PGR alivia para deputado do Centrão

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Foto: Gil Ferreira/Agência CNJ

O recuo da Procuradoria-Geral da República (PGR) em uma denúncia apresentada contra o deputado federal Arthur Lira (PP-AL) pode ter impacto em outras ações da Lava-Jato contra políticos. Na última semana, a PGR voltou atrás e passou a apontar “fragilidade” das provas utilizadas por ela própria na denúncia oferecida três meses antes à Justiça. Na avaliação de investigadores do Ministério Público, o recuo pode beneficiar outros políticos investigados, cujas defesas usarão a nova posição da PGR como argumento em casos semelhantes. Lira é aliado do presidente Jair Bolsonaro e um dos principais líderes do centrão no Congresso.

De acordo com fontes ouvidas pelo GLOBO, a denúncia contra Lira seguiu o modelo de diversos outros casos da Lava-Jato, com o uso de elementos de corroboração que complementam os relatos de delatores. Isso inclui planilhas internas de registros de pagamento de propina, deslocamento dos entregadores de dinheiro e depoimentos diversos.

No caso de Lira, a subprocuradora-geral da República Lindôra Araújo, coordenadora da Lava-Jato na PGR, havia escrito há três meses que “resta provado, para muito além das palavras dos colaboradores”, o pagamento de R$ 1,6 milhão ao parlamentar. Agora, escreveu que há “fragilidade probatória”.

A investigação surgiu a partir da delação premiada do doleiro Alberto Youssef, que relatou ter operado o pagamento de propina ao parlamentar por parte da empresa Queiroz Galvão. O doleiro contou que a empreiteira pagou R$ 1,6 milhão a uma empresa de fachada indicada por ele e depois realizou uma engenharia financeira para entregar os valores em dinheiro vivo ao deputado.

“Não se recorda com exatidão a quem foi entregue o dinheiro em Brasília, mas afirma que com certeza foi a um assessor do líder do PP, Arthur Lira”, disse Youssef.

Os investigadores apreenderam uma planilha em posse de um funcionário de Youssef, Rafael Ângulo, que registrava pagamentos de propina para o PP. Constavam no documento pagamentos em 16 e 17 de maio de 2012 efetuados em Brasília, com a anotação “dinheiro foi para BSB destinado a políticos do PP/Liderança”. Lira era o líder do PP na Câmara na época. A investigação confirmou que um entregador de dinheiro de Youssef esteve em Brasília nesses dias e foi a um prédio de apartamentos funcionais da Câmara dos Deputados.

Lindôra, entretanto, passou a considerar essas provas insuficientes. Na avaliação de investigadores, o argumento da PGR será usado por advogados em outros casos da Lava-Jato que utilizam provas semelhantes para corroborar pagamentos a políticos, já que a sistemática é semelhante à de outras investigações.

Nas delações premiadas dos executivos da Odebrecht, por exemplo, as investigações se baseiam em uma contabilidade interna dos pagamentos de propina, com codinomes atribuídos a políticos e deslocamentos de entregadores do dinheiro. Essa nova avaliação da PGR esvaziaria esses casos, comuns nas investigações sobre corrupção.

Os procuradores também apontam que o novo entendimento da PGR se alinha com a posição de alguns ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que têm relativizado o peso de provas de corroboração apresentadas nas investigações. Na Segunda Turma do STF, que julga casos da Lava-Jato, os ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski têm dado votos mais favoráveis às defesas na maioria dos casos, divergindo sistematicamente dos ministros Edson Fachin e Cármen Lúcia.

Fachin e Cármen têm ficado vencidos em diversos casos nos quais consideram haver provas suficientes. Um dos exemplos citados por investigadores é quando a Segunda Turma rejeitou, em dezembro de 2017, uma denúncia contra o deputado Dudu da Fonte (PP-PE) sob acusação de pagamento de R$ 10 milhões da Queiroz Galvão em troca de enterrar uma CPI da Petrobras. Os votos pela rejeição foram de Dias Toffoli e Gilmar. Fachin ficou vencido.

Toffoli e Mendes entenderam que a denúncia se baseava apenas em delações premiadas. Mas a acusação continha até mesmo a gravação de uma reunião entre Dudu da Fonte, o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e empreiteiros em que negociam benefícios à empreiteira na CPI.

O recuo na denúncia foi considerado “inédito” nos bastidores do MPF e visto internamente como uma tentativa do procurador-geral da República, Augusto Aras, de angariar apoio político para uma indicação ao cargo de ministro do STF.

Procurada, a PGR afirmou que a manifestação pedindo rejeição da denúncia seguiu critérios técnicos porque a defesa do parlamentar demonstrou que ele não tinha relação com os fatos relatados. Disse ainda que não houve proteção a Arthur Lira e que a função do Ministério Público é o “respeito à Justiça” e evitar a continuidade de um processo que considere inviável.

O Globo