que há notícias de que o paciente estaria ameaçando testemunhas, que as medidas cautelares diversas da prisão seriam ineficientes, e que a conduta do paciente estaria provocando perturbação social na sociedade local. Contudo, no exame ora realizado, não identifiquei na sentença elementos fáticos, ou mesmo indícios, que atestassem esses fatos. Note-se que, conquanto seja legal o decreto de prisão preventiva no ato de prolação da sentença, é necessário que estejam indicadas as circunstâncias fáticas constante no art. 312 do Código de Processo Penal, o que ao meu sentir não foi suprido pela sentença”.

Na decisão, o próprio desembargador cita uma entrevista que ele havia dado ao site Conjur na qual também falou sobre o tema da prisão em segunda instância. Ao ser questionado se era possível decretar prisão em segunda instância, Kássio afirmou:

— O que o Supremo disse, na minha interpretação, foi o que você asseverou na sua pergunta. É possível? Sim! Não é necessário aguardar o trânsito em julgado para a decretação da prisão. Ao meu sentir, o Supremo autorizou que os tribunais assim procedam, mas não os compeliu a assim proceder. O recolhimento ao cárcere não é um consectário lógico que prescinda de decisão fundamentada e análise das circunstâncias de cada caso. Há a necessidade de a ordem ser, além de expressa, fundamentada. Diante das circunstâncias do caso concreto, os julgadores podem adotar ou não a medida constritiva de liberdade. Podem entender que não seria o caso de recolhimento em um determinado caso, mas não de forma discricionária, e muito menos automática e jamais não revestida da devida fundamentação.

A decisão liminar concedida por Kássio Marques foi, posteriormente, confirmada pela Quarta Turma do TRF-1, que manteve a soltura de Adail Pinheiro. A Turma, entretanto, teve posicionamento mais rígido do que Kássio Marques e decidiu impor três medidas cautelares contra o ex-prefeito: proibição de manter contato com testemunhas, comparecimento mensal em juízo e proibição de ausentar-se da comarca sem autorização judicial.

O Globo