Gilmar e Fachin votam contra ataque a Toffoli
Foto: Carlos Margno / Imprensa RJ
O Supremo Tribunal Federal começou nesta sexta, 21, o julgamento de recurso da Procuradoria-Geral da República contra a homologação da delação premiada do ex-governador do Rio Sérgio Cabral. O ex-dirigente fluminense dedicou anexos da colaboração para tratar de fatos envolvendo um dos ministros da corte, Dias Toffoli, que nega irregularidades. Até o momento, o relator, Edson Fachin, e o ministro Gilmar Mendes, votaram para tornar sem efeito a homologação da delação de Cabral. Já o ministro Luís Roberto Barroso se manifestou contra o pedido da PGR.
O caso é analisado no plenário virtual do STF, sendo que o julgamento tem previsão para acabar somente na próxima sexta, 28 – caso não haja pedido de vista ou destaque, o que pode levar a discussão para uma sessão do plenário por videoconferência. O julgamento já estava marcado quando Fachin negou pedido da Polícia Federal para investigar o colega de Corte, com base na colaboração de Sérgio Cabral.
Em parecer enviado à corte na semana passada, o vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, reiterou o pedido para que o STF volte atrás na homologação do político, defendendo que as informações prestadas sejam declaradas ‘inidôneas’. O vice-procurador disse que Cabral ‘age com má fé’ e que o ex-governador apresentou apenas fatos já conhecidos e sem elementos mínimos de prova capazes de justificar a abertura de novos inquéritos.
Fachin vê espaço para revisitar a tese sobre delações e polícia
O voto que Fachin apresentou nesta sexta, 21, apresenta dois posicionamentos, na verdade. O relator defende o acolhimento do pedido da PGR, para que a decisão homologatória da delação de Cabral seja tonada se efeito, por considerar que ‘se o Ministério Público não reputou suficientemente relevantes e inéditas as informações que seriam fornecidas pelo colaborador, não cabe a ele buscar a celebração de acordo com órgão diverso’. A delação de Cabral já havia sido rejeitada pela força-tarefa da Lava Jato fluminense.
Fachin sinalizou que ao homologar a decisão de Cabral, seguiu a orientação majoritária do Supremo, citando julgamento em que a corte decidiu que delegados de polícia podem fechar acordos de colaboração premiada, sem aval obrigatório do Ministério Público Federal. Em tal julgamento, o posicionamento do ministro sobre a ilegitimidade da autoridade policial celebrar acordos de colaboração premiada restou isolado. Fachin decidiu retomar o argumento por considerar que o recurso da PGR seria ‘campo é o de revisita à tese’.
Nessa linha, o relator ponderou: “O acordo em âmbito policial não pode se transformar numa nova oportunidade para que o candidato a colaborador, cujos elementos de convicção de que dispunha tenham sido considerados insuficientes por um agente estatal, possa submeter sua proposta a uma segunda análise. Deve o Estado-Acusação manifestar-se a uma só voz”.
Por outro lado, Fachin registrou que, caso o mérito do caso seja analisado, seu posicionamento seria por negar o recurso da PGR, ‘em respeito à colegialidade’.
Gilmar defende delação de Cabral é ‘imprestável’
O voto do relator foi acompanhado por Gilmar Mendes, mas somente em parte. O ministro também se posicionou para que a delação de Cabral seja declarada sem efeito, mas que se firmar tese sobre a legitimidade da autoridade policial para celebrar acordo de colaboração premiada. Já no mérito, ao contrário de Fachin, Gilmar quer a reforma da decisão que homologou a delação do ex-governador do Rio. Segundo o ministro, acordo ‘não atende aos padrões mínimos de legalidade e não se vislumbra, na sua celebração, a existência de interesse público’.
“O resultado desse processo mostra que as narrativas do colaborador e o seu acordo em si revelaram-se absolutamente imprestáveis para a persecução criminal. As estratégias do colaborador voltadas ao constrangimento dos órgãos de persecução criminal e deste próprio Tribunal tinham como finalidade não a elucidação da verdade material, mas sim a profusão de narrativas falsas como combustível da sua aventura em busca de liberdade a qualquer custo”.
Em seu voto, Gilmar chamou atenção para uma cláusula do acordo de colaboração que permitiu ao ex-governador ir apresentando informações a ‘conta gotas’. Para o ministro, a condição é ilegal, uma vez que o delator é obrigado a narrar todos os crimes sobre os quais tem conhecimento de uma única vez.
“Após a homologação do acordo, essa cláusula guarda-chuva foi utilizada como um pé de apoio para incontáveis ilegalidades. Malgrado a Cláusula 17 fixasse prazo de 120 (cento e vinte dias), após a decisão homologatória, para a apresentação dos “novos casos”, o delegado responsável apresentou pedidos de compartilhamento de provas obtidas nos autos de outras operações criminais e ainda solicitou a prorrogação do prazo para elaboração de novos relatos criminais”, escreveu.
Barroso defende delação, mas frisa que inquérito exige materialidade e autoria
Ao contrário de Fachin e Gilmar, o ministro Luís Roberto Barros foi o primeiro ministro a se manifestar pela manutenção da decisão que homologou a delação de Cabral. Barroso também lembrou do julgamento em que o STF reconheceu a legitimidade dos delegados para a celebração de acordos de delação, indicando ainda que para uma eventual superação de tal entendimento ‘seria necessária uma clara alteração
das circunstâncias fáticas ou normativas ou, ainda, a apresentação de razões jurídicas extremamente fortes’.
“Não reputo que tenham sido demonstradas alterações das circunstâncias fáticas, nem trazidos ao debate argumentos novos que autorizem a modificação da compreensão estabelecida em 2018. Além disso, do ponto de vista normativo, a Lei n° 13.964/2019 alterou substancialmente o regime da colaboração premiada e, ainda assim, manteve a previsão expressa de legitimidade do delegado de polícia para a celebração do acordo”, registrou.
Por outro lado, o ministro ressaltou que a homologação do acordo ‘não implica reconhecimento de que as declarações do colaborador sejam suficientes, isoladamente, para a abertura de investigações’.
“Para a instauração do inquérito, exige-se a verificação de indícios mínimos de materialidade e de autoria. Tal exigência reflete o equilíbrio necessário entre os interesses em jogo: de um lado, a liberdade e a privacidade do suspeito, já que a mera instauração do inquérito gera inegável constrangimento; de outro lado, o interesse da sociedade e das vítimas na apuração dos fatos e na punição de eventuais culpados”, ressaltou Barroso.