OAB diz que nova Constituição seria ataque à democracia
Foto: Reprodução
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) emitiu um parecer nesta quarta-feira (28) no qual afirmou que um eventual plebiscito a fim de se discutir a elaboração de uma nova Constituição no Brasil seria “ruptura da ordem constitucional” e “agressão” à democracia.
Na segunda (26), o líder do governo na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros (Progressistas-PR), atacou a Constituição de 1988, disse que o Brasil está em situação ingovernável e que deveria seguir o exemplo do Chile e convocar uma assembleia constituinte para escrever uma nova Constituição. A fala foi criticada por juristas e políticos.
“Eu pessoalmente defendo uma nova assembleia nacional constituinte. Acho que devemos fazer um plebiscito, como fez o Chile, para que possamos refazer a carta magna e escrever muitas vezes nela a palavra ‘deveres’, porque a nossa carta só tem direitos e é preciso que o cidadão tenha deveres com a nação”, afirmou Barros na ocasião.
No parecer divulgado nesta quarta-feira, a OAB afirmou:
“A Ordem dos Advogados do Brasil, honrando sua história de luta pela democracia e sua participação no processo de redemocratização do país, vem, por meio do presente parecer, manifestar sua contrariedade à proposta de realização de um plebiscito para a elaboração de uma nova Constituição, por constituir uma ruptura da ordem constitucional e uma agressão à democracia, posicionando-se em defesa da lealdade à Constituição de 1988 e do fortalecimento do seu projeto democrático”.
No parecer, a OAB afirma que uma eventual nova assembleia constituinte significa a “sentença de morte da ordem constitucional em vigor”.
A Ordem dos Advogados afirma ainda que não há “substrato histórico, jurídico, político ou social” para “se afastar a Constituição de 1988 no atual contexto brasileiro”.
“A defesa da democracia brasileira passa, invariavelmente, pela defesa da ordem constitucional em vigor. Contrariar tal premissa significa colocar a democracia em risco”, acrescenta a OAB.
O documento é assinado por Felipe Santa Cruz (presidente da OAB); Marcus Vinícius Furtado Coêlho (presidente da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais); e Nabor Bulhões (presidente da Comissão Nacional de Defesa da República e da Democracia).
O documento elaborado pela OAB diz ainda que a tese de que o Brasil precisa de nova Constituição é “descabida” e “desconectada” da história.
Segundo o parecer, a ideia pode abrir “espaço para retrocessos e oportunismos autoritários” e criar “instabilidade e riscos à democracia”.
“A tese de que o Brasil precisa de uma nova Constituição mostra-se inteiramente descabida e desconectada da nossa história constitucional e das reais necessidades do país no momento. Não há paralelo possível com o recente plebiscito realizado no Chile que sirva de sustentação a tal proposta esdrúxula, considerando a radical diferença de contexto entre os dois países”, diz a Ordem.
“Além de inútil para enfrentar os problemas que assolam o Brasil, a ideia de mudança da Constituição apenas abriria espaço para retrocessos e oportunismos autoritários, criando instabilidade e riscos à democracia que, com todas as dificuldades, cultivamos nos últimos 32 anos, acrescenta a OAB.
O texto aponta ainda a diferença entre a realidade brasileira e a situação do Chile, citada por Ricardo Barros.
“Esse processo histórico que deu origem à Constituição de 1988 distingue por completo a situação brasileira daquela hoje atravessada pelo Chile, que busca, por um processo constituinte, superar a Constituição de 1980 herdada da ditadura de Pinochet”, afirma.
Também critica a proposta de nova constituinte sob “justificativa de pretensa ingovernabilidade”.
“Pleitear uma nova constituinte sob a justificativa de pretensa ingovernabilidade ou inadequação do texto constitucional mostra-se como um argumento falacioso, descolado da realidade observável no país. O que se depreende da história constitucional brasileira na tão jovem democracia surgida em 1988 é, ao contrário, a constante adaptação do texto constitucional […] antes sua imensa capacidade de responder de movo positivo às adversidades naturais oriundas de uma sociedade em constante transformação”.
Ainda no documento, a OAB diz que o plebiscito é uma via inadequada para discutir o tema.
“Em nossa ordem constitucional, o plebiscito constitui um instrumento de democracia direta enquanto via de participação popular nos negócios públicos. Não deve tal mecanismo ser desvirtuado para servir de facilitador a uma tentativa de mudança inconstitucional da Constituição, uma vez que não segue os procedimentos nela previstos, nem se encontram colocadas as condições para exercício do poder constituinte originário em ruptura com a ordem atual”, diz a OAB.
O parecer trata ainda sobre a proposta de enxugamento do texto constitucional. Na avaliação da OAB, isso representa “uma armadilha perigosa”.
“Em um contexto de intensa polarização política e de emergência de radicalismos, tal como se vive no Brasil, a substituição da Constituição representa uma armadilha perigosa. Todas as conquistas e avanços obtidos sob a Constituição de 1988 ficariam vulneráveis à atuação de grupos ou setores com interesses particularistas e não republicanos”, conclui a OAB.