MP de contas denuncia Bolsonaro ao TSE por campanha antecipada

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Foto: Reprodução

O procurador-geral substituto do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), Lucas Rocha Furtado, apresentou ontem um ofício ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apontando o risco de presidente Jair Bolsonaro realizar propaganda eleitoral antecipada. Nas últimas semanas, Bolsonaro fez atos com aliados, em clima de campanha, em Brasília, no Rio de Janeiro e em São Paulo.

No documento, Furtado apontou a necessidade de o TSE acompanhar e verificar se esses eventos com Bolsonaro estão servindo para a promoção antecipada da candidatura à reeleição em 2022. O procurador afirmou que a apuração do TSE deve “garantir a lisura e a paridade dos candidatos nas disputas eleitorais”.

“No Brasil, com o intuito de evitar desequilíbrio e falta de isonomia nas campanhas eleitorais, veda-se a propaganda eleitoral antecipada… Apesar disso, no último final de semana, o atual presidente da República, conforme noticiado pela mídia, realizou passeio de moto que reuniu milhares de apoiadores de seu governo”, disse o procurador no ofício. “Em meio à pandemia, diante das aglomerações geradas, se o fato em si não fosse preocupante, existe o risco, ainda que hipoteticamente, de o senhor Jair Bolsonaro estar utilizando do cargo para promover sua campanha para as próximas eleições de 2022 ensejando em violação legal passível de penalidades diante das normas das eleições no Brasil.”

Ao Valor, Furtado destacou que o MP de Contas pode representar no TSE, que vai avaliar se cabe dar sequência ao pedido. O procurador explicou que a primeira consequência, caso o tribunal confirme uma ilegalidade, é a punição com multa. A reincidência pode levar até à inelegibilidade de Bolsonaro.

O presidente tem feito eventos com motociclistas nos fins de semana, em clima de campanha eleitoral, com discurso em cima de carro de som e aglomeração de centenas de apoiadores. O mais recente foi em São Paulo, no sábado.

Nos bastidores do TSE, o entendimento é o de que o pedido não deve prosperar, dado o período que ainda resta para as eleições de 2022 – mais de um ano. Além disso, segundo fontes ouvidas pelo Valor, a representação do MP deveria ter sido protocolada junto ao Ministério Público Eleitoral (MPE), e não diretamente ao TSE.

Em São Paulo, palco do evento no sábado com Bolsonaro, o Ministério Público Estadual instaurou um inquérito civil para investigar os organizadores e participantes da manifestação. O MP-SP registrou que participantes do “Acelera para Cristo” – inclusive o presidente – não usaram máscara e cometeram “graves violações às normas sanitárias federal e estaual”, em um “contexto dramático de agudização da pandemia”.

A investigação ficará restrita às lideranças e participantes que descumpriram as normas sanitárias. Segundo o MP-SP, os organizadores poderão ser responsabilizados por dano moral e social coletivo por meio de ação civil pública.

 

O MP-SP não tem atribuição para investigar o presidente e nem outras autoridades com foro por prerrogativa de função que estavam no ato, como os ministros Tarcísio Freitas (Infraestrutura) e Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia). No entanto, encaminhou um documento com irregularidades cometidas por Bolsonaro e ministros ao Ministério Público Federal em São Paulo, que pode dar andamento às investigações.

O promotor Arthur Pinto Filho, que instaurou o inquérito, ressaltou que Bolsonaro desrepeita “sistematicamente” as normas estadual e federal e é um mau exemplo, seguido por seus apoiadores e por participantes da manifestação. “É do conhecimento geral que o chefe da nação se manifesta, em todas as ocasiões que se lhe apresentam, de forma clara e direta, sem peias, por palavras e atos, contra as orientações emanadas das leis, decretos e orientações expressas por seu próprio ministro da Saúde acerca das corretas formas não medicamentosas para o enfrentamento da pandemia”, disse.

O MP-SP afirmou que o presidente desrespeitou não só as normas sanitárias de combate à pandemia, mas também regras de trânsito, ao pilotar uma moto que estava com a placa encoberta e usar um capacete irregular. O promotor destacou que “grande parte dos organizadores e dos participantes do ato” seguiram o mau exemplo de Bolsonaro.

O promotor afirmou ainda que às vésperas do evento, São Paulo tinha quase 25 mil pessoas internadas em UTIs e enfermarias vítimas da covid-19, com a taxa de ocupação dos leitos de UTI superior a 82%. No dia do evento, 759 pessoas aguardavam uma vaga em UTIs no Estado.

“Foi neste contexto dramático de agudização da pandemia no Estado que ocorreu o evento, com graves violações às normas sanitárias federais e estaduais. E, o mais dramático, expondo à risco de contágio as pessoas que participaram dos atos e não se protegeram adequadamente”, afirmou.

Ao apontar o desrepeito das lideranças do ato e dos manifestantes às normas sanitárias, o MP-SP afirmou que o “ uso de máscara é o mínimo civilizatório em tempos pandêmicos”. “Não há nenhum infectologista com um mínimo de credibilidade que oriente a população em sentido contrário.”

Valor Econômico