Site revela aumento das traições conjugais na pandemia

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Foto: Carolina Daffara

Estamos no ano 2021 depois de Cristo. Todo o mundo foi ocupado pelo coronavírus e toda a população faz quarentena… Toda? Não! Um grupo de irredutíveis adúlteros e adúlteras não resiste a pular a cerca e continua se encontrando durante a pandemia.

Mais de um terço (38%) dos membros do Ashley Madison, site e aplicativo de namoro especializado em traições conjugais, manteve a rotina de transar com seus amantes neste ano e no ano passado, sendo que metade desses o faz toda semana. Já os outros 62% se abstiveram de encontros cara a cara.

Os números são resultado de uma pesquisa interna do app Ashley Madison, presente no Brasil desde 2013 e que conta hoje com cerca de 12,5 milhões de brasileiro(a)s ciscando ou interessado(a)s em ciscar fora de casa. Desde o início da pandemia, o aplicativo recebeu 1,7 milhão de novos membros no país.

O slogan do aplicativo vai direto ao ponto: “A vida é curta. Arranje um caso”. Foi o que fez Maria Clara (nome fictício), de 29 anos, que mora na cidade de São Paulo. Ou melhor, ela não se contentou com arranjar um caso, mas muitos. “Estou no app desde 2015 e os mais de dez homens eram casados”, respondeu. Ela e mais três assinantes do serviço responderam a um questionário enviado pelo jornal com a condição de não revelarem os nomes.

O mesmo número é citado por Patrícia, 49, do Tocantins, que acrescentou que a pandemia não a conteve em casa. “Saí umas dez vezes ou mais com homens casados que conheci no Ashley Madison. Pandemia? Saí assim mesmo”, revelou. “Na pandemia, os encontros ficaram mais difíceis”, admitiu Rodrigo, 50, também de São Paulo. “Mas, mesmo assim, eu tive alguns encontros rápidos.”

“A infidelidade é universal, não se resume a um país ou a um tipo de pessoa”, disse o chief strategy officer (CSO) do Ashley Madison, Paul Keable. “Queremos mostrar que as características da monogamia não funcionam para todo mundo.”

Ele conta que o site viveu um boom em todo o mundo a partir de abril do ano passado. “Seis semanas depois que os lockdowns começaram, pulamos de repente de 15 mil novos membros por dia para 20 mil”, disse Keable, que viu várias mudanças de comportamento acontecerem entre os membros devido à pandemia.

“Ninguém podia mais sair para ver amigos, jogar futebol ou beber no bar, e o foco passou a ser o parceiro. Qualquer problema que houvesse dentro de casa não poderia mais ser evitado e cresceria. Então, as pessoas passaram a procurar uma forma de diminuir suas frustrações, a se conectar com outros que estivessem em situação similar. Alguns membros apenas queriam conversar com alguém e fazer planos de encontros quando a vacina estivesse disponível. Outros já tinham parceiros e continuaram se encontrando apenas com esses. Mas teve de tudo, dependendo do país. Nosso conselho é a saúde em primeiro lugar, e aguardar a vacina é certamente o melhor caminho para se ter um caso que dê certo.”

Maria Clara é uma dessas assinantes que seguraram um pouco as pontas. “Quando teve lockdown, não saía. Mas depois da flexibilização tive alguns encontros”, contou, confundindo as restrições de abertura de comércios no Brasil com o verdadeiro lockdown que aconteceu em alguns países.

Já Isabela, 31, da Praia Grande (SP), é daquelas citadas por Keable que têm apenas um parceiro. “Eu saio com apenas uma pessoa, e essa pessoa acabou contraindo Covid”, disse ela. “Ficamos o tempo de isolamento sem nos ver. Mas desde fevereiro estamos nos vendo toda semana. Às vezes, mais de uma vez na semana.”

Atrás apenas dos Estados Unidos, com 30 milhões de membros, o Brasil é o maior mercado internacional da Ashley Madison, que atua em outros 48 países. Como na maioria dos sites de namoro, é possível se inscrever de forma gratuita para dar uma olhada, mas, para enviar mensagens, é preciso pagar. Diferentemente dos mais populares, como Happn ou Tinder, aqui o assinante não paga uma mensalidade, mas sim créditos que são descontados a cada mensagem enviada. Algo como R$ 234,90 pelos 100 créditos iniciais.

Quando o assunto é infidelidade, pelo menos no Ashley Madison, as mulheres estão com tudo. “O Brasil tem mais mulheres se cadastrando do que homens. No ano passado, no nosso reporte anual, a proporção era de 2,2 mulheres para cada homem, mais que o dobro”, contou o CSO. “Isso nos mostra que elas estão buscando soluções, e o divórcio não é uma ótima solução, especialmente se houver filhos, além de ser caro. Nosso app permite que você busque suas necessidades e mantenha seu relacionamento em casa.”

É uma forma de pensar um tanto cínica, essa de achar que um aplicativo de traição ajuda a manter casamentos. “Talvez, mas é um enfoque realista”, disse o executivo. “Em um país tão dominado pela religião católica, divorciar-se ainda traz muitas consequências culturais negativas.”

“Mas, se você não quer um divórcio e sente que algo está faltando, quais são suas opções? Ou você vive sem felicidade, o que parece horrível, ou usa a nossa solução, na qual você preenche o elemento que falta e mantém seu relacionamento feliz. Se posso manter a felicidade e não machucar meu parceiro, esse não parece um bom caminho a seguir? Para alguns é. O fato é que eu não consigo convencer pessoas felizes no casamento a ter um caso só fazendo um comercial na televisão ou dando uma entrevista para o jornal. Se fosse assim, eu não teria 20 mil novos membros por dia, mas 1 milhão por dia.”

Esse perfil mais feminino do aplicativo vem de nascença. “O fundador não sabia muito sobre infidelidade quando criou o site”, explicou Keable. “Ele tinha uma ideia errada de que as mulheres não traíam tanto como os homens. Por isso, pensou em fazer o site o mais feminino possível para atraí-las. Uma dessas coisas é nosso nome. Ele escolheu os dois nomes femininos mais dados às bebês nascidas naquele ano nos EUA. Ashley e Madison soaram bem juntos e ficou.”

Parece que a estratégia deu certo. Diferente de algumas das saídas dos assinantes entrevistados. Patrícia, por exemplo, contou que certa vez, quando saiu pela primeira vez com um homem casado, o clima estava um pouco tímido. “Foi preciso beber para nos soltarmos. Mas nos embriagamos e dormimos…”.

Já Isabella teme encontrar seu marido no app. “Não sei o que faria, rs”, escreveu.

Rodrigo, ao contrário, sabe muito bem. “Se encontrar a minha esposa no site, eu não faria nada, porque os direitos são iguais. Aceitaria sem problemas.”

Mas a pior experiência quem teve foi Maria Clara.

“Conheci um cara no site e marcamos num café para conversarmos. Houve um clima, mas, na hora de se despedir, eu disse que estava com vontade de ir ao banheiro e ele imediatamente me perguntou se eu queria fazer xixi no rosto dele. Fiquei sem reação, até perguntei se era brincadeira… Ele, porém, estava sério. Fiquei super sem graça e logo descartei essa possibilidade. Fui ao banheiro e, quando retornei, o rapaz não estava mais à mesa. O garçom disse que ele pagou a conta e foi embora. Fiquei magoada e chocada.” Nós também, Maria Clara. Nós também.

Folha de S. Paulo

 

 

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