Wizard e auditor falsário poderão calar na CPI
Foto: Fabiano Accorsi / Divulgação
O ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), concedeu habeas corpus para autorizar o auditor do TCU (Tribunal de Contas da União) Alexandre Marques a permanecer em silêncio sobre tudo que possa levar à sua própria incriminação no depoimento que prestará à CPI da Covid.
Marques entrou na mira da comissão por inserir um documento no sistema da corte de contas com informações distorcidas sobre mortes decorrentes do coronavírus.
Na decisão, Gilmar Mendes manteve a quebra dos sigilos telefônico e telemático do auditor.
O ministro Luís Roberto Barroso, por sua vez, autorizou o empresário Carlos Wizard a se manter em silêncio sobre fatos que podem incriminá-lo em seu depoimento à CPI que está marcado para esta quinta-feira (17). O magistrado, porém, negou o pedido para que a oitiva fosse realizada por videoconferência.
Wizard é investigado pela comissão sob a suspeita de integrar essa equipe paralela que não tinha vínculo formal com o governo e que era responsável por elaborar medidas para enfrentar o coronavírus, entre elas a propagação de remédios como a hidroxicloroquina, sem eficácia comprovada contra a Covid-19.
No caso de Marques, os dados do auditor federal de controle externo do órgão foram usados pelo presidente Jair Bolsonaro para, sem provas, sugerir uma supernotificação de óbitos pela pandemia no Brasil.
Marques produziu o documento no primeiro domingo de junho (6) e compartilhou com colegas. Segundo informações encaminhadas à corregedoria do tribunal, o auditor relatou que comentou o teor de suas opiniões com o pai, Ricardo Silva Marques.
Militar, amigo de Bolsonaro e gerente-executivo de Inteligência e Segurança Corporativa da Petrobras, ele teria encaminhado o documento ao presidente, segundo o servidor do TCU disse a seus chefes.
O depoimento dele está previsto para quinta. Apesar de ter garantido o direito do auditor para permanecer calado, Gilmar Mendes afirmou que a regra não é ampla e irrestrita.
Segundo o ministro, ele está proibido de “faltar com a verdade relativamente a todos os demais questionamentos não abrigados” à sua garantia de não se autoincriminar.
“O direito ao silêncio foi consagrado em tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário, que enunciam o direito do acusado de não depor contra si mesmo”, afirmou.
Poucas horas depois de Bolsonaro afirmar, no último dia 7, que o TCU teria produzido um relatório afirmando que “50% dos óbitos por Covid não foram por Covid”, o tribunal desmentiu a informação. O órgão disse, em nota, que não elaborou o documento.
Segundo o TCU, o documento era uma análise pessoal de um servidor, que havia sido compartilhada para discussão e não integrava processos oficiais. “Ressalta-se, ainda, que as questões veiculadas no referido documento não encontram respaldo em nenhuma fiscalização do TCU”, afirmou o órgão.
Após ser desmentido, Bolsonaro disse que errou ao atribuir à corte os dados, mas insistiu que há indícios de supernotificação das mortes por coronavírus no país. Ele disse ter acionado a CGU (Controladoria-Geral da União) para investigar essas suspeitas.
Marques foi indicado para a diretoria de compliance do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) em 2019, mas acabou sendo barrado para o órgão pelo próprio tribunal. Integrantes do TCU dizem que filhos do presidente Bolsonaro, entre eles o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), estariam por trás dessa indicação à época.
Sobre Wizard, Barroso afirmou que ele tem o direito de ser tratado como investigado e, por isso, pode ficar calado sobre fatos que possam levar à sua incriminação.
“Com efeito, o privilégio de não autoincriminação é plenamente invocável perante as Comissões Parlamentares de Inquérito, representando direito público subjetivo colocado à disposição de qualquer pessoa que, na condição de indiciado, acusado ou testemunha, deva prestar depoimento perante órgãos do Poder Legislativo, do Poder Executivo ou do Poder Judiciário”, escreveu.