Governo diz que privatização da Eletrobras busca “reduzir tarifas”
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A privatização da Eletrobras tem como objetivo principal permitir a redução das tarifas das contas de luz e não o “aspecto arrecadatório”, afirmou o secretário de Energia do Ministério de Minas e Energia, Rodrigo Limp, em entrevista ao G1.
Na última terça-feira (23), o presidente Jair Bolsonaro entregou ao Congresso a medida provisória que busca acelerar a privatização da estatal. Antes, Bolsonaro causou quedas expressivas nas ações da Petrobras e da Eletrobras ao sugerir e anunciar interferência no comando das duas estatais. No caso da Eletrobras, disse que o governo ia “meter o dedo na energia elétrica, que é outro problema também”, sem esclarecer o que faria.
De acordo com Rodrigo Limp, a redução de tarifas será resultado de mudanças provocadas pela MP e pela troca de comando da Eletrobras após a privatização. Segundo ele, essas mudanças incluem aumento da eficiência e alteração no regime de contrato de parte das hidrelétricas da empresa.
Também prevê o pagamento de um bônus para reduzir tarifas. O texto da MP estabelece que, ao ser privatizada, a Eletrobras fará o pagamento de um valor ao governo, estimado atualmente em R$ 50 bilhões. E que metade — ou seja, cerca de R$ 25 bilhões — será destinada a abater encargos que encarecem as contas de luz, enquanto a outra metade irá para o Tesouro.
A parte destinada ao Tesouro, que reforçaria o caixa do governo em um momento de alta do endividamento provocada pelo enfrentamento à pandemia, seria paga de uma só vez. Esses R$ 25 bilhões superam o orçamento previsto para a Educação neste ano (R$ 19,9 bilhões).
Já o valor para baratear as tarifas será pago ao longo de 30 anos, dividido em parcelas anuais a serem depositadas na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), fundo que financia ações do governo no setor elétrico e que custa aos consumidores cerca de R$ 20 bilhões ao ano.
“É claro que a gente considera o aspecto fiscal do país, mas de forma alguma esse projeto tem um aspecto arrecadatório. Eu diria que o principal do projeto é trazer benefícios para os consumidores de energia elétrica”, afirmou Limp.
Ele argumenta que os dois projetos anteriores sobre a privatização da Eletrobras, enviados ao Congresso em 2017, pelo governo Michel Temer, e em 2019, por Bolsonaro, previam que uma parcela menor do valor do bônus seria usada na redução de tarifas.
“Agora nós aumentamos a participação que vai para reduzir tarifa dos consumidores, justamente com esse viés, de ter um foco mais no consumidor”, disse.
A medida provisória prevê uma mudança no regime contratual de parte das hidrelétricas da Eletrobras. As usinas sairão do regime de cotas, em que o preço da energia é mais baixo e fixado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), e passarão para o regime de produção independente, em que a empresa vai ter liberdade para negociar o preço.
Em contrapartida, o governo vai estabelecer um “valor adicionado de outorga” que deverá ser pago pela Eletrobras. Trata-se do valor estimado em R$ 50 bilhões que será dividido entre o Tesouro e o fundo CDE.
O regime de cotas foi criado em 2013 por lei sancionada pela então presidente Dilma Rousseff e que promoveu redução nas tarifas de energia.
Concessionárias que aderiram tiveram as concessões de suas hidrelétricas renovadas. Em troca, aceitaram receber um valor mais baixo pela energia produzida, fixado pela Aneel, e que hoje está em R$ 114,74 por megawatt-hora (MWh).
Entretanto, o regime de cotas também estabelece que o chamado “risco hidrológico” — ou seja, o risco de uma usina não conseguir gerar a energia que vendeu seria dos consumidores.
Isso significa que os consumidores têm que pagar, por meio de encargos nas contas de luz como o da bandeira tarifária, pela compra de energia que cobre o buraco deixado pelas hidrelétricas do regime de cotas. Nos últimos anos, isso tem levado a pesados aumentos nas contas de luz já que o baixo nível dos reservatórios das hidrelétricas exige que essa eletricidade reserva venha de termelétricas, que geram energia mais cara.
Ao sair do regime de cotas, esse risco passa a ser da nova Eletrobras, o que, na visão do governo, também vai contribuir para a redução das tarifas.
Porém, segundo a MP, a saída da Eletrobras do regime de cotas será gradual, num período de três a dez anos.
“São alguns fatores que levam a esse benefício para os consumidores [com a privatização da Eletrobras]. Temos a questão do risco hidrológico que deixa de ser alocado no consumidor, que penalizou muito os consumidores cativos nos últimos anos. Temos o aporte na CDE, que reduz encargos pagos por todos os consumidores do Brasil. E temos também a expectativa de aumento de competitividade do setor porque teremos uma empresa do porte da Eletrobras atuando de forma competitiva no mercado, com capacidade de investimento”, disse Limp.
Em 2017, após o governo Temer divulgar sua proposta para a privatização da Eletrobras, a Aneel produziu um relatório em que afirmava que a saída das hidrelétricas do regime de cotas iria gerar um “efeito perverso sobre o custo de energia suportado” pelos consumidores, ou seja, aumento nas contas de luz.
O ex-diretor da Aneel Tiago Correia avalia que a troca de regimes pode levar a efeito contrário do previsto pelo governo.
“A Eletrobras vai poder vender energia mais cara e só metade do valor do adicional vai para a modicidade tarifária. Então, a gente pode esperar impacto tarifário”, disse ele.
Ex-presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), ligada ao Ministério de Minas e Energia, e atual presidente da consultoria PSR, Luiz Barroso defende a saída da Eletrobras do regime de cotas e avalia que isso será benéfico para o consumidor.
“A oportunidade de equacionar estes itens [risco hidrológico], quando somada ao aporte de 50% da outorga na CDE, pode sim provocar redução tarifária ao consumidor”, disse.
O professor aposentado e ex-diretor da Aneel Edvaldo Santana também avalia que a retirada das usinas do sistema de cotas “é a principal saída” para reduzir a pressão sobre as tarifas de energia gerada pela redução no nível dos reservatórios das hidrelétricas.
“Como vai descotizar e a nova venda da energia da Eletrobras vai ser num ambiente livre, em leilão, no curto prazo isso vai ser só vantagem para o consumidor”, disse.
O governo federal entregou na terça-feira (23) ao Congresso Nacional uma medida provisória que busca acelerar a privatização da Eletrobras. O texto prevê que o governo mantenha poder de veto sobre decisões da estatal por meio de ações preferenciais (golden shares).
Como a MP tem vigência imediata, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) poderá iniciar os estudos para a privatização da estatal.
A privatização da Eletrobras é uma das prioridades da equipe de Paulo Guedes. Atualmente, a União tem mais de 60% das ações da empresa.
O texto da medida provisória afirma que a capitalização só pode começar quando a MP for aprovada pelo Congresso e convertida em lei. Nesse prazo, no entanto, o BNDES já poderá elaborar os estudos.
A previsão é de que a capitalização propriamente dita – ou seja, a redução da participação da União – ocorra daqui a um ano.
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