Novas Lava-Jatos deverão custar caro aos contribuintes
Portaria assinada pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, fixou regras que pesam sobre a seleção e remuneração de integrantes dos chamados Gaecos (Grupos de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), modelo que tem substituído forças-tarefas como as da Lava Jato.
A mudança provocou questionamentos de parte dos procuradores e deve ter como um dos primeiros afetados o Ministério Público Federal em São Paulo, que pretende instalar um Gaeco ainda em junho.
Com a medida, a PGR tem como objetivo impor regras sobre pagamentos de gratificações feitos a procuradores por acúmulo de trabalho. Essa remuneração é uma demanda da categoria.
Mas a portaria acabou levantando queixas sobre como serão selecionados os integrantes dos grupos a serem criados —que deverão levar em conta critério de antiguidade. O processo é diferente do que tem acontecido em outros Gaecos até agora.
Uma das modificações feitas pela portaria permite que membros dos Gaecos que acumularem as atividades nos grupos com seus outros serviços ganhem gratificações extras.
Esses bônus são chamados Gecos (Gratificação por Exercício Cumulativo de Ofício). O salário de um procurador que atua na primeira instância é atualmente de R$ 33.689. Como a remuneração extra pode chegar ao teto de R$ 39,2 mil, há entendimento interno da PGR que haverá estímulo à criação de mais Gaecos em todo o país.
Para que essa gratificação seja concedida, as vagas nos Gaecos passaram a ser classificadas como “ofícios especiais”. Se quiserem ocupar esses ofícios (espécie de equivalente às varas da Justiça), candidatos terão que ser selecionados de acordo com o critério de antiguidade na carreira.
A portaria, assinada no dia 27 de maio, diz que que a designação dos integrantes dos Gaecos acontecerá “presidida a escolha pelo princípio da antiguidade, a partir de proposta da respectiva Procuradoria da República, entre membros atuantes na área criminal”.
Esse formato é diferente do que vinha sendo aplicado. Até agora, a maneira mais comum de formação dos Gaecos do MPF era a eleição de um coordenador por outros procuradores da República que atuam no estado. Esse coordenador forma sua equipe, que passa por aprovação dos superiores. O grupo pode ou não ter membros com exclusividade.
Normalmente, não havia pagamento por acúmulo desse trabalho ou pela dedicação exclusiva.
Diferentes procuradores que atuam na área penal disseram à reportagem que, com a mudança, os Gaecos podem acabar virando um “puxadinho remuneratório” para pessoas que não são especializados em crime organizado ou lavagem de dinheiro, mas irão se candidatar para as vagas porque são antigos no Ministério Público e querem a gratificação.
O formato também é visto como um desincentivo à exclusividade do trabalho de procuradores no Gaeco —que integrantes do Ministério Público Federal veem como fundamental para o avanço de grandes investigações—, já que a gratificação é por acúmulo de serviço com os seus ofícios de origem.
Internamente, porém, a PGR vê a medida como parte de uma reorganização para evitar o pagamento indiscriminado de gratificações a procuradores.
Nos Gaecos, os integrantes são designados para um mandato de dois anos, renováveis. Essas equipes dão suporte a outros procuradores do MPF nos estados que precisarem de reforços em apurações de combate ao crime organizado.
Agora, além dos membros terem que ser selecionados por critério de antiguidade e sem afinidade entre si —ou seja, pessoas que não confiam umas nas outras podem acabar integrando o mesmo Gaeco—, o coordenador deve ser eleito apenas entre esses membros.
Para o Gaeco de São Paulo, a consulta para integrantes já foi aberta pelo procurador-chefe Márcio Schusterschitz da Silva Araújo. Segundo ele, a equipe deve ser definida até o final de junho.
Segundo resolução de 2013 do Conselho Superior do MPF, pelo menos dois membros de um eventual Gaeco em São Paulo devem ter, preferencialmente, atuação exclusiva. Ainda não se sabe, no entanto, se isso acontecerá.
De acordo com a resolução, também deverá ser oferecido suporte administrativo de servidores para a equipe.
No futuro, quando expirados os mandatos atuais, os outros Gaecos do MPF também terão que se adaptar ao critério de seleção por antiguidade.
Os Gaecos, que são permanentes, vêm paulatinamente substituindo as forças-tarefas, que são provisórias, desde que Augusto Aras se tornou procurador-geral da República. Ele considera o modelo menos precário institucionalmente e menos sujeito a interferência política.
Atualmente, existem Gaecos federais no Pará, no Amazonas, na Bahia, no Rio, no Paraná, na Paraíba e em Minas Gerais.
No Rio e no Paraná, os grupos incorporaram parte das forças-tarefas da Lava Jato nos respectivos estados.
Eles têm trabalhado, inclusive, em casos que eram de atribuição da operação. No dia 4 de maio, por exemplo, 11 pessoas foram denunciadas pelo Gaeco do Paraná sob acusação de causarem prejuízos de R$ 95 milhões à Petrobras, decorrentes de direcionamentos indevidos de contratos de câmbio.
Em São Paulo, os procuradores pediram para sair da força-tarefa em setembro do ano passado, em resposta a divergências com uma colega com quem compartilhavam o núcleo responsável por casos da operação.
Essa procuradora, Viviane Martinez, acabou ficando sozinha com todos os casos da Lava Jato, e definiu se os reenviaria ou não para sorteio entre outros colegas.
A Folha questionou ao Ministério Público Federal se desde então foram apresentadas denúncias ou ações civis públicas referentes aos casos da Lava Jato de São Paulo. Segundo a assessoria, não foram localizados nenhum desses procedimentos.
A Lava Jato de São Paulo tinha entre seus principais casos apurações relativas a suspeitas de irregularidades praticadas com uso de recursos federais no Governo de São Paulo, entre elas esquemas relativos às obras do Rodoanel e do Metrô.
Folha de SP